João Campos concede benefício fiscal a bets no Recife

Em meio a discussões sobre os efeitos sociais causados pelas apostas esportivas, a Prefeitura do Recife aprovou um novo incentivo fiscal para bets.

O Projeto de Lei 02/2025, proposto pelo prefeito João Campos, do PSB, e aprovado em regime de urgência pela Câmara Municipal, altera o Código Tributário do Recife (Lei nº 15.563/1991) para reduzir de 5% para 2% a alíquota do ISSQN (Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza) sobre serviços relacionados à distribuição e venda de bilhetes e produtos de loteria — como bingos, cartões, pules, cupons de apostas, sorteios e prêmios.

A mudança beneficia diretamente bets, equiparando seu tratamento fiscal ao setor de Tecnologia da Informação do Porto Digital.

Essa redução faz parte da estratégia da gestão municipal para atrair e manter investimentos no setor de apostas esportivas, que cresce no Brasil nos últimos anos. A justificativa apresentada para a redução da alíquota inclui o potencial contributivo da atividade econômica e sua importância para o município.

A decisão da Câmara não foi unânime e enfrentou resistência de alguns vereadores, que manifestaram preocupações sobre os impactos negativos do vício em jogos de azar. As demais atividades econômicas do município continuam sujeitas à alíquota padrão de 5% do ISSQN.

Parlamentares de diferentes partidos argumentaram que o benefício fiscal pode incentivar a expansão do mercado de bets.

O projeto entrou em vigor em 2 de abril, logo após sua publicação no Diário Oficial do Recife. No entanto, a Prefeitura não fez uma divulgação ampla da aprovação da nova norma

Gripe aviária, ovos caros e o silêncio que ressoa nas panelas vazias. Por Flávio Chaves

Enquanto o povo sente fome, o governo anuncia a destruição de ovos — justo no auge da carestia. Coincidência ou distração planejada?

Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc  – Nas últimas semanas, o Brasil se deparou com uma série de notícias que, à primeira vista, parecem tratar de assuntos distintos: de um lado, a disparada no preço dos ovos, um dos alimentos mais populares da mesa do brasileiro; de outro, a ação do Ministério da Agricultura anunciando o rastreamento e o descarte de milhares de ovos por conta da confirmação de um foco de gripe aviária em uma granja do sul do país. Para o olhar mais apressado, trata-se de uma coincidência infeliz. Para o olhar mais crítico, porém, talvez haja mais conexões do que aparenta.

O ovo, que sempre foi o alimento do povo, da merenda escolar ao PF dos botequins, tornou-se nos últimos meses um símbolo da crise alimentar silenciosa que afeta a classe média baixa e os mais pobres. O preço da dúzia subiu, escancarando a inflação dos itens básicos enquanto o discurso oficial permanece centrado em índices técnicos e gráficos abstratos. Enquanto isso, o povo sente no bolso e no estômago o que os números tentam suavizar.

É neste cenário que explode, de forma quase cinematográfica, o anúncio de que o governo está “rastreiando” e “destruindo” ovos para conter um surto de gripe aviária. O timing é, no mínimo, curioso. Quando as panelas vazias começam a ecoar nas redes sociais, quando os memes sobre o preço do ovo viralizam com mais força do que as próprias notícias econômicas, emerge a figura da autoridade sanitária, pronta para apresentar um novo enredo: não é a inflação — é a emergência sanitária.

A destruição de alimentos em nome da segurança biológica é prática prevista e, em muitos casos, necessária. O que causa estranhamento, porém, é a forma e o momento da divulgação. Os ovos, ainda em incubação, foram descartados em diferentes estados. O episódio foi amplamente noticiado, como se fosse necessário não apenas conter o vírus, mas também conter algo mais difuso: o desgaste público diante do encarecimento da alimentação. A gripe aviária, que de fato preocupa, surge assim também como narrativa paralela — uma espécie de véu técnico a encobrir o que poderia se tornar insustentável do ponto de vista político.

Não se trata aqui de afirmar teorias conspiratórias, mas de sugerir o que qualquer jornalista atento precisa: perguntas incômodas. Seria apenas coincidência que o governo anuncie a destruição de ovos justamente quando o seu preço se torna um escândalo cotidiano? Por que tanto esforço midiático em mostrar o descarte, e tão pouco em explicar os aumentos de preços e o impacto real na vida das famílias?

Quando se destrói alimento em um país em que ainda há fome, quando se gasta mais com a justificativa do controle do que com políticas públicas de acesso à comida, algo parece fora de lugar. O combate à gripe aviária é fundamental, mas não pode se tornar cortina de fumaça para esconder a carestia que aperta o povo nas feiras, nos supermercados e nas quitandas de bairro.

Mais do que rastrear ovos, é preciso rastrear responsabilidades. Porque, no fim das contas, o que está em jogo não é apenas a sanidade das aves — é a dignidade do prato brasileiro. E isso, definitivamente, não se esconde sob nenhuma epidemia.

O Agente Secreto”: Tubarões do Brasil em Suspense Político no Festival de Cannes. Por Flávio Chaves

É Brasil! Wagner Moura dança frevo no tapete vermelho do Festival de Cannes

Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc  – O cinema brasileiro voltou a rugir nas telas internacionais com o novo filme de Kleber Mendonça Filho, O Agente Secreto. Com Wagner Moura no papel principal, a obra já é uma das mais comentadas da edição deste ano do prestigiado Festival de Cannes, onde disputa a cobiçada Palma de Ouro. Trata-se de um suspense carregado de densidade política, que lança um olhar profundo sobre a memória, os subterrâneos do poder e os “tubarões” que governam — ou manipulam — o Brasil.

Filmado em parte no Recife, cidade onde Mendonça costuma ancorar sua estética e crítica social, o longa nos conduz por uma trama tensa e instigante. É uma narrativa que opera como denúncia e como reflexão, cruzando os vestígios da ditadura com os mecanismos de dominação contemporâneos. Há uma atmosfera de conspiração e silêncio, típica dos thrillers clássicos, mas com sotaque e pulsação nacionais.

Wagner Moura, ator conhecido por papéis de forte cunho político, entrega mais uma atuação carregada de vigor e profundidade. Seu personagem não é um herói convencional: é alguém que se move entre dilemas éticos, rastros de violência institucional e as sombras de um passado que insiste em não passar.

O Agente Secreto não apenas coloca o Brasil na vitrine do cinema mundial — coloca também a nossa realidade política sob os refletores. E o faz com o talento de um cineasta que já foi aclamado por obras como Aquarius e Bacurau, e que agora retorna com uma narrativa mais afiada do que nunca.

Na Croisette, Mendonça leva mais do que um filme: leva consigo as inquietações de um país inteiro. Leva os sussurros das salas de tortura, os arquivos queimados, os interesses ocultos — e os “tubarões” que nadam, vorazes, nos salões do poder.

Em tempos de apagamento histórico e revisionismo oportunista, O Agente Secreto se impõe como obra urgente. Um chamado à memória, ao enfrentamento e à consciência. E, talvez por isso mesmo, já seja um dos filmes mais esperados e politicamente relevantes da temporada.