Deu na Folha
Suspeito de atuar como arrecadador de propinas para o presidente Michel Temer, o coronel João Baptista Lima Filho se retirou de parceria com empresa detentora de contrato com a Eletronuclear após o escândalo de corrupção vir à tona. No mês passado, a Argeplan Engenharia, empresa que tem o amigo de Temer como um de seus acionistas, deixou de ser sócia do grupo europeu AF Consult, que obteve contrato de R$ 162 milhões para elaborar projeto para as obras da usina de Angra 3.
O negócio com a estatal, controlada pelo MDB, é investigado pela Polícia Federal na operação Skala, que prendeu Lima e outras pessoas ligadas ao presidente em 29 de março.
LIMA E TEMER – Os investigadores suspeitam que a empresa do coronel não tinha capacidade para realizar os serviços e que foi favorecida. Em depoimento, o empresário José Antunes Sobrinho, da Engevix, afirmou que a contratação só saiu devido ao vínculo entre Lima e Temer.
Um processo em curso no TCU (Tribunal de Contas da União) apura suspeitas de direcionamento da licitação. Um aditivo contratual de R$ 6,6 milhões foi considerado irregular pela corte. Os serviços estão suspensos.
O contrato foi firmado em 2012. Vencedora da concorrência aberta pela Eletronuclear, a AF Consult, com sede na Finlândia, montou uma empresa no Brasil em parceria com a Argeplan e a subcontratou para parte dos serviços.
CNPJ COMPRADO – Embora o contrato seja de 2012, a nova empresa começou a ser montada em 2009, dois anos antes de o edital de licitação definitivo ser lançado e o resultado da disputa, conhecido. Naquele ano, a AF Consult e a Argeplan passaram a ser sócias da Enprima do Brasil. O CNPJ da empresa, registrada em 2006, foi comprado de uma banca de advocacia.
Em 2012, as sócias mudaram a atividade fim e o nome da firma adquirida, que passou a se chamar AF Consult do Brasil. A Argeplan saiu da sociedade na AF do Brasil em 19 de março. A participação foi vendida à sócia europeia.
Dez dias depois, o coronel foi preso na Skala, desdobramento da operação Patmos, de maio do ano passado, da qual ele foi alvo. Lima ficou dois dias na carceragem da PF em São Paulo até ser liberado.
CRESCIMENTO – A PF sustenta que a Argeplan cresceu exponencialmente nos últimos anos, graças ao negócio com a Eletronuclear. Entre 2012 e 2016, o contrato rendeu R$ 55,2 milhões ao grupo AF Consult.
Os investigadores apuram se Lima bancou despesas da família de Temer no mesmo período, por meio da reforma da casa de uma das filhas do presidente, Maristela Temer, como mostrou reportagem da Folha.
Procurados, os advogados de Lima, Aline Duarte e Cristiano Benzota, afirmaram que ”as razões da saída da Argeplan da sociedade não têm, em absoluto, qualquer vinculação” com as investigações da PF. ”A empresa e seus sócios negam o cometimento de quaisquer irregularidades.”
SEM PAGAMENTOS – A AF Consult justificou que, como a Eletronuclear interrompeu pagamentos, a atividade da empresa no Brasil tem sido subsidiada pelas sócias. “As possibilidades financeiras da Argeplan eram limitadas e, portanto, sua participação estava prestes a ser diluída. A Argeplan decidiu vender as ações remanescentes.”
A AF informou que está no Brasil há cerca de 15 anos e que sua presença no país, “assim como suas parcerias”, objetivam expandir seu negócio e “não apenas de entrar na licitação de Angra 3”. A empresa negou influência de Temer no contrato da usina.
A Eletronuclear informou que a execução do contrato está suspensa desde agosto de 2016 e que o seu aditivo foi declarado nulo. A estatal explicou que foi aberto processo para rescindir a contratação.