Para se apaixonar por Shakespeare

 

  Uma visão particular sobre a Inglaterra elizabetana
Uma visão particular sobre a Inglaterra elizabetana

Há 400 anos morria em Stratford-upon-Avon o autor que só perde em citações, na Internet, para Jesus Cristo. William Shakespeare, que já teve a identidade, a sexualidade e a própria existência questionadas, nasceu e morreu no mesmo dia, 23 de abril. Divide com São Jorge, cuja festa se celebra na mesma data, não só a popularidade, como também uma devoção quase religiosa dos “bardólatras”.
Além de criar palavras novas e expressões na língua inglesa, William Shakespeare modificou a estrutura da dramaturgia ocidental. Para o especialista Harold Bloom, Shakespeare inventou o que hoje consideramos a personalidade humana, dando relevância ao monólogo interior dos personagens, às reflexões e às emoções. Isso explicaria o interesse pelos 154 sonetos e 37 peças teatrais que continuam a encantar tantos leitores, apesar do vocabulário rebuscado e de encenações que têm falas proferidas como discursos solenes, tão diferentes da linguagem da atualidade. Amor, ciúme, inveja, ambição, trapaça, ganância, paixão, juventude, velhice, política, guerra, casamento, maturidade, poder, cobiça, ódio, sabedoria, arrogância, virtude, bondade, amizade, fraternidade, alegria, tristeza, luto, dor, festa, conhecimento, ciência e sexo – ou seja, apenas um pouquinho de tudo – eram os temas que ela abordou.

                    A intrigante análise sobre a humanidade
A intrigante análise sobre a humanidade

Embora pouco se saiba de concreto sobre a vida particular de Shakespeare, ele, provavelmente, é o escritor mais estudado pela humanidade. Com traduções em 119 línguas, entre elas Klingon – o idioma de alienígenas da série de televisão “Jornada nas Estrelas” -, Shakespeare é o autor com maior número de peças adaptadas para o cinema, algo superior a 350 versões fiéis ou baseadas em suas criações. Uma projeção da revista Forbes, em 2004, estimou que se o Bardo tivesse herdeiros, esses receberiam uma renda anual mínima de U$ 15 milhões em royalties, calculando-se apenas um dólar por exemplar vendido e sem computar a quantidade adquirida por bibliotecas e escolas.

Segundo o cineasta Jorge Furtado, bardólatra assumido que há dez anos criou uma versão modernizada de Trabalhos de Amor Perdidos (Objetiva, R$ 44,90), a obra de Shakespeare baseou-se em crônicas, lendas, poemas e em outros textos teatrais. O livro de Furtado é quase um guia para o bardólatra iniciante, incluindo até a relação dos 900 personagens que têm nome nas peças, entre soldados, elfos, fadas, espectros, nobres, serviçais, demônios, músicos, mascarados e mensageiros. O tom de almanaque foi proposital, resumindo o enredo de todas as histórias.

                      Uma versão modernizada de Jorge Furtado
Uma versão modernizada de Jorge Furtado

Uma abordagem social-cultural e econômica sobre a Inglaterra elizabetana e a confortável vida de um empresário bem-sucedido está em Shakespeare e a economia (Zahar, R$ 9,90). O estudo do economista Gustavo Franco derruba a lenda sobre a pobreza de que Shakespeare morreu pobre. Para chegar aos valores atualizados da fortuna amealhada por Shakespeare, Franco verificou índices inflacionários e custo de vida da época em que o teatro era uma diversão popularíssima. As companhias faziam cerca de 200 apresentações por ano, com registro de temporadas curtíssimas, de apenas dez dias, em média. Shakespeare foi diretor e sócio de dois teatros, além de investir seu dinheiro em terras, trigo, cereais e lã, entre outros produtos.

Voltado para o público juvenil e para leitores mais maduros, Hamlet ou Amleto? Shakespeare para jovens curiosos e adultos preguiçosos (Zahar, R$ 44), de Rodrigo Lacerda, destrincha a mais intrigante análise sobre a humanidade da literatura universal. Para desvendar ainda mais o universo de bardolatria, vale a pena, também assistir a Shakespeare apaixonado, de John Madden, que ganhou sete Oscar, incluindo o de melhor filme em 1998. ou Anônimo, de Roland Emerich, que discute a autoria das peças.

* Olga de Mello é jornalista

 

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