O voto e a democracia no caminho da volta de Lula à Presidência da República. Por Pedro do Coutto

Lula tem uma longa jornada marcada por episódios de impacto na política

Pedro do Coutto

Muito bom o filme de Julia Duailibi exibido na noite de quarta-feira na GloboNews sobre a fase em que Lula se encontrava preso no Paraná e os depoimentos de pessoas que o visitaram, quebrando a solidão do encarceramento e, sem dúvida, acrescentando um passo humano no retorno que se concretizou em outubro deste ano.

A vida de Lula nas urnas é uma longa jornada marcada por episódios de impacto como foi a sua classificação para o segundo turno da sucessão presidencial de 1989. O primeiro turno terminou apresentando 29 pontos para Fernando Collor, 16 para Lula e 15 para Leonel Brizola. Portanto, na decolagem do destino, um ponto incluiu Lula da Silva definitivamente na história do Brasil.

PLURALIDADE – Ele participou de nove eleições presidenciais, vencendo cinco e perdendo quatro. Na história universal, não há outro exemplo de uma pluralidade de tempo sobre o poder. Mas esse é outro ponto. O ponto fundamental focalizado por Julia Duailibi é mais abrangente do que o tempo em que esteve sem liberdade ao longo do governo de Michel Temer e também o de Jair Bolsonaro.

Eu disse que o voto e a democracia foram os argumentos fundamentais para o seu retorno e para a sua vitória. Não se deve esquecer para a identificação de um panorama da história brasileira que no governo Bolsonaro eram realizadas sucessivas concentrações na Esplanada de Brasília com manifestantes radicais propondo a intervenção do governo no Supremo Tribunal Federal e no Congresso do país.

Essa ameaça que inevitável e logicamente se concretizaria em uma eventual reeleição de Bolsonaro, na realidade levou o STF a anular a condenação de Lula reconhecendo por sete votos a quatro a parcialidade do juiz Sergio Moro e devolvendo a ele, Lula da Silva, o direito de liberdade e de concorrer às eleições de 2022.

ROMPIMENTO – O julgamento deixou o hoje senador Sergio Moro numa situação péssima, a partir do instante em que aceitou o Ministério da Justiça. Na pasta, rompeu com Bolsonaro, mas na campanha deste ano surpreendentemente se reaproximou.  O Supremo Tribunal Federal, no fundo, na minha opinião, agiu para preservar a democracia brasileira, preservando a si mesmo e também o Poder Legislativo.

A liberdade encontrava-se sob ameaça juntamente com o Estado de Direito e com o regime democrático. O documentário de Julia Duailibi é um registro importante de uma fase conturbada da política e da vida brasileira.

SOMBRAS EM BRASÍLIA –  Os fatos que se sucederam às urnas são profundamente marcantes, a começar por concentrações nas portas de quartéis, sobretudo no Quartel General de Brasília. Extremistas da direita incendiaram automóveis, ônibus e tentaram invadir a própria sede da Polícia Federal. O governo Bolsonaro ficou em silêncio com exceção de um tímido e genérico pronunciamento do ministro Anderson Torres da Justiça.

Ontem, uma exposição de cerca de uma hora através da GloboNews, e certamente publicada nas edições de hoje da Folha de S. Paulo, O Globo e do Estado de S. Paulo, relatou as providências estabelecidas para a posse de Lula novamente na Presidência da República. As providências incluem o reforço da segurança para que fanáticos não se ocultem nas sombras do Planalto e se voltem a atos alucinados contra a democracia.

AMEAÇA – Muito bom o artigo de Ruy Castro ontem na Folha de S. Paulo sobre uma atmosfera de ameaça acrescentada pela viagem do presidente Jair Bolsonaro para a cidade americana de Orlando, procurada intensamente por causa da Disney World. Bolsonaro fora do país, se de fato viajar, pode ser uma atitude de isentar-se de qualquer vinculação no episódio da entrega da faixa a seu sucessor assim não lhe transmitiria o poder e se distanciaria da responsabilidade.

Ontem também verificaram-se várias prisões de pessoas que participaram das manifestações antidemocráticas em Brasília, além de financiadores subversivos dos custos do acampamento. A história se escreve em capítulos que na realidade se desenrolam nas páginas dos principais jornais do país, e ficam para sempre registradas além das edições impressas, em documentários como o de Julia Duailibi, que é um marco no tempo.

MUDANÇA RADICAL – O deputado Luís Marinho na pasta do Trabalho e Carlos Lupi na Previdência Social, na minha opinião, representam sinais concretos de que a política social e trabalhista do governo Lula da Silva será absolutamente contrária à que foi imposta pelo ministro Paulo Guedes. Esta observação me parece suficiente para acentuar uma mudança radical nas relações entre o governo e o exercício dos legítimos direitos trabalhistas e previdenciários.

Numa longa entrevista a Miriam Leitão, O Globo desta quinta-feira, Fernando Haddad fala do combate ao anunciado déficit de R$ 220 bilhões previsto para o orçamento de 2023 e o combate a 2,5 milhões de fraudes já identificadas no Cadastro Único do Auxílio Brasil, que a partir de janeiro, voltará a ser Bolsa Família. Provavelmente, escreverei amanhã sobre a entrevista de Fernando Haddad a Miriam Leitão. O ano de 2022 se aproxima do fim, é tempo de alvorada.