Meu pai e o legado de “Sem Lei nem Rei”

Por Antonio Campos

  Deus, na sua infinita e piedosa sabedoria, onipresente, onisciente, onipotente, no instante da criação do Homem, depois da Matriz inicial do Universo, deu-lhe o dom da memória e do esquecimento. Esta faculdade você e eu, leitor, a possuímos como herança do coroamento da obra da criação primordial. Somos todos frutos, também, da memória e do esquecimento. A passagem recente dos 15 anos da morte de meu pai, ele que é o grande inspirador da obra cultural que realizo em Pernambuco, e de sua vida e da sua obra literária também inspiradora da minha trajetória intelectual, chega à minha memória e por certo à memória de todos de minha família, n dia dos pais que vamos comemorar.

 

Dou à palavra memória e suas florações mágicas, o significado que o mestre Harold Bloom (1930), o mais arguto de todos os críticos literários, deu no seu “Cânone Ocidental”: “A memória é sempre uma arte, mesmo quando atua involuntariamente”.   Não a lembrança de um certo dia que assinalou uma grande perda das nossas vidas, mas uma data em que se iniciava um novo ciclo da  existência de meu pai – agora sem as dores do existir como naquele poema de Emily Dyckson (1830-1886): a certeza, que se amplia no tempo, do legado de pai, este espelho que legitima em mim o orgulho de ser seu filho. A memória dele, os primeiros estímulos e exigências, que ele sempre soube cultivar.

 

O dom do esquecimento, outra misericórdia do Criador, me faz sentir a necessidade de esquecer, às vezes, para amenizar a dor. Busco conforto e encontro em Jorge Luiz Borges (1989 – 1986), esta expressão transparente e múltipla como os espelhos do seu jogo de Ficção e Poesia: “Eu não falo de vingança nem de perdão, o esquecimento é a única vingança e o único perdão”.

 

O livro – Sem Lei Nem Rei, de Maximiano Campos, meu pai, sobre o qual me debruço na passagem dos 45 anos de sua publicação, que se dá esse ano, é um livro que ficou na geografia literária nordestina e brasileira. Apesar de todo medo e desencanto de um tempo real e romanesco retratados nesse livro, há uma recusa do panfletário, (”pois medo não é proteção”), um estilo essencialmente seletivo, que se revela na precisão conceitual conferida à grande ficção.

 

O Instituto Maximiano Campos, com 12 anos de existência,  que lançou, essa semana, a 9ª edição do seu concurso literário,  tem buscado preservar a sua memória literária e humanística e apoiar outras iniciativas culturais, deixando vivo e presente o seu legado de artista e de pai.

 

Antônio Campos

 

Advogado, Escritor, Editor, Membro da Academia Pernambucana de Letras e Curador da Fliporto.

Um comentário sobre “Meu pai e o legado de “Sem Lei nem Rei”

  1. A meu pai, Zeca
    Robson Sampaio

    O manto da morte sobressaiu-se
    na escuridão da noite.
    Ao amanhecer,
    a tua alma confundiu-se com
    esparsas nuvens.
    O lacrimejar dos olhos não
    me transformou em correntezas,
    mas o meu coração inundou-se
    com um mar de saudades,
    pai…

    * Saudades de Dinah, Zé Neto, Robson,
    César, Gibson e Jackson.

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