‘Participação das Forças Armadas no governo é positiva’, diz cientista político. Por Ruan de Sousa Gabriel

Bremmer afirma que os militares estão evitando os radicalismos

Por Ruan de Sousa Gabriel

O cientista político americano Ian Bremmer não acredita que o Brasil avance rumo ao autoritarismo, mas alerta que o país tem sérios desafios estruturais a enfrentar. No entanto, a inexperiência administrativa do presidente Jair Bolsonaro e sua resistência em dialogar com quem discorda dele, diz Bremmer, atrapalham as reformas.

Nesta entrevista, por telefone, Bremmer, que é fundador da consultoria de risco Eurasia Group, comentou as diferenças entre Bolsonaro e o presidente americano Donald Trump e o que o brasileiro tem a ganhar se ajudar a Venezuela a superar a crise.

Como o governo Bolsonaro é visto no exterior?

Muitos líderes internacionais estão inclinados a não gostar de Bolsonaro e considerá-lo retrógrado por sua amizade com Trump. Há muitas diferenças entre Bolsonaro e Trump. Bolsonaro é muito mais humilde e capaz de ouvir conselheiros. Ele sabe que depende muito do Congresso. Mas ele também é mais ideológico do que Trump em várias questões sociais. Estive no Brasil na semana passada e me surpreendi porque o país está mais dividido e politicamente disfuncional do que nos tempos da Lava-Jato. O governo Bolsonaro acirrou a polarização.

Como superar a polarização?

As redes sociais, que Bolsonaro sabe usar bem, fortaleceram a polarização. Precisamos encontrar meios de regulá-las para combater as fake news e o hábito de muitos brasileiros de só ouvir quem concorda com eles, o que cria mais radicalismo e menos oportunidades de engajamento cidadão. Além disso, enquanto a economia e os serviços públicos brasileiros não melhorarem, a raiva vai continuar.

O mercado se precipitou ao confiar na conversão de Bolsonaro ao liberalismo econômico?

O problema não são as crenças econômicas de Bolsonaro, mas a falta de vontade dele de fazer política e buscar a colaboração de quem nem sempre concorda com ele. Bolsonaro é inexperiente. Os deputados se assustaram com a última eleição, quando houve uma renovação histórica do Congresso, e têm medo de aprovar medidas impopulares. Os mercados se animaram com Paulo Guedes, que representa exatamente as política econômicas que eles queriam, mas se esqueceram de que elas são de difícil implementação.

Os militares são vistos como a ala moderada no governo. Há risco de enfraquecimento do poder civil com tantos militares no governo?

Não. O Brasil tem instituições fortes. É útil que os militares brasileiros contem com apoio popular, sejam considerados éticos e defensores da lei e da ordem, e não usurpadores dos poderes do governo. Nos Estados Unidos, tínhamos a tradição de nomear civis para o Departamento de Defesa, mas Trump indicou o general Jim Mattis. Houve reclamações, mas, além de ser íntegro e inteligente, Mattis estava disposto a enfrentar os impulsos autoritários de Trump. É bom para o governo e para a estabilidade do país que os militares sejam capazes de fazer frente aos aliados mais extremistas de Bolsonaro.

A oposição acusa Bolsonaro de autoritarismo e ineficiência. O senhor concorda?

Não creio que o Brasil esteja a caminho do autoritarismo. Analistas políticos erraram, a meu ver, ao tomar Bolsonaro por um fascista que despreza as instituições. O Brasil tem desafios estruturais sérios a ser enfrentados. Precisa de um governo que saiba governar, de tecnocratas, de gente que conheça a burocracia. Quando votamos, em vez de escolher candidatos experientes, acabamos escolhendo quem é bom de campanha. Ser bom de campanha é diferente de ser bom de governo.

Como o Brasil pode contribuir para a resolução da crise venezuelana?

O Brasil deve apoiar as pressões diplomáticas e sanções econômicas e oferecer ajuda humanitária aos venezuelanos. Pode ajudar a negociar, por exemplo, qual será o papel do exército após a queda de Nicolás Maduro, porque os militares continuarão a ter influência. Um esforço multilateral liderado pelo Brasil tem mais chances de sucesso do que se o protagonismo for dos Estados Unidos. E isso pode ajudar na credibilidade de Bolsonaro na região.

O mundo atravessa uma crise democrática?

Sim, mas não estamos à beira do fascismo. Uma das razões da crise democrática são as desigualdades econômicas e os sentimentos de privação de direitos e de que o sistema político é corrupto e está contra o povo. Em alguns lugares, há também o sentimento anti-imigração. E há as redes sociais. Muitos líderes autoritários usam as novas tecnologias para dividir a sociedade e enfraquecer as instituições e a democracia liberal.

Tribuna da Internet

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