Por Bernardo Mello Franco
O Supremo Tribunal Federal começa a julgar amanhã se os presidentes da Câmara e do Senado podem se reeleger. Em outros tempos, os ministros nem precisariam gastar seu latim com o assunto. A Constituição é clara: não podem.
A Carta proíbe expressamente a reeleição dos integrantes das Mesas do Congresso. De acordo com o artigo 57, é “vedada a recondução para o mesmo cargo na eleição imediatamente subsequente”. O Supremo já admitiu uma exceção quando há mudança de legislatura. Não será o caso em fevereiro de 2021.
O objetivo dos constituintes foi impedir que os presidentes da Câmara e do Senado se eternizassem no poder. Isso evitou que o Congresso virasse uma versão candanga da Assembleia Legislativa do Rio, cujos chefões são quase vitalícios. O mais notório deles, Jorge Picciani, foi eleito seis vezes para o cargo. Só largou o osso ao ser preso pela Polícia Federal.
Desde 1988, a Câmara e o Senado foram comandados por figuras como Ulysses Guimarães, José Sarney, Antônio Carlos Magalhães e Renan Calheiros. Alguns deles mandaram mais que o presidente da República, mas nenhum tentou burlar a Constituição para se perpetuar na cadeira.
Agora há uma manobra em curso para permitir a reeleição de Rodrigo Maia e Davi Alcolumbre. O Supremo já deu sinais de que pode lavar as mãos, declarando que a questão é interna corporis. Isso equivaleria a dizer que a Constituição não vale nada. O que conta são os arranjos de ocasião no Congresso.
“A reeleição na mesma legislatura é absolutamente inconstitucional. Se isso for permitido, qualquer um vai se sentir autorizado a descumprir a Constituição quando lhe interessar”, alerta o ex-deputado Miro Teixeira, que exerceu 11 mandatos na Câmara.
Os defensores do casuísmo dizem que Maia e Alcolumbre frearam a escalada autoritária de Jair Bolsonaro. Há controvérsias, mas nem isso justificaria a gambiarra da reeleição. Não se trata de julgar os atos da dupla, e sim de garantir o respeito às regras do jogo. Não se salva a democracia rasgando a Constituição