Entenda o racha entre o clã Bolsonaro e Gustavo Bebianno

Polêmica envolvendo fraude eleitoral colocou em lados opostos Jair Bolsonaro e Gustavo Bebianno – coordenador de sua campanha eleitoral e atual secretário Geral da Presidência

Entenda o racha entre o clã Bolsonaro e Gustavo Bebianno
(Foto: Instagram/Gustavo Bebianno)
Uma crise envolvendo denúncias de fraude eleitoral colocou em lados opostos o presidente Jair Bolsonaro e o PSL – partido pelo qual se elegeu para a presidência da República.

Paradoxalmente, o imbróglio teve início após uma tentativa do ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gustavo Bebianno – que presidiu o PSL durante a campanha eleitoral de Bolsonaro –, de demonstrar coesão no governo.

Desde o início deste mês, o PSL vem sendo alvo de denúncias de uso de candidaturas laranja para desviar verba do fundo eleitoral. A primeira veio à tona no dia 4, e envolveu o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio. Na data, uma reportagem do jornal Folha de S. Paulo apontou que o ministro usou quatro candidaturas falsas nas eleições de 2018 para desviar recursos do fundo.

Quatro candidatas apoiadas por Marcelo Álvaro em 2018, quando ele presidia o PSL de Minas Gerais, receberam do partido R$ 279 mil originários do fundo eleitoral – que é irrigado com dinheiro do contribuinte. Do total, R$ 85 mil foram parar em contas de quatro empresas de assessores, parentes ou sócios de assessores de Marcelo Álvaro.

A segunda denúncia envolvendo o partido veio à tona no último dia 10, também em uma reportagem da Folha, e envolve a candidatura de Maria de Lourdes Paixão, de 68 anos, cuja candidatura a deputada federal nas eleições foi a terceira maior beneficiada com verba do PSL em todo o país. Maria de Lourdes – que é secretária administrativa do PSL em Pernambuco – recebeu do partido R$ 400 mil no dia 3 de outubro, apenas quatro dias antes da votação de primeiro turno. Apesar da alta soma, ela teve uma atuação inexpressiva no pleito, o que indica uma candidatura laranja.

Na prestação de contas do partido consta que Maria de Lourdes gastou 95% da verba (R$ 380 mil) em uma gráfica chamada Itapissu, em Recife, para impressão de 9 milhões de santinhos e cerca de 1,7 milhão de adesivos. No entanto, uma equipe da Folha visitou o local e não encontrou indícios de que a gráfica tenha funcionado durante as eleições.

Na época em que a verba foi repassada a Maria de Lourdes, Bebianno era presidente interino do PSL – uma vez que o presidente e fundador da legenda, Luciano Bivar, estava de licença do cargo desde o primeiro semestre de 2018. Na época, Bebianno coordenava a campanha de Bolsonaro com um intenso discurso de combate à corrupção.

A suspeita é de que o grupo de Bivar, que é de Pernambuco, tenha criado uma candidatura laranja, a de Maria de Lourdes, para desviar verba do fundo eleitoral. Isso porque, apesar de estar de licença, o grupo de Bivar chancelou as candidaturas ao pleito eleitoral. No início deste mês, Bivar assumiu a 2ª Vice-Presidência da Câmara dos Deputados, aumentando a influência do PSL no Congresso.

No último fim de semana, questionado por repórteres do Globo, Bebianno negou ter protagonizado uma crise no governo e disse ter conversado com Bolsonaro três vezes naquele dia. “Não existe crise nenhuma.  Só hoje falei três vezes com o presidente”, disse o ministro da Secretaria Geral da Presidência.

A informação, no entanto, foi desmentida momentos depois, pelo vereador Carlos Bolsonaro (PSL-RJ), filho do presidente da República. Em sua conta no Twitter, Carlos Bolsonaro negou que Bebianno tenha conversado com seu pai, afirmando que a declaração dada ao Globo era uma “mentira absoluta”.

Em uma postagem seguinte, Carlos publicou um áudio de seu pai, na qual, em uma suposta conversa com Bebianno e notavelmente irritado, o presidente dizia que não podia conversar com o ministro naquele momento.

Cabe ressaltar que esta não é a primeira vez que Carlos e Bebianno se indispõem. Em novembro do ano passado, Carlos deixou de atualizar as redes sociais de seu pai, algo que fazia desde a campanha presidencial. O motivo foi a indicação de Bebianno para a Secretaria de Comunicação Social (Secom) da presidência. A indicação de Bebianno, com quem Carlos não tem boa relação, irritou o filho do presidente, que havia sido cogitado pelo pai para o cargo.

Na noite da última quarta-feira, 13, horas após receber alta hospitalar, Jair Bolsonaro jogou mais gasolina na polêmica, ao retuitar a postagem de seu filho, sinalizando respaldo às afirmações de Carlos.

Além disso, pouco antes de receber alta, Bolsonaro concedeu entrevista à Rede Record, na qual também afirmou que não conversou com Bebianno e disse que demitirá o ministro, se for comprovado fraude eleitoral.

“Se estiver envolvido, logicamente, e responsabilizado, lamentavelmente o destino não pode ser outro a não ser voltar às suas origens. Em nenhum momento conversei com ele”, disse Bolsonaro, afirmando ainda que pediu à Polícia Federal para apurar as denúncias.

Em entrevista ao Blog da jornalista Andréia Sadi, Bebianno disse que não pretende pedir demissão porque considera não ter feito nada de errado. “Não tenho essa intenção porque não fiz nada de errado. Meu trabalho continua sendo em benefício do Brasil. O presidente, se entender que eu não deva mais continuar, ele certamente vai me comunicar. Mas até aqui minha relação com ele foi sempre a melhor possível, da minha parte tudo foi feito com honestidade, correção e vamos esperar para ver o que acontece”, disse Bebianno.

A atuação de Carlos Bolsonaro no caso gerou críticas em relação à ingerência dos filhos do presidente em assuntos do Planalto, algo que já vinha sendo criticado anteriormente.

“Não se pode misturar as coisas. Filho de presidente é filho de presidente. Temos de tomar cuidado para não fazer puxadinho da Presidência da República dentro de casa pra expor um membro do alto escalão do governo desse jeito”, disse a deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), uma das estrelas novatas do PSL.

Outros expressaram surpresa com a rapidez e rispidez com que Bolsonaro se voltou contra um antigo aliado, o que, segundo fontes ouvidas pelo Blog Painel, da Folha, foi considerado um “açoite em praça pública” e uma lição de que o clã Bolsonaro não hesitará em jogar aos leões quem quer que seja para salvar a própria pele.

A polêmica envolvendo denúncias de fraude eleitoral ocorreu no mesmo fim de semana em que outro filho do presidente, o senador Flávio Bolsonaro (PSL-RJ) enfrentou um revés em uma investigação sobre a evolução de seu patrimônio.

A 2ª Câmara Criminal de Revisão do Ministério Público Federal vetou uma tentativa de Sidney Madruga, procurador regional eleitoral do Rio de Janeiro, de encerrar a investigação sobre o caso, sem sequer ter aberto uma diligência. A ação em questão envolve a suspeita de que Flávio superfaturou valores de imóveis em sua declaração de bens à Justiça Eleitoral. Além de vetar a iniciativa de Madruga, a 2ª Câmara Criminal determinou o aprofundamento da investigação.

A ação não tem relação com outro “espinho no pé” de Flávio Bolsonaro: a denúncia envolvendo as movimentações atípicas de Fabrício Queiroz, seu ex-assessor na Assembleia Legislativa do Rio (Alerj). Recentemente, Flávio também sofreu um revés nesta ação, após ver frustrada sua tentativa de usar a prerrogativa do foro privilegiado para retirar a investigação das mãos do Ministério Público do Rio de Janeiro e levar o caso para o Supremo Tribunal Federal (STF).

No dia 7 deste mês, ao analisar o pedido, a procuradora-geral Raquel Dodge entendeu que os fatos investigados não têm relação com o exercício do mandato atual de senador, logo não cabe a prerrogativa do foro privilegiado. Dodge, então, devolveu o inquérito para a Procuradoria Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (PRE-RJ).

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