Jorge Béja
Naquele dia de 1983, as emoções começaram cedo. Por volta das 8 e meia da manhã, juntos, chegam ao meu escritório os dois maiores e notáveis repórteres do jornalismo policial que o Rio já teve e que são insubstituíveis: Albeniza Garcia e Zé Grande, ambos de “O Dia”.
Albeniza chorava muito. Mesmo inocente e vitimada, Albeniza estava respondendo a 14 inquéritos policiais nas delegacias do Rio e a 6 ações penais nas varas criminais do TJRJ. Motivo: estelionato. Os dois talonários de cheques que o banco enviou para Albeniza por via postal foram extraviados. E o criminoso usou os talões.
NO MESMO DIA… – Em poucos meses consegui devolver a paz e a alegria a Albeniza. Mas esta é uma outra história que poderei reviver outro dia, caso o nosso editor, jornalista Carlos Newton – outro notabilíssimo na profissão e que graças a Deus está entre nós – permita que eu escreva a respeito.
Mas a recordação de hoje é carregada de fortes emoções, porque no mesmo dia, assim que Albeniza e Zé Grande deixaram o escritório, fui para agência dos Correios na Praça Mauá.
De posse do número do telex da Hospital de Cleveland, onde o então presidente Figueiredo estava internado para a colocação de ponte de safena e marca-passo, enviei ao presidente um pedido de socorro. “Para o Presidente do Brasil, João Baptista Figueiredo”. Este foi o título da mensagem.
FIZ UM PEDIDO – No texto, desejei o pronto restabelecimento e o retorno ao Brasil, inteiramente curado. E fiz um pedido. Disse que minha idosa tia Maria Madalena Béja, de Quatis, estava à beira da morte, internada no Hospital da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN)l, em Volta Redonda, à espera da colocação de um marca-passo.
Naquela época a CSN e o hospital eram do governo federal. No texto do telex, escrevi que a direção do hospital alegava que a paciente poderia morrer a qualquer momento. Que os batimentos cardíacos de Tia Maria estavam fraquinhos. Que o hospital não tinha marca-passo e estava aguardando o Ministério da Saúde enviar. E pedi que o presidente, lá de Cleveland, cuidasse do caso. Que não deixasse minha tia morrer…
Expedido o telex (naquele tempo nem fax existia, quanto mais internet) voltei para o escritório. Ao chegar, encontrei Carlos Magno, repórter do Jornal do Brasil, que me pediu uma entrevista sobre o sequestro do menino Carlinhos, tirado de casa na Rua Alice, crime até hoje não resolvido.
DEI A ENTREVISTA – Eu era amigo e advogado do pai de Carlinhos, João Mello da Costa, e participava das investigações, em todo o Brasil e até no exterior, para elucidação do crime e trazer Carlinhos de volta.
Me prontifiquei a dar a entrevista sobre Carlinhos. Mas quando contei a Carlos Magno o que eu tinha acabado de fazer e mostrei a ele a cópia do telex para o presidente Figueiredo, Carlos Magno me perguntou se poderia usar o telefone. E telefonou para Alberto Dines, editor-chefe do JB.
Quando terminaram de conversar (não ouvi a conversa), ele me disse: “Dr. Béja, a matéria sobre o Carlinhos caiu. A matéria agora é esta mensagem que o senhor enviou para o presidente. Será a manchete de amanhã do JB”. Veio um fotógrafo do JB. Eu tive que voltar à Praça Mauá para ser fotografado saindo da agência da ECT, foto que ilustrou a matéria do JB do dia seguinte.
FOI A MANCHETE – No dia seguinte, no topo da primeira página, a notícia do meu apelo ao presidente Figueiredo. Foram decisivos, a mensagem-telex e a notícia. Isto porque, no mesmo dia da publicação da notícia no JB e no início da tarde, o diretor do Hospital da CSN me telefonou para avisar: “Sua tia vai colocar o marca-passo ainda hoje e amanhã cedo o senhor pode visitá-la aqui no hospital”. Agradeci. A cirurgia foi feita.
No dia seguinte fui para Volta Redonda. E encontrei Tia Maria muito bem tratada. Marca-passo colocado. Estava em quarto particular, com ar refrigerado, TV em cores e cama para acompanhante. Dias depois, teve alta e voltou para Quatis, então distrito de Barra Mansa e hoje município independente.
Quanto ao presidente, Figueiredo retornou de Cleveland curado. Foi quando aconteceu outra enorme surpreendente emoção. Um mês depois, sem avisar antes, estaciona um carro preto, placa oficial, na porta da humilde casa de Tia Maria em Quatis. E do carro salta um oficial do Exército acompanhado de “seguranças”.
ERA UM GENERAL – Fardado, o oficial pediu para entrar. E dentro da sala disse ele: “Senhora Madalena, eu sou o general comandante da Academia Militar das Agulhas Negras em Resende (perto de Quatis) e trago aqui uma lembrança que o presidente João Baptista Figueiredo nos enviou e pediu para eu entregar à senhora em mãos”.
O general abriu a pasta, tirou um grande envelope branco e entregou à minha tia. Ao abrir, era uma foto colorida do presidente, com esta dedicatória, de próprio punho, escrita sobre a foto:
“À Tia Maria de Quatis, um abraço do presidente do Brasil”. Mais abaixo a assinatura: “João Batista Figueiredo”.
NOME DA RUA – Tia Maria faleceu em 1987. Morreu solteira e sem filho Mas criou em recém-nascido que registrou e batizou com o nome de José Plácido. A criança cresceu, se tornou adulta, formou-se na universidade, casou e falecei deixando dois filhos, Ana Lydia e Marcus Plácido. A rua em que Maria Madalena nasceu, cresceu, sempre morou, recebeu o nome de Rua Maria Madalena Béja. E a foto do presidente até hoje está lá na parede na mesma casa em que sempre morou.
Para finalizar: e se tudo se repetisse hoje? Maria Madalena teria a mesma atenção e o mesmo carinho que teve do presidente Figueiredo?