Enquanto durar o inquérito, Celso de Mello até pode afastar Bolsonaro da Presidência

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Jorge Béja

O deputado federal Marcelo Calero (Cidadania-RJ), ex-ministro da Cultura,  pediu ao ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, o afastamento provisório de Jair Bolsonaro do exercício da presidência da República, enquanto durar o inquérito na Polícia Federal do Paraná, que apura fatos graves imputados ao presidente pelo então ministro Sérgio Moro, no discurso de despedida do cargo.

Em primeiro lugar, é preciso examinar a questão da legitimidade de Marcelo Calero para ingressar nos autos do inquérito e nele peticionar. A resposta é difícil. Mas como em Direito e em processo tudo é possível, a legislação tem brecha para tudo.

LEGITIMAÇÃO – talvez seja reconhecida a ele a legitimação para figurar como terceiro interessado, ou litisconsorte-acusatório (assistente), ou mesmo amigo da corte. E ainda, como deputado federal, representação do eleitor. E mesmo, ele próprio, como eleitor. O regime é democrático. E os eleitos nada mais são do que mandatários dos eleitores. E nós, eleitores, é quem somos os mandantes-outorgantes do mandato que concedemos a quem elegemos.

Se ultrapassada a questão da legitimação ativa processual, examinemos, então, o pedido do deputado. À primeira vista, não existe amparo na Constituição Federal. A Carta da República é bem clara ao dispor que o presidente da República ficará suspenso de suas funções: nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal. E também nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal (artigo 86, parágrafo 1º, I e II).

CRIMES COMUNS – Vamos ao raciocínio. O inquérito na PF do Paraná apura crimes comuns, apontados pelo procurador-Geral da República Augusto Aras. Então, seria o caso da hipótese do nº 1, do parágrafo 1º do artigo 86 da CF. No entanto, nem existe queixa-crime nem denúncia recebida pelo STF. Logo, fica descartada a aplicação daquele dispositivo constitucional que afasta o presidente da República de suas funções.

Portanto, numa primeira e superficial leitura, o pedido do deputado não poderia ser deferido pelo ministro Celso de Mello. Por outro lado, Marcelo Calero cita precedente do próprio STF, que afastou Eduardo Cunha da presidência da Câmara dos Deputados, e mais um do Superior Tribunal de Justiça, que afastou Luiz Fernando Pezão do exercício do cargo de governador do Estado do Rio de Janeiro.

Foram afastamentos cautelares decretados no curso de investigações contra ambos. São precedentes fortes e coerentes. Se o Poder Judiciário pode afastar do cargo presidente da Câmara dos Deputados e governador de Estado federado, por que não poderia, também, afastar cautelarmente, o presidente da República do exercício do cargo?

MEDIDAS CAUTELARES – O processo penal prevê a concessão de medidas cautelares. Até mesmo que não estejam elencadas na lei, que são as chamadas cautelares inominadas. A situação em que vive o governo Bolsonaro, ridicularizado e isolado no mundo, de gestos, atitudes e  comportamentos agressivos, externando ódio, desprezando os mais comezinhos princípios republicanos, descompromissado com a nobreza e liturgia do cargo, querendo por querer transformar a Polícia Federal como instituição do poder, e não do Estado Brasileiro… tudo isso e muito mais pode contribuir, de maneira forte, para que Celso de Mello, numa decisão sem precedente na História do Brasil, decida mesmo, no dia de hoje, quarta-feira, ou no de amanhã, quinta-feira, acolher a petição do deputado Calero e ordenar, cautelarmente, o afastamento de Bolsonaro do exercício da presidência da República, até a conclusão do inquérito policial a cargo da PF do Paraná.

Aguardemos, pois.