‘Não há evidência de fraude’, diz Diego Aranha, defensor do voto impresso em urna eletrônica

Diego Aranha já testou duas vezes as urnas eletrônicas

Mariana Schreiber
BBC News Brasil

Referência na defesa do voto impresso no Brasil, o professor Diego Aranha, que atualmente leciona no Departamento de Computação da Universidade de Aarhus (Dinamarca), tem sido constantemente citado por apoiadores do presidente Jair Bolsonaro para sustentar que a mudança é urgente e necessária para conter supostas fraudes nas eleições.

Aranha, porém, não endossa os argumentos bolsonaristas e, inclusive, tem rebatido constantemente os apoiadores do presidente nas redes sociais.

RESPOSTA A BIA KICIS – Em um desses momentos, respondeu um comentário da deputada Bia Kicis (PSL-DF) de que deixou o país pela dificuldade de defender o voto impresso.

“A nobre deputada apoia o governo mais anticiência da história do Brasil, mas tem a cara de pau de compartilhar frustração de cientista que deixa o país, para fazer uso político de uma questão técnica”, criticou no Twitter.

Em entrevista à BBC News Brasil, Aranha reforça que não há evidências de fraudes nas urnas eletrônicas e diz que sua defesa do voto impresso é para dar mais transparência ao sistema eleitoral. A ideia é que o eleitor possa ver um registro físico do seu voto após votar na urna eletrônica, dentro de uma caixa de vidro fechada, ou seja, sem poder tocar nesse papel, antes de ele ser depositado em um recipiente sigiloso, lacrado. Depois, uma amostra estatisticamente relevante poderia ser conferida com o resultado eletrônico para auditar a votação.

MELHOR AUDITAGEM – Aranha ressalta, porém, que esse procedimento melhoraria a auditagem da etapa de votação na urna.

A fase de contabilização de votos, diz, já é perfeitamente auditável, o que desmonta os argumentos de Bolsonaro sobre suposta fraude na contabilização dos votos na eleição presidencial de 2014, quando Dilma Rousseff (PT) derrotou Aécio Neves (PSDB).

“Não faz sentido, primeiro, sugerir um mecanismo (de voto impresso) com discurso de fraude, porque isso contamina a origem do debate. E, em segundo lugar, sugerir o voto impresso como maneira de coibir fraudes na transmissão e na totalização, onde já existe um procedimento de auditoria que funciona. Então esses dois pontos comprometem o debate como ele vem sendo discutido hoje”, critica.

ALEGAÇÕES VAZIAS – Para o professor, a adoção do voto impresso é positiva como ferramenta para neutralizar rapidamente discursos de “alegações vazias de fraude” como o de Bolsonaro ou o adotado pelo ex-presidente americano Donald Trump, após perder a eleição para Joe Biden no ano passado.

Ele ressalta, porém, que jamais defendeu que todos os registros sejam contados um a um pelo Brasil, como propõem os bolsonaristas. Além disso, Aranha reforça que a implementação do voto impresso teria que ser gradual, começando com testes em poucas urnas, sendo impossível sua adoção segura para a eleição presidencial de 2022.

VULNERABILIDADES  – Quando era professor da Universidade de Brasília (UnB) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Aranha participou de testes de segurança das urnas eletrônicas promovidos pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em 2012 e 2017. Na ocasião, equipes coordenadas por ele identificaram vulnerabilidades no sistema, posteriormente corrigidas pela Corte.

Foi essa experiência que o tornou defensor do voto impresso, recurso que é usado em outros países com sistema eletrônico, como Índia e parte dos Estados Unidos. Já o TSE afirma que o sistema brasileiro tem inúmeras etapas de segurança e auditagem, que asseguram a integridade das eleições.

CRÍTICAS AO TSE – Além de criticar os bolsonaristas, Aranha também faz ressalvas à atuação da Corte Eleitoral, como a postura de negar as evidências técnicas de vulnerabilidade produzidas nos testes.

A proposta do voto impresso se tornou nas últimas semanas o epicentro de uma crise institucional, com Bolsonaro atacando ministros do TSE e do Supremo Tribunal Federal. Em reação, as duas Cortes abriram investigações contra ele, uma delas com potencial de barrar o presidente da eleição de 2022.

Nesta terça-feira (10/08), uma proposta de emenda à Constituição (PEC) deve ser votada na Câmara dos Deputados para tentar implementar o voto impresso no próximo pleito, mas a expectativa é que será rejeitada.