Bloco que ‘nunca para’ interrompe folia para buscar mãe de criança perdida no Rio

Músicos e foliões do Boi Tolo se sentaram no chão para achar vendedora ambulante e reunir família no Centro

No desfile do Cordão do Boi Tolo, componentes e foliões ajudam criança a reencontrar a mãe depois de ter se perdido na multidão. Na foto, momento do reencontro entre mãe e filho. Foto: Márcia Folleto / Agência O Globo Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo
No desfile do Cordão do Boi Tolo, componentes e foliões ajudam criança a reencontrar a mãe depois de ter se perdido na multidão. Na foto, momento do reencontro entre mãe e filho. Foto: Márcia Folleto / Agência O Globo Foto: Márcia Foletto / Agência O Globo

Por Paula Ferreira

 Conhecido por ser incansável, o bloco Boi Tolo — que segundo os foliões, nunca para — parou por volta das 10h por uma causa nobre: encontrar a mãe de uma criança que se perdeu no Centro do Rio. Durante cerca de 20 minutos os músicos deram uma pausa na folia e se sentaram no chão para encontrar a vendedora ambulante Ágata Januário, mãe do pequeno Rafael.
Foliões e músicos se abaixam durante o Boi Tolo, no Centro do Rio Foto: Marcia Foletto / Agência O Globo
Foliões e músicos se abaixam durante o Boi Tolo, no Centro do Rio Foto: Marcia Foletto / Agência O Globo

Uma catarse coletiva atingiu o bloco quando a vendedora adentrou o cordão acompanhada pelo marido e encontrou o filho. O momento, provavelmente, foi mais um daqueles que entram para história do carnaval de rua do Rio.

Aliviada após encontrar o pequeno Rafael, Ágata, que ganha R$ 70 por um dia inteiro de trabalho vendendo as bebidas que fazem a onda dos foliões, contou que a criança estava com uma pulseira de identificação mas acabou arrebentando. Ao lado dela, o filho de uma vizinha que Ágata levou para o bloco ostentava a pulseirinha.

— Em um segundo ele sumiu. Senti desespero e agora felicidade. Eu fiquei impressionada com a humildade e a simplicidade desse bloco. Eles pararam de tocar para me encontrar — disse.

Moradora de um conjunto do Minha Casa, minha vida na Zona Norte, a vida de Ágata, 28 anos, não é fácil. A vendedora trabalha catando latinhas para tentar sustentar os cinco filhos.

Carnaval da ‘ilusão’

Em meio ao cotidiano difícil e uma vida de privações, não conseguiu dar café da manhã para Rafael antes de ir para o bloco.

— Estou tentando fazer um dinheiro para dar algo para ele comer. O pão aqui na cidade é muito caro. Se eu vender pelo menos 20 reais já posso usar esse dinheiro, mas ele é abatido dos R$ 70 que ganho por dia — explica.

Entre o anúncio de uma promoção e outra, Ágata contou ao GLOBO que está com o “condomínio” que é obrigada a pagar ao tráfico atrasado e corre o risco de ser despejada de seu apartamento, para onde se mudou ao deixar o barraco de madeira que ocupava.

— O carnaval é sempre uma ilusão. Meus filhos acabam sofrendo por eu ficar longe trabalhando. Onde eu moro, cada vez mais as mães abandonam seus filhos, mas eu estou lutando. Hoje as coisas parecem impossíveis, mas uma hora elas mudam. Vivo por meus filhos e para mantê-los protegidos — conta ela, que só estudou até a sexta série.

Enquanto a mãe concedia a entrevista, Rafael olhava hipnotizado os carros alegóricos que cruzavam a Presidente Vargas.

— Eu quero andar neles! — exclamou, perguntando se podia para vê-los no desfile.

Depois de admirar o luxo das alegorias que mais tarde estarão na avenida, perguntou à repórter:

— Cadê a sua mãe?

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