EUA aceitam representante do governo respaldado pela Assembleia Nacional no seu território; ONG também denuncia tortura a presos políticos por forças de segurança
Após participar de uma missa no município de Chacao, na zona metropolitana de Caracas, Guaidó pediu aos policiais e membros da Força Armada Nacional Bolivariana (FANB) que “não reprimam o povo”.
O Observatório Venezuelano de Conflitos Sociais indica que em menos de uma semana foram assassinadas 29 pessoas (alguns falam em mais de 30) e, segundo a Foro Penal, foram registradas ao menos 500 detenções, entre elas as de muitos menores.
— Soldado venezuelano, estou falando para você, este é o momento. Não reprima o povo — declarou o presidente da AN, reconhecido como presidente interino por 18 países, incluindo Brasil e, desde este domingo, Israel.
A Foro Penal também denunciou torturas de presos políticos pelo Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin). Para esta semana, estão previstas novas marchas em Caracas para quarta-feira e sábado, convocadas pelo presidente da AN.
Guaidó mostrou-se preocupado com a repressão e anunciou que convocará uma reunião de urgência com ONGs e defensores dos direitos humanos. O presidente do Parlamento também pediu à Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, a ex-presidente do Chile Michelle Bachelet, que “acelere sua visita ao país”.
“Vamos listar os nomes dos responsáveis da Força de Ações Especiais (Faes), promotores e juízes que estejam envolvidos nos massacres que começaram a partir do dia 22 de janeiro, e solicitar sanções imediatas à Justiça e à comunidade internacional”, escreveu Guaidó em uma rede social.
Clima político na igreja
Neste domingo, sua presença na igreja de Chacao foi uma surpresa, até mesmo para o padre da paróquia, Reinaldo Gamez . A igreja estava lotada, e o que mais assustou o padre, segundo contou ao GLOBO, foi a quantidade de jornalistas, locais e estrangeiros. Sem hesitar, o padre encerrou a missa saudando “o presidente interino da Venezuela”, provocando uma onda de aplausos e gritos de “liberdade”.
— Disse o que tinha de dizer, ele é constitucionalmente nosso presidente interino — enfatizou o padre.
Assim vive a Venezuela. Com, de um lado, Maduro, um presidente no Palácio de Miraflores que é considerado usurpador por seus opositores e cujo segundo mandato é classificado como ilegítimo por mais de 40 países; e, de outro lado, Guaidó, que nas ruas, bairros, igrejas e outros espaços de Caracas despertou entusiasmo entre críticos do governo, até mesmo chavistas, além de ter sido reconhecido como presidente interino por 19 países. Neste domingo, Austrália e Isrel anunciaram seu reconhecimento a Guaidó, se juntando a outros 16 países das Américas, incluindo Brasil e EUA e à Albânia.
Para os próximos dias é esperado o reconhecimento, como bloco, da União Europeia (UE), já que Maduro deixou claro que nao aceita qualquer tipo de ultimato para convocar novas eleições presidenciais. A exigência fora feita pela UE na sexta passada e imediatamente rechaçada pelo Palácio de Miraflores.
Oposição próxima dos EUA
Em sua conta na rede social Twitter, o senador americano Marco Rubio, importante aliado da oposicao venezuelana, comunicou que “o governo americano entregou o controle das contas bancárias do governo venezuelano e do Banco Central da Venezuela (nos EUA) ao governo legítimo do presidente interino (Juan Guaidó)”. Eram esperadas novas ações da Casa Branca para ampliar o cerco financiero ao governo Maduro, já que essa é uma das principais táticas do governo Trump para redobrar as pressões ao chavismo.
O governo dos Estados Unidos anunciou ainda que aceitou a designação de Carlos Vecchio como representante diplomático do “governo interino” de Juan Guaidó. A informação de que Vecchio seria o escolhido, antecipada no ultimo sábado pelo Globo, era esperada com grande expectativa pela oposição, já que os Estados Unidos têm um papel central na ofensiva contra o governo do presidente Nicolás Maduro.
Em comunicado oficial, o Departamento de Estado informou que Vecchio, exilado há quatro anos nos EUA, terá “autoridade sobre assuntos diplomáticos da Venezuela” em território americano.
Brasil e Colômbia são essenciais para que Guaidó possa implementar a abertura de um canal humanitário, medida que busca, além de aliviar o drama social que vivem milhões de venezuelanos, conseguir a adesão de setores militares ao “governo interino”.
Chave é apoio militar
A cada dia que passa, as perguntas se multiplicam, e nem mesmo os analistas mais renomados se atrevem a dizer quem vai ganhar a disputa política, tratada no último sábado no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Para Luis Vicente León, diretor da Datanalisis, a oposição nunca chegou tão longe, mas o chavismo ainda pode garantir sua sobrevivência. Ele frisa que o “governo encarregado” precisa “romper o chavismo definitivamente e, principalmente, dentro das Forças Armadas”:
— Maduro pode sobreviver com o bloqueio americano, vendendo menos petróleo e com setores populares desmobilizados, como estamos vendo. Mas não dura um dia sem apoio militar.
Guaidó está ciente disso, e neste domingo seus deputados e apoiadores trabalharam na divulgação de um projeto de lei de anistia para civis e militares. O texto foi entregue em quartéis policiais e militares. Com bandeiras venezuelanas, grupos de opositores entregaram cópias da lei à frente do Forte Tiuna, principal complexo militar venezuelano.
Para León, a jogada é inteligente, mas ainda é preciso negociar cara a cara com os militares — o que é dificilíssimo, pela blindagem imposta pelo chavismo e a inteligência cubana — e oferecer garantias contundentes.
— O risco de que ONGs de defesa dos direitos humanos questionem essa anistia existe. E os militares ainda não se sentem seguros — diz León.
Com informações da AFP