A culpa é de Rodrigo Maia, que transformou o Pacote Anticrime em Pacote a Favor do Crime

Carlos Newton

A escalafobética decisão monocrática tomada por Marco Aurélio de Mello para libertar o criminoso de altíssima periculosidade está sendo justificada pela alegação de que o ministro apenas cumpriu a lei. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, que incentivou a inclusão dessa teratológica norma no “Pacote Anticrime” do então ministro Sérgio Moro, que passou a ser “Pacote a Favor do Crime”, reforça a defesa do lunático Marco Aurélio Mello, dizendo que a culpa teria sido do Ministério Público, que deixou de requerer a prorrogação da prisão preventiva.

Essas  justificativas são capengas e têm sido reforçadas pelo apoio dos que defendem o garantismo – a cega obediência da letra fria da lei, algo que nem existe no Direito. Aliás, muito pelo contrário, antes de obedecer à lei, os magistrados são orientados a examinar a situação social e o bem comum.

NORMAS DO DIREITO – Qualquer estudante de faculdade sabe que, acima das leis, existem as diretrizes que regem a aplicação delas, e aqui no Brasil essa doutrina está consubstanciada na Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, de 4 de setembro de 1942.

Particularmente, tenho especial admiração por dois dispositivos: “Artigo 4º – Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito”; e “Artigo 5º – Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum”.

Bingo!!! Ao apresentar suas decisões, todos os magistrados estão obrigados a obedecer a essa doutrina, dentro do Princípio da Razoabilidade, que norteia toda a Ciência do Direito, pois o que não é razoável não pode gerar direito…

DEFINIÇÕES PRECISAS – Na verdade, a decisão de Marco Aurélio Mello é uma monstruosidade. A melhor definição, até agora, foi do site “O antagonista”:

“A soltura do traficante André do Rap pelo ministro Marco Aurélio do Mello equivale à leitura da lei por um robô que, investido do poder de magistrado, se atém à literalidade do texto, sem levar em conta o histórico do criminoso, a moldura da organização a que ele pertence e a sua capacidade de escafedecer-se, como obviamente ocorreu. Robô dos antigos, porque talvez um mais moderno, programado com algoritmos mais sofisticados, fosse capaz de processar todas as informações sobre o facínora e decidir pela manutenção da sua prisão preventiva”.

E como disse Miguel Reale Jr., ex-ministro da Justiça, à Folha, “Se (Marco Aurélio Mello) não olhou a capa (do processo), não dimensionou as consequências de sua decisão. Ele ficou preso à estrita letra da lei, sem avaliar o mérito efetivo e as consequências desse ato. O juiz tem que ver o conjunto. Acho que esse amor formalista à letra da lei, que desconhece a sociedade e desconhece a capa, leva a situações muito injustas.”

ALEGAÇÕES INÚTEIS – Além de não ter cumprido o art. 5º, pois não levou em conta a situação social e as exigências do bem comum, o ministro Marco Aurélio Mello infringiu as leis que impedem ao magistrado atuar em questões nas quais tem relações com os advogados, pois o habeas foi pedido pelo escritório de advocacia de um ex-assessor seu, assinado pela mulher, e Marco Aurélio Mello nem poderia ter atuado, pois a questão cabia à relatora Rosa Weber.

Com isso, o ministro do Supremo jogou fora o que ainda resta de sua dignidade, pois agora está sob suspeita de ter sido corrompido. Como diz outro ex-ministro, o jurista Walter Maierovitch: “O bom juiz percebe claramente quem é o traficante do tostão e quem é o traficante do bilhão”…

A LEI DE MAIA – Quanto à alegação de Rodrigo Maia de que a culpa é do Ministério Público, o presidente da Câmara está totalmente enganado. Aliás, a culpa é dele, que incentivou a deturpação do Pacote Anticrime e aprovou uma mudança legal que não pode ser obedecida.

No inquérito, a prisão preventiva pode ser pedida pelo Ministério Público, pelo delegado ou pela parte que se diz em risco. A Lei de Maia diz que a preventiva deve ser revista “pelo órgão emissor” a cada 90 dias.

Órgão emissor é o juiz, portanto,  a lei está errada, porque a necessitada de preventiva deve ser revista pelo condutor do inquérito, que é o delegado ou o Ministério Público. O juiz nada tem a ver com isso. Ou seja, uma lei para proteger corruptos e que não pode ser aplicada em criminosos de maior periculosidade, como é o caso de um facínora, já condenado duas vezes em segunda instância e chefão da maior organização criminosa do país.

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P.S.
 – É como no samba “Nega Maluca”, de Evaldo Rui e Fernando Lobo, em que não se sabia quem era o pai da criança que estava no colo da nega maluca, que hoje em dia teria de ser chamada de “afrodescendente com necessidades especiais”. (C.N.)