Queda acentuada ativou o circuit breaker, mecanismo utilizado pela Bovespa que permite, na ocorrência de movimentos bruscos de mercado, interrupção do pregão por meia hora
Os negócios na Bovespa foram suspensos após queda de 10% do índice à vista, quando o indicador marcava 60.470 pontos, em reação à nova crise política envolvendo o presidente Michel Temer e o senador e presidente do PSDB, Aécio Neves, que já foi afastado do cargo de senador pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
A queda acentuada ativou o circuit breaker, mecanismo utilizado pela Bovespa que permite, na ocorrência de movimentos bruscos de mercado, o amortecimento e o rebalanceamento das ordens de compra e de venda. Esse instrumento constitui-se em uma “proteção” à volatilidade excessiva em momentos atípicos de mercado. A ação ON da JBS declinava que 14,74%, a R$ 8,10, antes de o mecanismo de circuit breaker ser acionado.
Até hoje, o mecanismo foi acionado em 16 ocasiões e a paralisação de hoje é a 17ª. Em 1997, em meio a crise da Ásia, os negócios foram interrompidos em 7 e 12 de novembro. Um ano depois, 1998, na crise da Rússia, foram cinco interrupção das operações por baixa de 10%, sendo que no dia 10 de setembro o mecanismo foi acionado duas vezes. Outras três paralisações do pregão foram em 21 de agosto e 4 e 17 de setembro. Depois, novas interrupções ocorreram na crise cambial brasileira, em 1999, quando em 13 e 14 de janeiro o circuit breaker voltou a ser acionado.
Depois de 1999, o mecanismo só voltou a ser acionado em 2008, período marcado pela crise do sistema financeiro que se instalou nos Estados Unidos após o pedido de concordata do banco Lehman Brothers. Naquele ano, o pregão da Bovespa foi interrompido seis vezes, sendo a primeira em 29 de setembro e as outras cinco em outubro, no dia 6 (parou duas vezes), depois nos dias 19, 15 e 22.
Segundo as regras do circuit breaker, quando o Ibovespa atingir limite de baixa de 10% em relação ao índice de fechamento do dia anterior, os negócios na Bovespa, em todos os mercados, serão interrompidos por trinta minutos.
Reabertos os negócios, caso a variação do Ibovespa atinja uma oscilação negativa de 15% em relação ao índice de fechamento do dia anterior, os negócios são interrompidos por uma hora.
O mecanismo não é ativado na última meia hora do pregão. Ocorrendo a interrupção dos negócios na penúltima meia hora de negociação, na reabertura das transações, o horário será prorrogado em, no máximo, mais 30 minutos, sem qualquer outra interrupção, de tal forma que se garanta um período final de negociação de 30 minutos corridos.
O JP Morgan cortou a recomendação para as ações brasileiras para neutra, dizendo que as reformas no país podem estar em risco após as denúncias envolvendo o presidente Michel Temer em um escândalo de corrupção. A Moody’s, por sua vez, disse que o impacto da atual crise reverte a expectativa para o PIB, que ao invés de crescer 2% deve ubir 1% em 2018.
Dólar. Os mercados de câmbio doméstico voltaram pouco depois das 11h, após ficar paralisado depois que o dólar atingiu os novos limites de alta para o dia, de 9% na sequência do primeiro leilão de swap cambial, cuja oferta foi vendida parcialmente pelo Banco Central mais cedo. A autoridade monetária está fazendo um segundo leilão de swap no mercado futuro, das 11h30 às 11h40, com oferta de mais 15.325 contratos, ou cerca de US$ 766,2 milhões.
O economista da Guide Investimentos, Ignácio Crespo, disse que o BC tenta dar liquidez ao mercado, mas a pressão de alta persiste. Tá longe de o BC domar o dólar, deve continuar tentando conter a volatilidade”, afirmou.
A B3 estabeleceu novos limites de oscilações, de 6% para 9% no caso do dólar futuro. “O cenário é de paralisia do dólar. Mudou tudo de forma drástica, muda perspectiva completamente, o horizonte de melhora se paralisa, o dia é para tentar diminuir exposição a risco e reprecificar o cenário”, afirma Crespo.
Após o dólar futuro para junho ter começado a sessão com alta de 5,63%, aos R$ 3,3235, o mercado futuro parou as negociações. O mercado à vista, o dólar também abriu no limite de alta e se mantém no mesmo patamar, aos R$ 3,3137 (+5,73%). “O mercado futuro está no limite de alta e só pode operar dólar junho na compra a R$ 3,3235”, disse um gerente de mesa de derivativos de uma gestora de recursos.
Para tentar conter a escalada do dólar, o Banco Central anunciou que fará um leilão extra de dólar, em uma operação chamada de swap cambial tradicional. A instuição colacará para venda um total de 40.000 contratos (US$ 2 bilhões). Esta é a primeira operação do dia com foco na estabilização do mercado de câmbio.
Além desta operação das 10h30, o BC fará leilão de até 8.000 contratos de swap às 11h30 – neste caso, para rolagem dos vencimentos de junho.
No leilão de abertura, a ações da Petrobrás chegaram a cair quase 50%. Segundo analistas, no entanto, a tendência é de ajuste no decorrer do pregão.
No pré-mercado em Nova York, a maior carteira de fundos do Brasil caía mais de 13% nesta manhã e os American Depositary Receipts (ADRs) de empresas brasileiras também operavam em forte baixa, com os papéis da Petrobras em queda de 14,6%, os do Itaú Unibanco caíam 12,4% e os da Vale recuavam 8,9% um pouco mais cedo. No Japão, o mais popular fundo de índice de ações do Brasil, o Next Funds Ibovespa Linked ETF, fechou em queda de 7,54%.
A forte queda de ativos brasileiros negociados no exterior já dá uma ideia da tormenta que guiará os mercados após o executivo Joesley Batista, do Grupo JBS, ter revelado ontem à noite conversas gravadas em que o presidente Michel Temer dá aval para a compra do silêncio do deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), segundo informação do jornal O Globo confirmada pelo Estado. “Tem que manter isso, viu?”, disse Temer sobre mesada milionária a Cunha.
Para Zeina Latif, economista-chefe da XP Investimentos, a expectativa é de uma destruição muito grande de riquezas nos próximos dias, e há um grande risco de investidores estrangeiros deixarem o País para não voltar tão cedo. “O mercado vinha apostando numa melhora de cenário aliada à expectativa de que a reforma da Previdência seria aprovada, mas agora não há mais espaço para isso”, disse. “Tudo o que conseguimos nesse um ano de governo Temer está sendo perdido.”
Segundo Sérgio Vale, economista-chefe da MB Associados, o que mais se lamenta é que as reformas vão ficar paradas. “Vamos pagar o preço pela irresponsabilidade do presidente Temer”, disse. Na avaliação de Vale, se não tiver uma solução rápida para essa crise, “o País será jogado novamente para o caos”.
Para o estrategista-chefe da Upside Investor, Renan Sujii, a reação dos mercados financeiros hoje deve ser bastante forte, não podendo ser descartada a possibilidade de intervenção do Banco Central no câmbio e o acionamento do “circuit breaker” no mercado de ações – ferramenta usada para interromper as negociações quando os papéis têm volatilidade muito forte. “Temos um divisor de águas agora, com o agravante de não sabermos o que vem pela frente”, disse.
Reformas. Na avaliação do economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito, a nova crise política gera um forte grau de incerteza no mercado e, com isso, a aprovação das reformas econômica, como a da Previdência, está comprometida, em qualquer cenário. Segundo ele, mesmo que Temer deixe o cargo, o próximo presidente não deve ter forças para aprovar a matéria no Congresso. “Esquece a Previdência”, diz.
Para Perfeito, a crise no Planalto deve levar o mercado a rever as projeções para as principais variáveis macroeconômicas. “Já esperávamos taxa de câmbio a R$ 3,60 no fim do ano. Possivelmente o que está com uma estimativa menor, tende a alterar. Mas revisamos a projeção para o corte da Selic este mês, de um ponto para queda de 0,75 ponto. Já é um corte significativo”, afirma. Atualmente a taxa de juros está em 11,25% ao ano.
Delação. Em delação premiada a procuradores da Lava Jato, Joesley diz ter gravado conversa com Temer na noite de 7 de março durante reunião de cerca de 40 minutos no Palácio do Jaburu. O executivo entregou também o senador Aécio Neves (PSDB-MG), presidente nacional do partido, com gravação em que o senador pede a quantia de R$ 2 milhões sob o argumento de que precisava de dinheiro para a defesa na Operação Lava Jato. Joesley quis saber quem pegaria as malas com dinheiro e a resposta de Aécio teria sido: “Tem que ser um que a gente mata ele antes de fazer delação”.
Nesta manhã o senador tucano é alvo nesta manhã de operação da Polícia Federal, que cumpre mandados nos imóveis de Aécio no Rio e Belo Horizonte e no gabinete Zezé Perrella no Senado. O Supremo Tribunal Federal (STF) autorizou a prisão preventiva de Andrea Neves, irmã de Aécio, que teria pedido dinheiro em nome do irmão para Joesley Batista. Conforme apurou o Estado, Andrea não foi localizada.
A PF acionará a Interpol, pois tem a informação de que a irmã de Aécio estaria em Londres. O STF também determinou o afastamento do senador Aécio Neves (PSDB-MG) do mandato de senador e do deputado Rocha Loures (PMDB-PR) do mandato de deputado federal. A oposição no Senado se reuniu logo após a notícia do suposto áudio e montou um plano de ação que consiste em um pedido de impeachment, na pressão pela renúncia do presidente e pela paralisação da análise das reformas do governo no Congresso Nacional.
A oposição vai se mobilizar na manhã desta quinta-feira na Comissão de Constituição de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara para colocar em votação a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que permite as eleições diretas. O PSDB, partido mais fiel e aliado do governo Temer, já admite que a permanência do presidente fica “insustentável”. Interlocutores de integrantes da Corte Eleitoral ouvidos pelo Broadcast avaliam que as novas revelações podem complicar a situação de Temer no Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
O Palácio do Planalto divulgou nota oficial ontem na qual Temer nega ter negociado o repasse de dinheiro para comprar o silêncio de Cunha. Reconhece o encontro com Joesley, mas diz que não houve, na conversa, “nada que comprometesse”. No exterior é também de aversão a risco mas por causa de outro presidente, Donald Trump, e a incerteza sobre se será capaz de cumprir suas promessas políticas de crescimento dos Estados Unidos, como redução de impostos e de gastos do governo. / ALTAMIRO SILVA JÚNIOR, FRANCISCO CARLOS DE ASSIS, PAULA DIAS, LUCIANA ANTONELLO XAVIER e SILVANA ROCHA, COM REUTERS