Netanyahu vê risco de Bolsonaro ser investigado por ‘genocídio’ de povos indígenas, diz ex-embaixador

Netanyanu percebeu que Bolsonaro é do tipo “confuso”

Yasmim Perna e Alexandro Martello
TV Globo e G1 — Brasília

O ex-embaixador do Brasil em Israel, Paulo Cesar Meira de Vasconcellos, afirmou em telegrama enviado ao Itamaraty em 2020 que o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu via “risco real” do presidente Jair Bolsonaro ser investigado pelo Tribunal Penal Internacional por “genocídio de povos indígenas”.

A correspondência, que está em posse da CPI da Covid e foi obtida pela TV Globo, é datada de 7 maio de 2020, quando Vasconcellos ainda chefiava a Embaixada brasileira no país. O documento foi classificado com prioridade “urgentíssima”. Vasconcellos foi substituído no cargo pelo general Gerson Menandro Garcia de Freitas no fim de 2020.

“DEIXOU CLARO” – Paulo Cesar Meira de Vasconcellos cita no documento uma reunião, ocorrida em dezembro de 2019 entre uma autoridade política brasileira em visita à Israel e o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, na qual o primeiro-ministro de Israel “deixou claro” que Israel gostaria de contar com “firme apoio” brasileiro a processos no Tribunal Penal Internacional, já que “quando todo mundo estava contra o Brasil durante incêndios da Amazônia, Israel apoiou o Brasil”.

Ainda, segundo a carta, naquele encontro Netanyahu teria dito que o apoio seria mútuo “uma vez que há risco real de que o presidente Bolsonaro venha a ser investigado naquele Tribunal por genocídio de povos indígenas”.

De acordo com o documento, o primeiro-ministro teria dito que acredita que o governo brasileiro poderia vir a ser responsabilizado “internacionalmente” por “omissão na proteção da Amazônia” e “por crimes internacionais no que se refere à proteção de povos indígenas”.

CRIMES INTERNACIONAIS – “Parece-me seguro afirmar que pelo menos parte das autoridades locais, inclusive o primeiro-ministro [Benjamin Netanyahu] acreditam que o governo brasileiro poderia vir a ser responsabilizado internacionalmente no futuro por omissão na proteção da Amazônia e até mesmo por crimes internacionais no que se refere à proteção de povos indígenas“, diz o ex-embaixador brasileiro na correspondência.

G1 entrou em contato com o Ministério das Relações Exteriores e com o Palácio do Planalto, mas o governo não se manifestou até a última atualização dessa reportagem.

Na correspondência, Vasconcellos também informou ter percebido que “parte expressiva da população local é crescentemente crítica do que percebe como aumento dos níveis de desmatamento, elevação do número de queimadas e relativização do compromisso do governo brasileiro com preservação ambiental e com medidas a fazer frente à mudança do clima”.

OUTROS PROBLEMAS – “Também pesam em desfavor da imagem do Brasil a crescente aceitação local da narrativa de que o governo brasileiro não protege de maneira adequada os povos indígenas do país e, apesar de ser uma das maiores potências internacionais na área de agricultura e pecuária, não possui política clara sobre bem-estar animal”, acrescentou na carta o ex-embaixador em Israel.

Vasconcellos também disse na correspondência que em agosto de 2019, durante o pico das queimadas, o prédio da embaixada brasileira em Israel foi cercado por 10 dias, por manifestantes que demandavam fim das queimadas.