LITERATURA

Geografia íntima do deserto – Micheliny Verunschk

I – O corpo amoroso do deserto

Teu corpo

branco e morno

(que eu deveria dizer sereno)

é para mim suave e doloroso

como as areias cortantes

dos desertos.

Que importa

que ignores minha sede

se tua miragem

é água cristalina?

E a miragem

eu firo com mil línguas

e cada uma

é um pássaro a bebê-la.

Ferroam minha pele

escorpiões de sol

com seu veneno

e vejo,

magoada de desejo

os grãos tão leves

indo embora ao vento.

II – A presença dolorosa do deserto

Teu nome

é meu deserto

e posso senti-lo

incrustado

no meu próprio

território

como uma pérola

ou um gesto no vazio

como o amargo azul

e tudo quanto

há de ilusório.

Teu nome

é meu deserto

e ele é tão vasto,

seus dentes tão agudos,

seus sóis raivosos

e suas letras

(setas de ouro e prata

dos meus lábios)

são meu terço

de mistérios dolorosos.

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