Nem direita nem esquerda, o centro é que deverá decidir as eleições’, afirma cientista político

Lucas de Aragão

Será eleito Lula, Bolsonaro ou nenhum dos dois, diz Aragão

José Fucs
Estadão

O cientista político Lucas de Aragão, sócio da Arko Advice, uma consultoria de Brasília, afirma que o centro deverá ser decisivo mais uma vez para o resultado das eleições em 2022. Mesmo que um candidato da chamada “terceira via” não decole, segundo Aragão, o centro será o fiel da balança, como já aconteceu em outros pleitos.

Nesta entrevista ao Estadão, ele fala também que é preciso reduzir a tensão na arena política buscar o consenso, “que sempre trouxe resultados positivos” De acordo com Aragão, com a “política de choque” praticada nos últimos anos, o Brasil perdeu a oportunidade de avançar em matérias essenciais para a sua modernização. “Se não houver um mínimo de consenso em 2023, o País terá imensas dificuldades”, afirma.

Por que o Brasil fica “patinando” e não consegue deslanchar?
A gente vem de uma situação fiscal muito complicada já há alguns anos, que talvez seja um dos grandes impeditivos para o País crescer. Hoje, a credibilidade internacional do Brasil é baixa, o que afeta o fluxo de investimentos externos, apesar de o País ainda ser um destino relevante. Com esse quadro, formado por uma crise fiscal alongada, uma crise de credibilidade com o mercado internacional e local e por uma política agressiva, que optou em diversos momentos pelo choque e não pelo consensualismo, a gente acabou perdendo oportunidades de avançar em inúmeras matérias que deixariam o País um pouco mais organizado. Ainda assim, houve imensos avanços nos últimos anos. Eu não compro a ideia de que tivemos uma “década perdida”. Acredito que o Brasil é muito pior do que deveria ser, mas melhor do que parece.

Que avanços são esses que o sr. mencionou?
O País implementou uma série de medidas de modernização nos últimos seis ou sete anos, como a reforma da Previdência, o teto de gastos, que, apesar de ter sido “furado’, ainda é melhor do que nada, a reforma trabalhista, a nova Lei de Falências, os novos marcos regulatórios do saneamento e das ferrovias, a Lei do Gás e a PEC do Mar, que podem trazer muitos investimentos. Enquanto tudo isso está acontecendo, as notícias conjunturais são muito ruins. No meio de todos esses avanços, porém, nós tivemos uma crise fiscal muito forte, uma pandemia que desarranjou o País e muita tensão política.

Em sua avaliação, como o País pode superar essa tensão?
É preciso buscar o consensualismo, que sempre trouxe resultados positivos para o Brasil. Até as vitórias eleitorais dependem do centro no País, mesmo quando ele não vence as eleições. O que fez o Bolsonaro ganhar a eleição em 2018 não foi o bolsonarismo. Foi o centro. Com o Lula foi a mesma coisa. Foi só quando ele conseguiu ganhar o centro é que foi eleito. Vendo esse cenário hoje, o Lula está procurando o Alckmin, porque sabe que a arbitragem de tensão pode lhe dar um favoritismo ainda maior do que já apresenta nas pesquisas. Na eleição passada, havia duas narrativas, a do Bolsonaro e a do PT. Hoje tem três: a do Bolsonaro, a do PT e a do ‘não quero nenhum dos dois’

A questão é que, hoje, a gente vive uma forte polarização no País, que já vem de algum tempo. Como buscar o consenso e fazer as coisas caminharem neste sentido em meio à polarização?
A polarização não é ruim por si só. Os Estados Unidos, por exemplo, são polarizados desde que nasceram, com dois partidos fortes e um grupo independente. A Inglaterra tem dois ou três partidos.  No Brasil, o topo da pirâmide é polarizado, mas a base, não. Não adianta os candidatos a presidente serem polarizados e as narrativas federais serem polarizadas se quem decide não é. O Congresso Nacional não é polarizado. As assembleias e as câmaras municipais, também não. Nem os fóruns de políticas públicas. Quando o topo da cadeia não consegue conversar com a parte de baixo, a cadeia entra num impasse político.

Toda eleição é importante, mas muitos analistas têm dito que essa eleição é “a mais importante” das últimas décadas para o Brasil. O sr. também pensa assim?
Eu não vejo desta forma. Toda eleição é mais importante do que a anterior e menos importante do que a próxima. Talvez esta eleição seja mais interessante do que as do passado, porque será menos polarizada do que a de 2018. Na eleição passada, havia duas narrativas, a do Bolsonaro e a do PT. Hoje tem três: a do Bolsonaro, a do PT e a do “não quero nenhum dos dois”. Agora, se você perguntar para qualquer um por que esta eleição é mais importante, todo mundo vai dizer que é por causa da democracia, das instituições, do não sei o quê. Mas cada eleição tem o apelo do momento.

Olhando o quadro eleitoral como está posto hoje, considerando os diversos candidatos a candidatos, como o sr. vê a perspectiva de o País caminhar no sentido desse consenso no próximo governo?
Se não houver um mínimo de consenso em 2023, o País vai ter imensas dificuldades. Quando digo consenso, não precisa envolver todo o País. Não precisa estar todo mundo na mesma página. Mas uma parte relevante precisa concordar no mínimo com algumas coisas. Acredito que quem quer que seja o próximo presidente vai ter de seguir a cartilha de Brasília, de buscar o apoio do Congresso, de um presidencialismo de coalizão, de alianças com partidos que pensam diferente, porque se isso não acontecer a agenda não vai avançar. O Congresso continuará forte, mais independente e autônomo do que no passado, e com mais controle sobre o orçamento, derrubando vetos, como a gente viu neste governo. O presidente Bolsonaro bateu o recorde em vetos revertidos pelo Congresso, que tem hoje uma série de mecanismos para fazer o presidente levá-lo a sério.