É inacreditável que existam brasileiros que pretendam entregar a Amazônia ao mundo

 (crédito: Carlos Fabal/AFP)

A Amazônia precisa ser explorada de uma forma racional

Alexandre Garcia
Correio Braziliense

O duplo assassinato no Vale do Javari reacendeu as manifestações de uma cobiça que já dura 400 anos. Ironicamente, as ações estrangeiras usuais têm sido mais discretas que a de brasileiros que agora construíram mais uma narrativa a justificar o sonhado condomínio internacional para “administrar” as riquezas naturais da área.

Administrar significa dominar e usar. Quando estrangeiros fazem isso, apenas estão insistindo no que sempre fizeram; quando brasileiros se unem a eles, tentando lesar o primeiro fundamento da nossa República, que é a soberania (art. 1º da CF), isso choca.

QUINTAS-COLUNAS – Na minha infância, chamávamos os brasileiros que trabalhavam contra o Brasil em plena Guerra Mundial de “quintas-colunas”. Lembro-me de Brizola chamar esse tipo de gente de “entreguista” e “vendilhão da pátria”.

Agora é um outro líder de esquerda, do partido de Brizola, que denuncia o crime de lesa-soberania: o ex-presidente da Câmara, ex-ministro de Lula e Dilma, ex-PCdoB, Aldo Rebelo, um estudioso da Amazônia e defensor dessa metade do nosso território.

Não é uma questão de esquerda ou direita, mas de soberania nacional — o primeiro fundamento da nação. Vem de longe a cobiça. Os portugueses a combateram no século XVII, principalmente com Pedro Teixeira, que tirou holandeses, franceses, ingleses e espanhóis da nossa Amazônia, fixando a soberania com os fortes construídos no extremo da pátria.

PLÁCIDO DE CASTRO – No início do século XX, acreanos decidiram ser brasileiros, e não bolivianos, e se levantaram em armas liderados por Plácido de Castro. Rio Branco consolidou as fronteiras no Acre com a Bolívia e no Amapá com os franceses.

Não são apenas os europeus, os cobiçosos. Em 1849, uma expedição científica da Marinha dos Estados Unidos voltou da Amazônia com a teoria de que a bacia amazônica faz parte da bacia do Mississipi: a direção dos ventos leva os navios da foz do Amazonas para os portos do sul dos Estados Unidos. Portanto, o Império Brasileiro deveria conceder aos americanos a livre navegação nos rios da Amazônia.

Desconfiado, Pedro II pediu ao Barão de Mauá uma empresa de navegação nacional que preenchesse o vazio cobiçado. Os americanos já tinham anúncios em jornais, organizando expedições para explorar o Eldorado. Há 50 anos, o cientista Herman Kahn, do Hudson Institute, sugeriu inundar a Amazônia formando um lago gigantesco.

OS ENTREGUISTAS – Brasileiros querendo entregar a Amazônia desrespeitam as memórias de Arthur Reis, Osny Duarte Pereira, Cândido Rondon, Jorge Teixeira e outros, mas, principalmente, ofendem a brasilidade dos amazônidas de todas as etnias e origens, que sabem a razão da cobiça e seus disfarces, porque não são ingênuos nem cúmplices em relação à presença estrangeira por lá.

Presença ilegal que é aplaudida por gente com o complexo de vira-lata, como chamou Nélson Rodrigues. Brasileiros da Amazônia sabem a diferença entre preservar — intocável e reservado para os estrangeiros — e conservar, com sustentabilidade, para o bem da natureza mais importante: a natureza humana. Ele sabem, todos os dias e noites, que esta Amazônia não é simplesmente do Brasil. É o Brasil.