Passaporte da perda de liberdade. Por Antonio Magalhães

Por Antonio Magalhães*

A turma do “bem” não ia perder a chance de proteger os brasileiros nesta pandemia da Covid. Primeiro, execrou o tratamento precoce nos primeiros sintomas da doença e defendeu intransigentemente a eficácia das vacinas contra a doença, vetando a discussão pública dos efeitos colaterais do imunizante ou o acometimento da infecção em alguns já vacinados.

Agora, nesta segunda fase, a turma “bem” instituiu o chamado “passaporte de vacinação”. Um certificado que vai permitir que pessoas vacinadas ou que testaram negativo para Covid ou outras doenças infectocontagiosas circulem em espaços públicos ou privados onde há restrição de acesso.

O senador Carlos Portinho (PL-RJ), suplente sem votos que assumiu a vaga do titular morto por Covid, apresentou projeto de lei no Senado criando o tal certificado. Ele foi aprovado por 72 votos, sem nenhum sufrágio contrário. E foi enviado para a Câmara dos Deputados para discussão e votação. O requerimento de votação urgente do projeto, como queria a turma do “bem” não foi aprovado porque só 232 deputados votaram favoráveis e eram necessários 257.

Pelo número de votantes a favor percebe-se que com um empurrãozinho o projeto passa, estabelecendo mais um ponto de controle social, efeito colateral perverso da Covid. O argumento da turma “bem” é de que com o passaporte vai ser possível conciliar a adoção de medidas restritivas para conter a pandemia com a preservação dos direitos individuais e sociais. Acredite se quiser.

Esse pessoal ressalta que, com o passaporte, União, Estados, Distrito Federal e municípios terão informações adequadas para administrar e balancear as medidas restritivas de locomoção ou de acesso de pessoas a serviços ou locais, públicos ou privados, adotadas como forma de limitar a propagação do agente infectocontagioso causador de surto ou pandemia.

Segundo o relatório do Senado, o projeto é inspirado em proposta similar da Comissão Europeia, órgão executivo da União Europeia, que acolheu o Certificado Verde Digital (Digital Green Certificate) no âmbito do território europeu com o objetivo de unificar as regras já adotadas por diversos países e para conciliar o combate à pandemia com o direito à livre circulação dos cidadãos.

Um passaporte de vacinação, certificado verde ou qualquer nome que queiram dar, não fez a cabeça dos europeus, continente onde se concentra as maiores manifestações contra as medidas restritivas ou qualquer oficialização para os cidadãos circularem. O que foi dito no Senado no Brasil não passa de pura enrolação da turma do “bem”.

Na verdade, o que pode acontecer é o estabelecimento de uma cidadania especial para os vacinados. Mais uma oportunidade de segregar a sociedade. Uma forma indireta de obrigar a vacinação contra a Covid para aqueles que não podem injetar-se com o imunizante ou simplesmente não querem, confiam na sua imunidade.

Afinal a vacina é boa ou não é? Se é boa, por que manter as medidas restritivas em relação aos não vacinados? Até quando os brasileiros terão que manter o distanciamento social, em breve delimitado por um documento de “eficácia não comprovada”? Perguntas que a turma do “bem” só tem respostas vagas ou meras suposições.

O vírus chinês trouxe agregado o vírus do autoritarismo, do controle social indiscriminado, do fique em casa e se salve. No Estado de São Paulo, onde as medidas restritivas foram mais radicais, registrou-se o maior número de mortes por Covid no País. As autoridades não souberam agir corretamente, implementando lockdowns como se fosse a solução. Erraram e continuam errando quando criam mais camadas de controle social.

No Recife não foi diferente. Movimentando-se entre a instalação de hospitais de campanha de custos duvidosos e com olho na movimentação dos recifenses, o então prefeito do Recife, Geraldo Júlio – que almeja ser governador do Estado -, contratou uma empresa para monitorar 800 mil celulares de recifenses e indicar a movimentação dos cidadãos. Essa fase nunca foi superada, porque o “grampo” serviu de ferramenta eleitoral para eleger seu sucessor meses depois.

Com a chegada da vacina, criou-se a necessidade de um novo cadastro para tomar o imunizante. A prefeitura da Capital obrigou milhares de recifenses a oferecerem pela web seus dados pessoais, celular, email e endereço. Hoje a Prefeitura do Recife tem um farto banco de dados cibernéticos em sítios não revelados. Será que com a nova Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) o cidadão comum vai um dia ter acesso à sua ficha?

A turma do “bem” tem suas razões obscuras, que não são as nossas, dos cidadãos comuns. Por isso, devemos ficar atentos a essas iniciativas nas quais os falsos humanistas de variados campos políticos se apresentam como salvadores da pátria. Olho neles. A nossa liberdade individual corre risco. É isso.

*Jornalista

FONTE: BLOG DO MAGNO