Braço direito de Geraldo Júlio e outros dois secretários são condenados por gastança de dinheiro público em Camarote na Copa das Confederações. Ação foi do MPPE

Apesar de julgada no final de outubro de 2019, somente hoje a decisão foi divulgada pelo site do Ministério Público que informa, ainda, que os “réus já apresentaram recurso à decisão, que no momento encontra-se com o MPPE para a apresentação de contrarrazões, etapa inicial da tramitação em segunda instância.”

A ação tramitou perante a 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, sob o número 0027798-60.2015.8.17.0001 e foi ajuizada em 2015.

De acordo com o promotor de Justiça Eduardo Cajueiro, que atua na Promotoria de Defesa do Patrimônio Público da Capital, a sentença proferida pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco confirma o entendimento de que o gasto com a aquisição do camarote não se reverteu em nenhum benefício à população. Tampouco ficou comprovado o interesse público alegado pela administração municipal para efetuar o processo de inexigibilidade de licitação que autorizou a despesa.

“Comprovadamente, não há nos autos a justificativa necessária para que os imputados, a pretexto de fomentar o turismo, tenham destinado vultosa quantia para um evento privado. Não se consegue conceber que a compra de um camarote e 459 ingressos para a Copa da Confederações represente incentivo ao turismo”, destacou a magistrada Milena Flores Ferraz Cintra, no texto da decisão judicial.

Relembre o caso — Por meio do Processo de Inexigibilidade GABPE nº 001/2013, os três secretários do prefeito do Recife, Geraldo Julio, gastaram R$ 201.181,05 (duzentos e um mil, cento e oitenta e um reais e cinco centavos), com a  aquisição do Programa Oficial de Hospitalidade à empresa Match Hospitality Serviços Ltda., para assistir aos jogos da Copa das Confederações FIFA 2013, evento organizado pela Fedération Internacionale de Football Association – FIFA e que teve uma de suas sedes no Município de São Lourenço da Mata/PE. De acordo com o MPPE, a despesa pública efetuada pela municipalidade, no valor acima indicado, não teve qualquer afinidade com o interesse público, contribuindo, tão somente, para elevar os altíssimos lucros auferidos pela FIFA, com a realização do evento supramencionado, assim como privilegiar um grupo seleto de convidados, que não teriam particularidade com o “estreito núcleo e grupo estratégico, com vista ao fortalecimento da imagem da Cidade do Recife”.

Ainda segundo o Promotor Eduardo Cajueiro, a 2ª Promotoria de Justiça de São Lourenço da Mata/PE informou acerca das despesas efetuadas por diversos entes públicos, dentre estes, a Prefeitura da Cidade do Recife/PE, relativa à aquisição de 01 (um) camarote e 459 (quatrocentos e cinquenta e nove) ingressos para a Copa das Confederações 2013, com o objetivo de analisar se essa despesa pública apresentava alguma afinidade com o interesse público e, assim, com base no Ofício nº 170/2013, enviado pela Promotoria de Justiça de São Lourenço da Mata, o Ministério Público entendeu não haver justificativa legal a embasar a aquisição do camarote, tampouco dos ingressos, diante da inexistência de interesse público ou benefício à população.

Segundo o MPPE, João Guilherme de Godoy Ferraz, através do Ofício nº 006/2013 e na qualidade de Chefe de Gabinete de Projetos Especiais, encaminhou a Alexandre Rebelo Távora, Secretário de Planejamento e Gestão da Cidade do Recife, o Regulamento de Vendas de Pacotes de Hospitalidade para a Copa das Confederações 2013, oportunidade em que solicitou a adoção das providências cabíveis para a finalização da compra daquele pacote, cabendo a este último assinar a proposição que antecipou a aquisição do pacote de hospitalidade, submetendo, por adesão, o Município do Recife a todo e qualquer regramento estipulado pela organizadora do evento. Por sua vez, Rodrigo Mota de Farias, Chefe de Gabinete do Prefeito do Recife, foi quem assinou o Processo de Inexigibilidade GABPE nº 001/2013, cuja inexigibilidade foi ratificada pelo primeiro réu que havia deflagrado toda a aquisição. O MPPE entende que coube aos réus a responsabilidade pela condução e decisão proferida nos autos do processo de inexigibilidade de licitação n° 01/2013, que resultou na aquisição do Programa Oficial de Hospitalidade à empresa Match Hospitality Serviços Ltda, para assistir aos jogos da Copa das Confederações 2013, na Arena Pernambuco.

O promotor de Justiça Eduardo Cajueiro, durante a condução do inquérito civil, solicitou a relação nominal daqueles a que foram destinados os 459 ingressos, bem como a relação nominal dos convidados para o camarote adquirido pela PCR de acordo com o relatório do inquérito civil n° 009/2014. Ao se fazer a leitura dos convidados do camarote, foram identificadas autoridades locais e seus familiares.

“O desvio de finalidade identificado nas aquisições traz como consequência a ilegalidade e nulidade da despesa, que ficou distanciada do interesse público para tutelar interesse exclusivamente privado, sem qualquer benefício ou legado para a população”, diz a sentença.

Leia a íntegra da decisão:

Processo nº: 0027798-60.2015.8.17.0001 Ação Civil Pública Autor: Ministério Público do Estado de Pernambuco Réus: João Guilherme de Godoy Ferraz, Alexandre Rebelo Tavora e Rodrigo Mota de Farias SENTENÇA Vistos etc. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE PERNAMBUCO interpôs Ação Civil Pública contra João Guilherme de Godoy Ferraz, Alexandre Rebelo Távora e Rodrigo Mota de Farias, qualificados, requerendo, em síntese, seja reconhecida a nulidade de todo e qualquer ato administrativo decorrente do Processo de Inexigibilidade GABPE nº 001/2013, o que implicará no ressarcimento aos cofres públicos do valor de R$ 201.181,05 (duzentos e um mil, cento e oitenta e um reais e cinco centavos), destinados à aquisição do Programa Oficial de Hospitalidade à empresa Match Hospitality Serviços Ltda., para assistir aos jogos da Copa das Confederações FIFA 2013, evento organizado pela Fedération Internacionale de Football Association – FIFA e que teve uma de suas sedes no Município de São Lourenço da Mata/PE. Argumenta que a despesa pública efetuada pela municipalidade, no valor acima indicado, não teve qualquer afinidade com o interesse público, contribuindo, tão somente, para elevar os altíssimos lucros auferidos pela FIFA, com a realização do evento supramencionado, assim como privilegiar um grupo seleto de convidados, que não teriam particularidade com o “estreito núcleo e grupo estratégico, com vista ao fortalecimento da imagem da Cidade do Recife”. Descreve, também, que a 2ª Promotoria de Justiça de São Lourenço da Mata/PE informou acerca das despesas efetuadas por diversos entes públicos, dentre estes, a Prefeitura da Cidade do Recife/PE, relativa à aquisição de 01 (um) camarote e 459 (quatrocentos e cinquenta e nove) ingressos para a Copa das Confederações 2013, com o objetivo de analisar se essa despesa pública apresentava alguma afinidade com o interesse público e, assim, com base no Ofício nº 170/2013, enviado por dita Promotoria de Justiça, o Ministério Público entendeu não haver justificativa legal a embasar a aquisição do camarote, tampouco dos ingressos, diante da inexistência de interesse público ou benefício à população. Com referência à conduta dos imputados, argumenta que o primeiro réu, João Guilherme de Godoy Ferraz, através do Ofício nº 006/2013 e na qualidade de Chefe de Gabinete de Projetos Especiais, encaminhou ao segundo imputado, Alexandre Rebelo Távora, Secretário de Planejamento e Gestão da Cidade do Recife, o Regulamento de Vendas de Pacotes de Hospitalidade para a Copa das Confederações 2013, oportunidade em que solicitou a adoção das providências cabíveis para a finalização da compra daquele pacote, cabendo a este último assinar a proposição que antecipou a aquisição do pacote de hospitalidade, submetendo, por adesão, o Município do Recife a todo e qualquer regramento estipulado pela organizadora do evento. Por fim, com relação ao terceiro demandado, Rodrigo Mota de Farias, Chefe de Gabinete do Prefeito do Recife, foi quem assinou o Processo de Inexigibilidade GABPE nº 001/2013, cuja inexigibilidade foi ratificada pelo primeiro réu que havia deflagrado toda a aquisição. Assim, pugna pela condenação solidária dos imputados, ao ressarcimento aos cofres do Município do Recife, do valor de R$ 201.181,05 (duzentos e um mil, cento e oitenta e um reais e cinco centavos), devidamente atualizado, arcando, ainda, com os ônus da sucumbência. Juntou extensa documentação (fls. 21/258). Determinada a notificação dos requeridos para fins de manifestação preliminar à fl. 260, tendo os mesmos se manifestado às fls. 273/282, com juntada dos documentos de fls. 283/540. Manifestação do MP à fl. 268, requerendo que o juízo de origem chamasse o feito a ordem para tornar sem efeito o despacho de fl. 260, posto tratar os autos de Ação Civil Pública nos termos da Lei nº 7.347/85, não se aplicando, pois, as diretrizes constantes da Lei nº 8.429/92 (Improbidade Administrativa). Despacho de fl. 543, acatando a manifestação ministerial de fl. 268 e determinando, por conseguinte, a citação dos imputados e intimação do Município do Recife. Citados, os réus apresentaram contestação às fls. 557/568. Em preliminar, alegam a ausência de legitimidade do MP para promover ação civil pública, com o intuito de pleitear ressarcimento de eventuais danos ao Município. No mérito, em síntese, afirmam que a contratação do programa oficial de hospitalidade consubstanciado na aquisição de espaço para a Copa das Confederações 2013 foi um ato de interesse público, com o fim de aproximar o Prefeito e outros agentes públicos a potenciais investidores locais e estrangeiros, com interesse no desenvolvimento e fortalecimento do turismo. Argumentam que o controle judicial dos atos administrativos está circunscrito à análise dos aspectos formais e legais desses atos, sendo-lhe defeso imiscuir-se no mérito e que o preço contratado encontra-se amplamente justificado ante a tabela de preços oficiais para comercialização dos ingressos, sem qualquer possibilidade de aquisição por preço inferior e que foi realizado todo o procedimento para despendimento da despesa com a emissão do Termo de Inexigibilidade de Licitação nº 002/2013 e o valor gasto foi devidamente incluído na dotação orçamentária do Município do Recife, não tendo os demandados incorrido em qualquer ato que implicasse em ilegalidade, desvio de conduta ou obtenção de ganho pessoal. Pugnam pela improcedência. Manifestação do MP acerca da contestação às fls. 563/575. Vieram os autos conclusos a esta Central de Agilização Processual. Relatados. Decido. De início, cumpre analisar a questão preliminar aventada pelos demandados em sede de contestação. In casu, diferentemente do que querem fazer crer os imputados, é patente a legitimidade do Ministério Público para Ação Civil Pública intentada para a defesa do patrimônio público, ainda que o crédito seja revertido em favor dos cofres públicos municipais, haja vista sua função de protegê-lo, nos termos do artigo 129, III da CF/88, que prevê: “Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: … III – promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”. Nesse sentido, colaciono o seguinte entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça de Minas Gerais: ‘EXECUÇÃO DE SENTENÇA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. LEGITIMIDADE ATIVA DO MP. ART. 15 DA LEI FEDERAL N. 7.347/1985. É ‘a ação civil pública via adequada para pleitear o ressarcimento de danos ao erário municipal e tem o Ministério Público legitimidade para propô-la. Recurso provido.’ (STJ, 1. Turma, REsp 180712/MG, rel. Ministro Garcia Vieira, julgado em 16/03/1999, DJU 03/05/1999). Destacada a competência para o ajuizamento da ACP pelo Ministério Público, afirma-se que o Órgão Ministerial também tem competência para ajuizar a execução do título judicial decorrente da ACP. Tal circunstância decorre, ab initio, do disposto pelo art. 566, inc. II, do Código de Processo Civil c/c art. 15 da Lei Federal n. 7.347/1985.’ (Apelação Cível nº 1.0390.05.010589-4/001, Relatora Desª. Maria Elza) No caso vertente, não há que se falar, pois, em ilegitimidade do Ministério Público, razão pela qual, rechaço a preliminar. No mérito, gravita a discussão a respeito da legalidade das condutas dos imputados praticadas nos autos do Processo de Inexigibilidade GABPE nº 001/2013, destinados à aquisição do Programa Oficial de Hospitalidade à empresa Match Hospitality Serviços Ltda., para assistir aos jogos da Copa das Confederações FIFA 2013, evento organizado pela Fedération Internacionale de Football Association – FIFA e que teve uma de suas sedes no Município de São Lourenço da Mata/PE, o qual resultou em uma despesa para os cofres públicos municipais no valor de R$ 201.181,05 (duzentos e um mil, cento e oitenta e um reais e cinco centavos). Da análise dos autos, mormente dos argumentos esposados por ambas as partes, autor e réus, tem-se que o serviço contratado, não guarda qualquer relação com o interesse coletivo de forma a justificar gastos tão vultosos. É de conhecimento público e notório a precariedade de serviços básicos e a necessidade urgente da realização de obras, em um Município com tantos problemas que afetam diretamente a qualidade da vida da sua população e, por este motivo, nada justifica gastar centenas de milhares de reais em um evento privado que não trouxe qualquer benefício social. Razão assiste ao MP ao asseverar que “A hipótese é completamente diversa dos gastos com mobilidade urbana, portos e aeroportos. Nestes, ainda que os investimentos e projetos tenham sido idealizados, incentivados e otimizados em virtude da realização dos EVENTOS FIFA no país existem inegáveis investimentos em infraestrutura e legado para a população, uma vez que concluídas as obras poderá o povo contar com a prestação de um serviço público melhor estruturado. Contudo, não é o que se verifica em relação ao custo na aquisição do ‘Camarote da Prefeitura do Cidade do Recife. O fato de a Copa das Confederações FIFA 2013 ter sido um evento reconhecidamente de enorme importância mundial, de maneira alguma justifica a ausência de responsabilidade pela malfadada aquisição. Acolher a explicação posta na justificativa para a inexigibilidade da ‘oportunidade de fomentar o turismo para a região, de maneira global, visando um incremento na economia local’, seria desconsiderar a assertiva de que qualquer gasto público, para encontrar amparo no ordenamento pátrio, deve ser direcionado para obras/serviços que proporcionem retorno concreto para a população. Repita-se: retorno concreto para a população'”. (fls. 570/571). A finalidade consiste em pressuposto do ato administrativo concernente à inafastabilidade do objetivo ligado ao interesse público. Como aponta Hely Lopes Meirelles, a finalidade é um elemento vinculado de todo ato administrativo, mesmo que este seja discricionário. A clássica concepção do pressuposto da finalidade afirma que o administrador não pode escolher fim público diferente daquele que a norma administrativa prevê. Assim, comprovadamente, não há nos autos a justificativa necessária para que os imputados, a pretexto de fomentar o turismo, tenham destinado vultosa quantia para um evento privado. A escolha da administração pública, através dos imputados, em investir em evento privado, mostra-se completamente divorciada dos princípios norteadores da administração, em especial a moralidade e eficiência sob a ótica dos direitos fundamentais, in casu, a política pública de real favorecimento dos serviços essenciais à população. Outrossim, não são raros os precedentes do Supremo Tribunal Federal que autorizam o Judiciário a fazer o controle das políticas públicas – ou seja, das escolhas discricionárias do administrador. No caso dos autos, por muito esforço que se faça, não se consegue conceber que a compra de 01 (um) camarote e 459 (quatrocentos e cinquenta e nove) ingressos para a Copa das Confederações 2013 represente incentivo ao turismo, ao contrário, evidencia a garantia do investidor privado de lucro subsidiado pelos cofres públicos, afirmou. Nesse aspecto, portanto, mostra-se nulo o ato administrativo, por desvio da finalidade pública, merecendo procedência o pedido autoral. Nulos os contratos, os contratantes devem restituir ao erário público os valores despendidos, merecendo procedência a pretensão condenatória de forma solidária. Posto Isso, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado pelo Autor nesta Ação Civil Pública, condenando os Réus João Guilherme de Godoy Ferraz, Alexandre Rebelo Tavora e Rodrigo Mota de Farias a ressarcir o dano aos Cofres Públicos do Município do Recife/PE, com o pagamento da quantia de R$ 201.181,05 (duzentos e um mil, cento e oitenta e um reais e cinco centavos), com correção monetária desde o desde o pagamento e juros de 0,5% ao mês. Condeno a parte Ré no pagamento das custas processuais. Deixo de condenar os réus Ré no pagamento de honorários advocatícios em razão do Ministério Público ser o Autor da ACP. Ciência ao Ministério Público. P.R.I. Recife, 29 de outubro de 2019. Milena Flores Ferraz Cintra Juíza de Direito PODER JUDICIÁRIO DE PERNAMBUCO CENTRAL DE AGILIZAÇÃO PROCESSUAL DA CAPITAL FÓRUM

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