Aliados de Bolsonaro se mostram aliviados com depoimento “sem surpresas” de Moro à PF

Jefferson diz que Moro “tem muitas convicções, mas nenhuma prova”

Fábio Zanini
Folha

Mal havia vazado o depoimento do ex-ministro Sergio Moro e os aliados do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) na direita já martelavam a avaliação de que tudo não passou de um traque.

Provas testemunhais, mensagens de celular entregues e a existência de um vídeo mostrando a tentativa de ingerência de Bolsonaro na Polícia Federal foram convenientemente ignoradas. No lugar, surgiram alfinetadas e muita ironia. Uma delas veio do ex-deputado Roberto Jefferson (PTB), recentemente convertido à base de Bolsonaro.

MANTRA DO PT – “A íntegra do depoimento de Sergio Moro à Polícia Federal revela que o ex-ministro tem muitas convicções, mas nenhuma prova”, escreveu, repetindo o mantra dos petistas para acusar Moro durante os processos contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Mais irônico ainda foi o comentário de um seguidor do ex-deputado: “A história se repete: a teoria do domínio do fato”, disse. Foi com base nessa teoria que parte da cúpula petista foi condenada no mensalão, deflagrado justamente após ser denunciado por Jefferson.

RELATÓRIOS – O discurso corrente é de que Moro inocentou Bolsonaro ao se recusar a dizer que ele cometeu crime e ao afirmar que o presidente nunca pediu relatórios de inteligência, porque sabia que não seriam repassados.

Um dos mais atuantes integrantes da tropa de choque do presidente na Câmara, o deputado federal Bibo Nunes (PSL-RS) afirmou que o depoimento reforça a percepção entre a base do presidente de que o ex-ministro é um traidor.

“Eu tenho uma rede de milhares de seguidores. Quando Moro saiu do ministério, de 30% a 40% se voltaram contra Bolsonaro. Mas hoje isso não chega a 2%”, afirma Nunes, que diz se arrepender de ter defendido o ex-juiz, inclusive quase indo às vias de fato. “Eu quase troquei soco na Câmara com um deputado do PSOL para defender o Moro. Que decepção”, disse.

SEM SURPRESA – Presidente do Movimento Conservador, um dos grupos que têm promovido mobilizações de rua em prol de Bolsonaro, Edson Salomão afirmou que o depoimento não foi nenhuma surpresa. “Já imaginava que o Moro estivesse blefando. O que para nós fica em aberto é por que ele agiu dessa forma. Gostaríamos de saber a razão para ele ter adotado essa postura”, afirmou Salomão.

Para ele, Moro claramente já começa a colocar de pé um projeto político, como mostram sua nova faceta de tuiteiro. “Ele nunca foi tão ativo nas redes sociais como agora, e não é porque está desempregado”, disse.

EVIDÊNCIAS FRÁGEIS  – O empresário conservador Leandro Ruschel disse que não entende por que Moro fez acusações graves com base em evidências frágeis. “Moro saiu menor do episódio, prejudicou o presidente. Se tivesse saído alegando a falta da carta branca, creio que todos teriam entendido. No final, só a esquerda se beneficiou do movimento. Não há o que comemorar”, afirmou.

Para parte dos apoiadores do presidente, o projeto presidencial do ex-magistrado responsável pela Operação Lava Jato começou a ruir antes mesmo de ficar de pé.

“Quero saber se os que gritam ‘Sergio Moro presidente!’ continuarão a fazê-lo depois do fiasco de seu depoimento, hoje tornado público”, afirmou o youtuber Bernardo Kuster, bastante influente entre católicos conservadores.

ALÍVIO – Já o perfil anônimo Let’s Dex, também seguido por muitos da base de Bolsonaro, resumiu o sentimento de alívio da tropa de choque digital do presidente. “Qualquer leigo saca que o Moro só chorou e arregou”, disse.

O discurso de vitória por 7 a 1, no entanto, é frágil, como admitem alguns bolsonaristas em caráter reservado. Por enquanto, vazou apenas o depoimento de Moro relatado em discurso indireto. A coisa pode mudar quando aparecerem mensagens e o vídeo do presidente, que teriam força muito maior.