Diz o poeta: “O relógio é um deus cantando as horas de pedra e cal, prontas para o nada”.

  Moacyr Félix, um poeta irradiante

O editor, escritor e poeta carioca Moacyr Félix de Oliveira (1926-2005), no “Poema Quase Explicação”, mostra como as luzes noturnas podem desenhar o mundo que habitamos.

POEMA QUASE EXPLICAÇÃO
Moacyr Félix

Luzes cortaram mais uma vez a noite básica
e desenharam o mundo em que vivemos.

E as estrelas derramaram pedra e cal
e construíram em cada olhar muralhas
onde fonte magra pinga sol e lua
– e o relógio é um deus cantando as horas
horas de pedra e cal, prontas para o nada.

Simplificado como uma lágrima
cruzaste a tua ponte de meninos mortos:
não mais o refletido caminhar
de teus passos na noite iluminada,
mas o descer com os olhos a ladeira
e deixá-los no cárcere sem portas
onde os ratos e os anjos se devoram.

Impassível como um tronco de árvore, onde
os homens gravam a canivete o que calaram.