Famílias dos pilotos contestam relatório do Cenipa

Famílias divulgam relatório sobre acidente que matou Eduardo Campos. Perito contratado pelas famílias dos pilotos questiona vários pontos do relatório divulgado pela Aeronáutica na última terça-feira (19)

Do Jornal Nacional

Na terça-feira (19) foi a Aeronáutica. Nesta quarta (20), foram as famílias do piloto e do copiloto que divulgaram um relatório particular sobre as da queda de um avião em Santos, em 2014. No acidente, morreram o então candidato a presidente Eduardo Campos e outras seis pessoas.

O relatório do Cenipa, Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos, divulgado na terça-feira (19), apontou os principais fatores que, segundo as investigações, contribuíram para a queda do avião que matou Eduardo Campos, candidato do PSB à presidência, e mais seis pessoas em agosto de 2014.

São eles: condições meteorológicas ruins, chovia naquele dia; desorientação espacial dos pilotos, que perderam o controle da situação por causa da redução da visibilidade, estresse e aumento da carga de trabalho em função da arremetida depois do pouso frustrado; indisciplina de voo: o piloto Marcos Martins e o copiloto Geraldo Magela seguiram uma trajetória de aproximação para pouso diferente da indicada para aquela pista. A rota pré-determinada obrigava o avião a sobrevoar a pista duas vezes, desenhando um longo oito no ar. Mas o piloto tentou fazer um pouso direto, segundo informações colhidas pelos radares e o mapa fornecido pelo Cenipa.

“A tripulação também não solicitou essas informações que seriam muito importantes para o julgamento: se está operando por instrumento, eu quero saber qual o meu teto, minha visibilidade, para poder me encaixar dentro do perfil da carta, de acordo com a performance da aeronave”, avalia o tenente coronel.

O relatório do Cenipa também listou fatores que podem ter contribuído para o acidente: fadiga, os resultados na análise de voz, fala e linguagem do copiloto indicaram que ele estava cansado e sonolento; a falta de rigor na seleção da tripulação. Os contratantes não verificaram se o piloto e copiloto tinham experiência para pilotar o avião e se estavam com o treinamento em dia; treinamento inadequado: segundo o relatório, provavelmente, piloto e copiloto não possuíam habilidades, conhecimentos e atitudes que possibilitassem desempenhar adequadamente suas atividades naquela situação de risco; o relatório aponta também que eles não fizeram treinamento específico para pilotar o avião do acidente.

O perito Carlos Camacho, contratado pelas famílias dos pilotos, questiona vários pontos do relatório. Critica a informação de que pela voz eles aparentavam cansaço.

“Nós temos regionalismo. O gaúcho fala de uma maneira, o mineiro fala de forma calma, tranquila, elegante, sem pressa. Se entender isso como sonolência, nós temos quantos milhões de mineiros sonolentos”, ele diz.

Afirma ainda que os pilotos tinham muita experiência. “Todo piloto decola em algum momento. Eu não preciso de treinamento para decolar porque eu já tenho esse treinamento, eu já decolo no meu dia a dia”, aponta Camacho.

E reclama que não houve análise de uma possível falha do avião. “Eu e minha equipe concluímos que houve sim uma falha material e a falha material tem a ver com o fabricante e o fabricante tem a ver com o projeto”, afirma o perito.

Ele também explicou que aviões desse tipo tem um mecanismo na cauda chamado estabilizador que dependendo da posição que ele estiver faz com que o nariz do avião vá para baixo ou para cima. Uma falha no sensor de velocidade fez o computador do avião emitir uma informação errada para o estabilizador, segundo a investigação particular.

Para o perito, com essa falha, era impossível controlar o avião. “O próprio fabricante incluiu esse sensor de velocidade no seu manual dizendo se esse sensor falhar, falhasse, o senhor poderá ter um abaixamento abrupto do nariz porque o estabilizador horizontal vai mudar de posição, se o avião vai estar acelerando, e o senhor não terá mais controle dele. Portanto, reze pra estar em altitude porque se não estiver, o senhor vai bater”, comenta Carlos Camacho.

Jornal Nacional: Como o senhor conseguiu a chegar a essa conclusão de que houve um problema no estabilizador?
Carlos Camacho: Fazendo estudos em aviões que já se acidentaram ou se incidentaram fora no Brasil, casos na Suíça, temos dois casos.

A lista que ele diz é esta com acidentes da família Citation, a mesma do avião que caiu em Santos. Nessa lista aparece dois aviões iguais que tiveram a mesma falha apresentada pelo perito e outro modelo que caiu ano passado com dois executivos do Bradesco.

Mas o perito reconhece que ele não analisou os destroços do avião. “Não temos como analisar porque isso aí está sob os cuidados do Cenipa, é ele quem tem a prerrogativa de controlar todos os acervos, todos os materiais, nós simplesmente nos baseamos em casos havidos”, diz o perito.

O advogado diz que independentemente do culpado, o valor da indenização não muda. “Se o dano foi causado por A ou B, o dano é o mesmo, se ele foi causado por falha humana ou falha mecânica, a indenização é exatamente a mesma, não há diferença na indenização”, afirma Ruben Seidl, advogado das famílias dos pilotos.

O especialista em gerenciamento de risco Gustavo Cunha Mello explica quem deve pagar essa conta. “As famílias pedem indenização ao líder da operação, o dono do avião, o dono da empresa de táxi aéreo que arrendou o avião ao partido. Este é responsável pela operação pelo aluguel do avião à campanha presidencial”, ele diz.

O desafio para os advogados das famílias dos pilotos é justamente esse: descobrir de quem é o avião. Até agora, ninguém esclareceu com precisão quem era o proprietário porque até a data do acidente o processo de transferência do leasing da aeronave, uma espécie de financiamento, não tinha sido concluída. E de acordo com o código aeronáutico brasileiro, o prazo para entrada com uma ação de indenização é de dois anos, a partir da data do acidente. Ou seja, vence em agosto desse ano.

O Centro de Investigação de prevenção de Acidentes Aeronáuticos declarou que as conclusões do relatório sobre o acidente foram resultado de quase um ano e meio de trabalho com a participação de pilotos, médicos, psicólogos e engenheiros. E que o objetivo do relatório é a formulação de recomendações para a prevenção de acidentes, que aumentem a segurança na aviação.

A fabricante do avião que caiu – a Cesna Aircraft Company – declarou que trabalha com as autoridades governamentais de aviação e que não comenta as investigações.

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