De O Globo
Além da discussão pública entre o blogueiro Allan dos Santos e o presidente da Fundação Palmares, Sérgio Camargo, ocorrida no domingo com troca de xingamentos, a base do presidente Jair Bolsonaro tem apresentado outros sinais de racha nos últimos meses. A aliança de Bolsonaro com partidos do Centrão e o recuo após atos de tom golpista no 7 de Setembro têm sido alguns dos pontos de desgaste do presidente com parte dos seus eleitores.
A discussão entre Santos e Camargo se deu em torno de críticas ao governo feitas pelo ideólogo de direita Olavo de Carvalho, que disse que Bolsonaro o usou “para se promover e se eleger”.
Um dos ministros indicados por Olavo, o ex-chanceler Ernesto Araújo também tem feito críticas públicas ao governo federal. Em maio, pouco após ter sido demitido por pressão do Congresso, Araújo escreveu que o governo foi transformado em uma “administração tecnocrática sem alma nem ideal”. Mais recentemente, em novembro, o ex-ministro disse que “o governo virou a base do Centrão” e que parte dos integrantes da administração “nunca quis enfrentar o sistema”.
Outro crítico frequente da aliança com o Centrão é o também ex-ministro Abraham Weintraub, demitido após entrar em atrito com o Supremo Tribunal Federal (STF). Em julho, ele escreveu que não gostaria que Bolsonaro ficasse “totalmente nas garras” do bloco de partidos.
Weintraub tenta articular uma candidatura ao governo de São Paulo, mas enfrenta dificuldades porque Bolsonaro apoia o ministro da Infraestrutura, Tarcísio Gomes de Freitas. No mês passado, rebateu críticas ao seu nome: “Eu sou comunista e traidor? Mais que a tigrada fantasiada de direita? Eu, que sou paulista, não devo voltar mais para SP?”, questionou.
O ex-ministro foi um dos que saíram em defesa de Olavo de Carvalho após as críticas feitas pelo presidente da Fundação Palmares, chamando de “loucos” quem aponta o ideólogo como “traidor”.
Olavo também foi defendido pelo cientista político Silvio Grimaldo, ex-assessor especial do Ministério da Educação na gestão de Ricardo Vélez (outra indicação do escritor). Grimaldo classificou Camargo como “um sujeito que se gaba de censurar livros”, em referência à tentativa dele de retirar 300 livros do acervo da Fundação Palmares.
“Não chega a ser nenhuma surpresa que um sujeito que se gaba de censurar livros e de não precisar deles despreze um sujeito que vive de escrever livros e que causou uma revolução no mercado editorial”, disse o cientista político no Twitter.
Recuo desagradou
Outro episódio que gerou mal-estar entre a base bolsonarista foi a “declaração à nação”, publicada em setembro, em que o presidente recuava de críticas feitas ao ministro Alexandre de Moraes, do STF. O texto, que foi escrito com a ajuda do ex-presidente Michel Temer, desagradou a militância.
Alvo do inquérito que investigou atos antidemocráticos, o youtuber e professor Emerson Teixeira rompeu com Bolsonaro por considerar que o presidente não atuou para ajudar apoiadores que teriam sido “perseguidos”.
— Sofri tudo quanto é perseguição por ter apoiado o Bolsonaro. E o que Bolsonaro fez, para proteger essas pessoas como eu? Nada. Simplesmente nada. No dia 7 de setembro de 2021 a gente teve uma chance histórica de mudar isso, e o presidente não fez nada. Não fez nada para proteger as pessoas. Mesmo com milhões de brasileiros indo para as ruas e pedindo para ele agir, ele não agiu. Então, por que eu deveria continuar apoiando o Bolsonaro? Não vou apoiar mais — disse Teixeira, em um vídeo publicado no início de dezembro.
‘Oportunista’ e ‘infeliz’
No domingo, após Camargo ter ironizado o descontentamento de Olavo com Bolsonaro, Allan dos Santos classificou a mensagem de Camargo como “idiotice”.
“O Brasil pariu uma horda de analfabetos que se não estivessem na política, não seriam capazes de ensinar uma única e mísera coisa sequer. Vivem do salário que recebem do Estado e assim que dele sair não serão capazes de organizar um grêmio estudantil. Esse Sérgio Camargo é um deles. A idiotice que falou sobre o Prof. Olavo de Carvalho é a prova de que se não fosse o carguinho dele, ninguém nunca saberia quem é esse infeliz”, escreveu Allan dos Santos.
Em resposta, no seu perfil no Twitter, Camargo reproduziu a mensagem de Santos e chamou o blogueiro de “oportunista fracassado”. O presidente da Fundação Palmares afirmou ainda que o discurso de Santos seria um sinal de “inveja e interesse contrariado”, e voltou a minimizar o impacto de Olavo no ideário bolsonarista.