Moradores da cidade exigem a reconstrução do prédio, na Av. Boa Viagem.
Imóvel teve parte derrubada na última sexta (27) pela construtora Rio Ave.
(Foto: Katherine Coutinho / G1)
Um grupo se reuniu, na manhã deste domingo (29), em frente ao Edifício Caiçara, na Avenida Boa Viagem, Zona Sul do Recife, para cobrar a reconstrução e preservação do prédio, que começou a ser demolido na última sexta (27) pela construtora Rio Ave, proprietária do terreno. O Conselho Estadual de Cultura indeferiu o pedido de tombamento do imóvel, mas a Fundação do Patrimônio Histórico e Artístico de Pernambuco (Fundarpe) embargou a obra no local alegando que o processo ainda não foi homologado pelo governo do estado.
Acostumado a caminhar todos os dias na orla, o pescador Francisco Romero disse que se sentiu decepcionado ao ver a demolição do Caiçara. “Tenho 55 anos e sou da época que tinha casa-navio aqui, era ponto turístico. Achava que ao menos o Caiçara estava protegido”, comentou. A Rio Ave pretende construir um empreendimento no local, proposta que vem recebendo críticas de arquiteto, historiadores e moradores da cidade.
Presente ao ato, a arquiteta Nani Azevedo afirmou que a reconstrução do prédio não é difícil. “Eu acho que é até intencional provocar na população esse sentimento de morreu [em relação à destruição do imóvel]. Mas A estrutura é de alvenaria, facílima de ser reconstruída. Basta ter boa vontade. A comparação que eu faço é a seguinte: se uma pessoa sofrer um acidente, você desiste dela ou você vai colocar uma prótese? Então, em restauração, a gente pode reconstruir, mudar o revestimento, pode fazer uma intervenção nova, que ele fique marcado porque esse edifício foi agredido em determinada situação, não só ele, mas a memória cultural da nossa cidade”, explicou a representante do movimento “Salve o Caiçara”.
destruição do prédio (Foto: Katherine Coutinho / G1)
A também arquiteta Ana Cristina Lins levou a filha, Maria Clara, 11, ao protesto. “Minha tese de conclusão de curso foi sobre a preservação e revitalização do Caiçara. Foi um choque quando soube [da demolição]. Recife está perdendo a sua memória”, lamentou. “Eu senti uma dor, chorei na hora”, disse a menina, acrescentado que soube da destruição do imóvel pelas redes sociais.
A estudante Eduarda Borba lembrou que, quando menina, frequentava a área da praia em frente ao edifício. “Faz parte da minha infância, eu vinha tomar água de coco aqui”. A servidora pública Maria Albuquerque também criticou a derrubada. “É mais que destruir o patrimônio arquitetônico, o Caiçara faz parte da memória afetiva do Recife”, defendeu.
Integrante do movimento Direitos Urbanos, o professor Leonardo Cisneiros afirmou que espera a punição dos responsáveis pela demolição. “Um crime contra o patrimônio histórico não pode ficar impune. Isso mata a memória da cidade. Batalhamos por uma relação humanizada da cidade com as pessoas, ter espaços públicos vivos. Vamos fazer uma espécie de vigília aqui e marcar presença”, comentou.
Antes do início do protesto, um grupo saiu de bicicleta do Marco Zero da cidade em direção à Zona Sul, para cobrar a preservação do prédio.
(Foto: Katherine Coutinho / G1)
Em nota, a Rio Ave informou que a Prefeitura do Recife autorizou a demolição do prédio. Ainda segundo o comunicado, o processo só foi iniciado após o indeferimento do tombamento pelo Conselho Estadual de Cultura. No entanto, a Secretaria de Mobilidade e Controle Urbano do Recife disse que a licença para a demolição foi dada em novembro de 2011 e suspensa em 27 de janeiro de 2012 a pedido da Secretaria de Cultura do Recife, “que iniciava processo de análise para classificar o imóvel como especial de preservação. Por não cumprir tal decisão, a construtora será acionada e terá que pagar multa.”
O promotor Ricardo Coelho informou que vai ingressar com uma ação cautelar para responsabilização civil e administrativa da construtora além do embargo da demolição e uma ação criminal. A pena, segundo ele, é de um a três anos de reclusão e até R$ 50 milhões de multa.