Moro diz que trecho do pacote anticrime que levou à soltura do traficante André do Rap deve ser revisto

Moro chegou a recomendar o veto do trecho sancionado por Bolsonaro

Deu no G1

O ex-ministro da Justiça Sergio Moro defendeu nesta segunda-feira, dia 12, em entrevista à GloboNews, que seja revisto o trecho do pacote anticrime que levou à soltura do traficante André Oliveira Macedo, conhecido como André do Rap. O habeas corpus foi concedido pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello com base em um trecho do pacote anticrime – em vigor desde janeiro – que determina reavaliação das prisões preventivas em todo o país a cada 90 dias. Essa reavaliação não foi feita no caso do traficante libertado.

O projeto do pacote anticrime foi idealizado pelo então ministro Moro e por uma comissão de juristas, em 2019, mas essa regra foi incluída pelo Congresso Nacional. Moro ainda chegou a recomendar o veto do trecho, que acabou sendo sancionado pelo presidente Jair Bolsonaro e entrando em vigor. “Este é o momento de discutir a revisão dessa parte da lei, ou pelo Congresso, ou pelos tribunais”, disse Moro. Segundo o ex-ministro, “daqui a pouco pode ter assassino sendo solto” com base no mesmo dispositivo.

SEGUNDA INSTÂNCIA –  Na entrevista à GloboNews, Moro também defendeu que a soltura de André do Rap poderia ter sido evitada de outra forma: com a restauração da prisão após condenação penal em segunda instância. Há onze meses, o STF mudou o entendimento vigente e estabeleceu que os condenados só podem começar a cumprir pena quando o processo transitar em julgado – ou seja, após esgotados todos os recursos.

O Congresso avalia projetos de lei que autorizam a prisão após condenação em segunda instância. Desse ponto em diante, os recursos apresentados não podem pedir a reavaliação das provas e dos fatos daquele caso, mas só questões de aplicação do direito. Por isso, há juristas e autoridades que defendem o início da execução da pena a partir da condenação na segunda instância, mesmo que os recursos continuem a tramitar.

DEFINITIVA – O traficante André do Rap já tem uma condenação penal em segunda instância. Por isso, se esse entendimento estivesse sendo aplicado, a prisão dele seria definitiva, e não preventiva. “Essa [prisão após segunda instância] é uma pauta importantíssima, aí não tem mais prisão preventiva. Esse indivíduo nunca ia ser solto, porque já ia estar cumprindo pena, sem qualquer necessidade de nós pensarmos em falar em rever prisão preventiva”, afirmou Moro.

Moro sugeriu, na entrevista, que o presidente Jair Bolsonaro aproveite a existência de uma base aliada maior e mais organizada no Congresso, atualmente, do que na época da votação do pacote anticrime. “O presidente hoje tem um contato mais próximo com o parlamento, tem um controle maior. Penso que poderia, fica aqui uma sugestão, um conselho construtivo, utilizar esse poder e toda essa popularidade para tentar rever algumas dessas pautas”, disse o ex-ministro. Moro afirmou ainda que, como ministro da Justiça, atuou durante a tramitação do pacote anticrime para evitar inserções de temas que, na visão dele, seriam ruins para o texto.

“Fiz diversas reuniões no Congresso, com parlamentares, conversei amplamente dentro do Poder Executivo sobre esses temas. Talvez a falha tenha sido minha de não ter conseguido convencer as pessoas de que esses dispositivos não eram os melhores. Mas eu diria que eu, particularmente, tenho a consciência tranquila de que fiz tudo que podia para evitar algumas inserções”, afirmou.

O CASO – André do Rap é um dos chefes do Primeiro Comando da Capital (PCC), facção criminosa que atua dentro e fora dos presídios de São Paulo. Ele foi libertado no sábado (10) após a concessão de um habeas corpus pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Marco Aurélio Mello. Horas depois, o presidente do STF, Luiz Fux, suspendeu a decisão e determinou o retorno de André à prisão. No entanto, investigações apontam que ele viajou em um jatinho particular para o Paraguai.

Moro disse discordar da decisão de Marco Aurélio Mello. Segundo o ex-ministro, mesmo por esse entendimento, a solução ideal seria levar o caso ao juiz que determinou a prisão preventiva inicialmente.

MELHOR SOLUÇÃO – “Me parece que a melhor solução, e eu não quero entrar em nenhuma controvérsia aqui envolvendo o Supremo Tribunal Federal, seja o entendimento de que isso [a revisão da prisão tem que ser provocado. Isso tem que ser exigido pelo juiz emissor da decisão, de primeira instância, normalmente”, defendeu Moro.

“Se a questão for levada diretamente à corte recursal [o STF], que a corte recursal emita uma decisão pedindo que o juiz [de primeira instância revise, decida, aprecie a questão. E não simplesmente entender que [a prisão] se torna ilegal pelo mero decurso do tempo”, disse.