Por CLAUDEMIR GOMES – Entre os dias 2 e 3 de fevereiro existe uma noite. Nada mais óbvio e natural. Mas até a ordem natural das coisas sai do lugar comum, tal como ocorreu há 111 anos, quando um grupo de jovens, ungidos pelas águas abençoadas de Iemanjá, sonharam em fundar um clube de futebol. O sonho sonhado em noite de festa da Rainha do Mar foi transformado em realidade no dia 11 de fevereiro de 1914, com o nascimento do SANTA CRUZ FUTEBOL CLUBE.
Nasceu sem casa, numa calçada, num beco, por traz da Igreja de Santa Cruz. O novo clube era pobre, sequer tinha domicílio, como reza a lenda, mas aqueles jovens visionários lhes colocaram um sobrenome gigante: FUTEBOL CLUBE.
Bendito sobrenome!
E os nomes foram chegando: José, João, Carol, Fernando, Aloísio, Gustavo, Rodolfo, Aristófanes, Romero, Edson, Waldomiro, Adonias, Spock, Forró, Bartolomeu, Armindo, Leduar, Alexandro, Umberto, Paulo, Napoleão, Luciano, Armando, Capiba, Nando, Vanildo, Nivaldo, Pedro, César…
Nomes que se multiplicaram e traduzem uma paixão: SANTA CRUZ. Paixão expressa no choro, no riso, no frevo, no xaxado, no baião, no forró, no funk, no samba, em todos os ritmos. Afinal, o clube que nasceu numa calçada no bairro da Boa Vista, no Recife, traz consigo o cheiro do povo. Um povo que tem swing, que acorda sob os sons dos clarins e dorme ouvindo os batuques dos maracatus. Um povo que é amante da glória.
O Santa Cruz de todos os nomes se mudou para o Arruda, zona norte do Recife, bairro pobre, no pé do morro, onde lá de cima, de braços abertos, a imagem da Virgem da Conceição lhe protege sempre.
“Eu sou Santa Cruz de corpo e alma”, bradou o mestre Capiba num frevo que se eternizou, virou hino. Se transformou num grito de liberdade, pois quem é Santa Cruz é por inteiro. Eis a razão pela qual o clube nasceu numa calçada, sem paredes, sem amarras. Aprendeu a andar nas ruas de pedras irregulares, a superar obstáculos.
Caiu e se levantou; caiu e se levantou… Criou calo, musculatura, se agigantou alimentado pelo grito do povo.
O Santa Cruz não é clube!
É religião.
É mistério indecifrável de uma Noite de Iemanjá.
E já são 111 anos de louvação de todos os nomes.
Parabéns!