Deu na Folha
Em mensagem enviada a executivos, advogados e amigos no último sábado (dia 2), Marcelo Odebrecht, ex-presidente do grupo que leva seu sobrenome, criticou um comunicado divulgado pela empresa na véspera por “inocentar enfaticamente” executivos que estão sendo investigados. Segundo o herdeiro do grupo, o texto divulgado é “um pontapé público” no programa de compliance da Odebrecht.
O comunicado da empresa anunciou Ruy Sampaio como sucessor de Emílio Odebrecht na presidência do Conselho de Administração, mas também saiu em defesa do executivo Newton de Souza, que era apontado como a provável escolha de Emílio. Na sexta-feira (dia 1º), a revista Veja publicou informação, confirmada pela Folha, de que Marcelo havia conseguido derrubar o nome de Souza e que o executivo seria afastado de vez do grupo.
NÃO HÁ LISURA – “Em meio a uma investigação que envolve alguns atuais executivos, ignora-se a real exposição destes a ilícitos cometidos no passado e solta-se um comunicado que conclui — antes do término da investigação e sem conhecer depoimentos e provas — pela lisura de todos os atos praticados por estes executivos no passado”, diz Marcelo, no e-mail.
Após deixar a prisão, no final de 2017, Marcelo reuniu emails que mostravam que Souza conhecia irregularidades praticadas pela empresa, mas não se tornara delator.
O comunicado da Odebrecht destaca a contribuição e o “papel decisivo” de Souza, que presidiu a empresa entre 2015 e 2017, após a prisão de Marcelo. Segundo o texto, foi durante a gestão de Souza que a empresa “fez a confissão pública de seus erros, pediu desculpas pelo que fez e assumiu o compromisso de combater e não tolerar a corrupção”.
DIZ MARCELO – “O último comunicado (…) parece confirmar o que venho alertando há algum tempo: interesses pessoais de um ou outro executivo são colocados acima da coletividade e dos interesses da empresa”, respondeu Marcelo.
Segundo o ex-presidente, o comunicado foi “um tiro na imparcialidade” na atuação da empresa e demonstra uma postura “profundamente diferente” da que a Odebrecht tem tomado “com todos os outros integrantes e ex-integrantes que igualmente se envolveram em fatos apurados no âmbito da Operação Lava Jato”.
“A empresa não se manifestou publicamente sobre nenhum colaborador da Justiça, nenhum não colaborador investigado, nenhum leniente, e não se nega que muitos deles contribuíram também com coisas positivas ao longo dos anos”, disse.
QUESTIONAMENTOS – Ele afirma que a empresa hoje tenta manter “uma posição pública distante e asséptica” de seu passado recente, “esquecendo que a atuação de muitas dessas pessoas se deu, à época, no interesse da própria organização e em alinhamento com a mais alta instância representada pelo seu conselho de administração”.
Marcelo questiona como fica a situação dos colaboradores que “não fugiram de suas responsabilidades quando a empresa precisou da colaboração deles perante a justiça”.
“Como fica a própria família Odebrecht, que vem sendo injustamente acusada por um discurso leviano e diversionista, sem que seu próprio mandatário saísse em sua defesa?” – indaga.
EM CONFLITO – Desde que foi libertado, após dois anos e meio na prisão, Marcelo está em conflito com a nova cúpula da empresa.
No e-mail, ele ainda diz ter se colocado à disposição do compliance para “contribuir nas investigações em curso, dentro dos limites do meu acordo”. Também afirma lamentar o atual “caminho traçado com base no compadrio”. “Sempre fomos reconhecidos como uma empresa em que a meritocracia predominava, não podemos agora ser vistos como uma ‘corte dos amigos do rei’.”