André de Souza e Renata Mariz
O Globo
A maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) votou nesta quinta-feira para manter a decisão da Segunda Turma da Corte que declarou o ex-juiz Sergio Moro parcial no julgamento do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na ação penal do tríplex do Guarujá (SP). Votaram assim: Gilmar Mendes, Nunes Marques, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Cármen Lúcia. Apenas dois ministros se posicionaram contra: Edson Fachin e Luís Roberto Barroso. Ainda faltam mais três votos.
A primeira decisão tomada de forma monocrática pelo ministro Edson Fachin, sobre a incompetência da 13ª Vara Federal de Curitiba para julgar Lula, estabeleceu a “perda de objeto” de outros processos apresentados pela defesa do ex-presidente, como a suspeição de Sergio Moro. Apesar disso, contrariando Fachin, a Segunda Turma do STF continuou o julgamento desse caso e declarou o ex-juiz parcial.
CONSEQUÊNCIAS – Embora as decisões de Moro no processo do tríplex já estejam anuladas de qualquer jeito, esse ponto ainda pendente de julgamento tem duas consequências práticas. Uma, mais imediata, é que a decisão de Fachin tirando os processos de Curitiba e mandando-os para Brasília não anulou todos os atos dos processos, sendo possível, por exemplo, ao novo juiz do caso, aproveitar as provas produzidas.
Já a decisão da Segunda Turma anulou tudo do processo do tríplex (embora não tenha tratado das outras ações penais de Lula), o que atrasaria ainda mais o seu andamento.
Ao apresentar seu voto, Fachin afirmou que, a partir da decisão de que a Vara Federal de Curitiba não tinha atribuição para julgar os casos envolvendo Lula, fica esvaziada a ação sobre suspeição de Sergio Moro:
INCOMPETÊNCIA — Entendo que, como efeito da definição da incompetência do juízo de primeiro grau, que acaba de ser decidida e acatada aqui, no Supremo Tribunal Federal, fica esvaziada a aferição da imparcialidade subjetiva do magistrado investido de jurisdição no juízo declarado incompetente.
Ele indicou ainda, citando julgamento de casos parecidos no próprio Supremo, que a decisão que tirou as ações de Lula da Vara de Curitiba ou mesmo a declaração de suspeição de Moro, não gera a nulidade dos atos já praticados no processo, como provas colhidas. Segundo Fachin, embora a nulidade dos atos seja uma possibilidade, as leis processuais falam dessa hipótese apenas quando houver prejuízo para a parte.
— Ou seja, o reconhecimento da incompetência do juízo ou da suspeição do magistrado não implica necessariamente na declaração de nulidade de todos os atos processuais praticados — destacou Fachin.
GILMAR RESPONDE – Sem citar Fachin, Gilmar alfinetou a tentativa de anular a decisão da Segunda Turma por meio do plenário.
”Acho que é bom e honesto lembrar que, em 2018, quando começou o julgamento [da suspeição de Moro na Segunda Turma], votei para que o habeas corpus fosse afetado ao plenário. E por três votos a dois a turma deliberou para manter na turma. Portanto, veja, isso foi deliberado. Essa história toda, “está trazendo para o plenário”, não fica bem. Não é decente. Não é decente, não é legal, como dizem os jovens. Esse tipo de manobra é um jogo de falsos espertos. Não é bom” — disse Gilmar.
O ministro avaliou que o julgamento da suspeição na Segunda Turma é mais amplo e não pode ser alterado pelo plenário.
— Julgada procedente a suspeição ficarão nulos os atos do processo principal, pagando o juiz as custas em caso de erro inescusável. Na doutrina, afirma-se que se a exceção for julgada procedente, todos os atos do processo, e não apenas os decisórios, serão nulos — disse Gilmar, acrescentando: — O plenário não pode tudo e não pode mudar a decisão da Segunda Turma.
APOIO Á 2ª TURMA – O ministro Nunes Marques discordou de Fachin e votou para manter a decisão que declarou Moro parcial nas ações de Lula. Em março, ele já tinha votado a favor da possibilidade de a Segunda Turma deliberar sobre essa questão, mas se posicionou no sentido de que o ex-juiz foi imparcial.
Agora, no plenário, ele manteve a posição de que a Segunda Turma pode sim julgar esse ponto. Assim, mesmo já tendo opinado no passado a favor de Moro, o efeito prático de seu voto foi reconhecer a vontade majoritária da Segunda Turma, que atendeu o pedido da defesa de Lula.
O ministro Luís Roberto Barroso votou com o relator, considerando que não cabIa mais ao Supremo se manifestar sobre a suspeição, sem entrar no mérito se ela ocorreu ou não. O ministro, porém, fez uma longa manifestação em defesa da Lava-Jato e contra a corrupção.
APOIO A MORO – Ao se referir a mensagens que vazaram, após hackers terem acesso aos telefones de procuradores da Lava-Jato, e que foram decisivas para derrotas de Moro na Corte, Barroso disse que não há evidências de fabricação de provas ou falsificações.
— Não vazou a existência de uma prova fabricada, falsificada, ou do propósito de se condenar alguém mesmo sem prova alguma. Vazou que juiz e membros do MP conversavam. Presidente, vossa excelência foi juiz e promotor do interior. Acontece diariamente em todas as comarcas do Brasil — disse Barroso, completando:
— Aliás, a prática de um juiz atender representante de uma das partes sem a presença da outra é altamente discutível, mas é uma tradição brasileira, que choca juízes de outros tribunais quando dizemos que aqui funciona assim, que um juiz pode receber representante do MP sem a presença do advogado, ou que pode receber advogado sem um representante do MP.
OUTROS VOTOS – Fux resolveu encerrar a sessão, mas o ministro Ricardo Lewandowski quis antecipar seu voto. Ele foi o quarto a se manifestar a favor de manter a decisão da Segunda Turma. Ele também destacou que votar contra Moro não significar ser favorável à corrupção.
O ministro Dias Toffoli também quis antecipar o voto, se posicionando para manter a decisão da Segunda Turma que declarou Moro suspeito. A mesma posição foi tomada por Cármem Lúcia e Alexandre de Moraes.