Como a doença de presidente afeta a eleição?

– ‘The Economist’

Trump disse que a pandemia estava no fim, mas sua contaminação agora manterá assunto em destaque

Doença torna impossível desviar a conversa da incompetência do governo Trump ao responder à pandemia.

Donald e Melania Trump tiveram diagnóstico positivo para o teste de infecção da covid-19 faltando quatro semanas para a eleição presidencial. Deve ser algo assustador para eles e sua família. E haverá certamente repercussões importantes na campanha presidencial. Jornalistas da área política têm especulado há meses quanto a uma surpresa em outubro. Agora ela se materializou.

Uma possibilidade a ser considerada é a de o presidente ficar bem. Algumas pessoas infectadas quase não apresentam sintomas, sentindo no máximo um mal-estar. Trump deve passar dez dias de quarentena, recebendo o atendimento de que necessita no hospital militar Walter Reed, em Bethesda, Maryland. Ressurge em meados de outubro e diz: ‘Viram só? Eu sempre disse que não era nada grave’.

Mesmo tal cenário benigno é ruim para o presidente do ponto de vista político. Se isso lhe render alguns votos a mais por compaixão, isso não deve resultar em uma grande alteração no quadro das intenções dos eleitores. Ele continua 7 pontos atrás de Joe Biden na média das pesquisas feitas pela Economist, algo que, de acordo com nossos cálculos, lhe daria uma chance em 10 de conseguir a reeleição.

Trump quer desviar a conversa da covid-19, da incompetência do seu governo ao responder à epidemia e do fardo que isso representou para a economia. O próprio adoecimento torna isso impossível nos próximos dez dias. Quando ele voltar da quarentena, pode não haver mais tempo suficiente para que recupere a diferença nas intenções de voto do eleitorado.

E enquanto ele se recupera, os americanos serão lembrados que Trump passou o ano inteiro fazendo pouco da gravidade do vírus, chegando a alegar que ele simplesmente desapareceria. No primeiro debate presidencial, realizado na noite de terça-feira, ele disse que usa máscara quando necessário e em seguida caçoou de Biden pela insistência em usá-la o tempo todo. “Não uso máscara como ele”, disse Trump. “Sempre que o vemos, ele está de máscara. Poderia estar falando a mais de 50 metros de mim e chegaria usando a maior máscara que já vi.” Posteriormente, ele alegou que o fim da pandemia estava próximo.

Faz tempo que a Casa Branca insiste que Trump não precisa usar máscara porque ele e as pessoas do seu círculo são testados constantemente. Pode ser verdade, mas, ao adotar esse comportamento, o presidente minou as campanhas que promovem o uso de máscaras em um momento em que seu diretor do Centro para o Controle e Prevenção de Doenças (CDC) insiste que os americanos poderiam desacelerar a disseminação do vírus se usassem máscaras – principalmente para proteger os demais.

Não é preciso ser um mestre das campanhas políticas para traçar uma linha reta entre as mensagens ambíguas do presidente e os 200 mil americanos mortos em decorrência da covid-19.

Há, é claro, um segundo cenário: Trump pode ficar gravemente doente, como ocorreu em abril com o primeiro-ministro britânico, Boris Johnson. O tratamento para aqueles que são hospitalizados por causa da covid-19 melhorou nos meses mais recentes. Isso explica em parte por que a proporção de fatalidades está em queda nos EUA – outra razão é o fato de mais testes serem realizados.

Por outro lado, Trump apresenta três dos fatores de risco conhecidos: sexo masculino, idade avançada (74 anos) e índice de massa corporal superior a 30 (o boletim médico do presidente feito em abril indica IMC de 30,5, de acordo com a calculadora dos Institutos Nacionais de Saúde). Tom Frieden, ex-diretor do CDC, publicou no Twitter: “Uma pessoa de 74 anos tem aproximadamente 3% de chance de morrer, 10%-15% de chance de desenvolver complicações graves. Isso aumenta para os homens e para os obesos.”

Muitas pessoas que já passaram dos 70 anos apresentam outras condições médicas que fazem o risco aumentar. Entretanto, o presidente poderá dispor do melhor atendimento médico do mundo.

Se Trump ficasse temporariamente incapacitado, o vice-presidente Mike Pence poderia assumir o cargo nos termos da 25.ª emenda constitucional, ratificada após o assassinato de John F. Kennedy. O porta-voz de Pence publicou no Twitter que o vice-presidente e sua mulher tiveram resultado negativo para o teste do vírus.

Mas a incerteza não acaba aí. Há um terceiro cenário que seria ainda mais surpreendente e realmente colocaria essa eleição de pernas para o ar, no sentido de mudar o resultado mais provável. Qualquer lista de possíveis cenários entre hoje e a data da eleição, 3 de novembro, deve incluir a possibilidade de Trump se recuperar e Biden adoecer antes da votação.

Jornalistas têm especulado há meses quanto a uma surpresa em outubro. Agora ela se materializou