Éramos três: Ariano, Maximiano e eu; às vezes, Arraes

Por Raimundo Carrero
Membro da Academia Pernambucana de Letras

Aos domingos, as conversas ou reuniões começavam cedo, quase sempre no terraço de Maximiano, falando de política e de literatura, sob o olhar vigilante de Ana e do menino Antônio, o Tonca, de calção e botas pretas, sem desviar um único gesto. Eduardo namorava com Renata no outro terraço, sob os cuidados de dona Lourdes e seu Fernando, pais de Maximiano.
E foi ali, naquele terraço senhorial, que conheci o primeiro exemplar da Pedra do Reino, o volumoso romance de Ariano que imediatamente me enfeitiçou, não me lembro de ter sentido emoção maior diante de um livro. Líamos algumas páginas e debatíamos, com o ainda jovem Maximiano Campos, já famoso com a publicação de Sem lei nem rei, discordando de questões políticas e enaltecendo os textos de Hemingway e Kazantzakis, em que via alguma semelhança.

Mais tarde escreveria artigo sobre os dois, na Revista Universitária, destacando o socialismo de Kazantzakis, chegando a ser ministro da ilha grega de Creta. Mas de Hemingway admirava a força física e o destemor para enfrentar as dores do mundo, mesmo recorrendo ao suicídio na decadência.

Depois do almoço, a conversa entrava pela tarde e no começo da noite eu voltava para casa, escutando, ainda, o debate muitas vezes acalorado. Era um sem fim de conversas que, para mim, serviram de aprendizado que guardei para sempre. Este sempre não demora muito porque estou entrando no último ciclo da vida. E que me serviria de univesidade.

Houve um tempo que as reuniões, tão ricas e tão belas, deram lugar ao meu trabalho na redação do Diario de Pernambuco, onde fiquei responsável pelas edições da segundas-feiras, fechadas, naturalmente, no domingo de futebol, praias e procissões, além de política – artigos, entrevistas e debates.

Uma tarde de sábado, quem entrou no terraço, acompanhado de dona Madalena, foi Miguel Arraes, disposto a uma boa conversa, no que era mestre. Falava sério sobre política, contava histórias dos amigos Gabriel Garcia Marquez, José Saramago e Manoel Alegre.

Mais tarde, essas reuniões se realizariam somente na casa de Ariano, sempre na Rua do Chacon, com a fildalguia de dona Zélia e a cumplicidade de Joaquim e Dantas, além das meninas que só passavam pela sala com os olhos curiosos, atentas. Um tempo para nunca esquecer, agora que estou sozinho, com as minhas querelas literárias.