Polônia diz que o objetivo da lei é defender seu país da calúnia, mas ainda não está claro como ela vai ser aplicada
No encontro, que durou mais de três horas, o diálogo foi inconclusivo. “Nós temos que garantir que as verdades históricas sejam preservadas, que não vai haver nenhuma restrição na liberdade de pesquisa e expressão”, disse Yuval Rotem, diretor-geral do Ministério de Relações Exteriores. O ministério disse que estava especialmente preocupado com a “cláusula da criminalização, que constitui um obstáculo para o estudo da verdade e para o debate histórico aberto”.
O governo de direita da Polônia diz que o objetivo da lei é defender a nação de calúnia, mas acadêmicos dizem que o resultado desta lei será o sufocamento de inquéritos históricos.
A grande questão é como a lei será garantida e como ela vai funcionar na prática. Teoricamente, historiadores, jornalistas e artistas ficariam de fora da lei assim como as “testemunhas da história”, como explica a porta-voz do governo polonês, Joanna Kopcinska.
Os poloneses contrários à nova lei
Na semana passada, um grupo de poloneses que arriscaram suas vidas para salvar judeus durante a Segunda Guerra Mundial, assinou uma carta aberta destinada às autoridades dos dois países. “Nós pedimos a vocês que não reescrevam a história”, diz o documento.
Ewa Junczyk-Ziomecka, presidente da Fundação Educacional Jan Karski, que organizou a carta aberta, ressalta que a maioria dos que assinaram o documento está na casa dos 90 anos de idade. “Eles estão preocupados de que seu legado – o entendimento mútuo obtido entre judeus e poloneses- possa agora ser perdido”. Ela acrescentou que seria importante estudar a experiência dos dois grupos, os judeus dentro dos guetos e os poloneses não-judeus no país ocupado. “Judeus e poloneses passaram anos aprendendo sobre o que é fonte de dor para os judeus e o que dói na alma polonesa. Suas memórias se completam. Eles não conseguem imaginar que uma pessoa possa separá-los”, disse Ziomecka.
“Nos últimos anos, nós finalmente conseguimos ter alguma paz e tranquilidade. Parecia que todos estes conflitos e tensões tinham ido embora. Como eles podem estar de volta? Como uma frase desafortunada, uma sentença imprecisa pode destruir tudo isso?”, questiona Anna Stupnicka-Bando, de 89 anos, uma das polonesas que assinou a carta.
Ela e sua mãe contrabandeavam livros e comida para o Gueto de Varsóvia. Em uma dessas viagens, ela conheceu Liliana Adler, uma judia de 11 anos. Após um pedido do pai de Liliana, mãe e filha esconderam a menina em seu apartamento. Liliana fingiu ser prima de Anna por quatro anos até elas serem libertadas pelo Exército Soviético em 1945.
A polêmica da lei
A lei vem causando polêmica desde quando ainda era um projeto. No mês passado, durante uma conferência de segurança em Munique, o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, confrontou o polonês, Mateusz Morawiecki.
Durante a discussão, o jornalista Ronen Bergaman ressaltou que seus pais, que nasceram na Polônia, perderam muitos familiares porque vizinhos poloneses os delataram para Gestapo. Em resposta, Morawiecki disse que continuaria sendo legal “dizer que houve perpetuadores poloneses, assim como judeus, russos, ucranianos, e não somente alemães”.
A referência a “perpetuadores judeus” enfureceu os israelenses e Netanyahu acrescentou: “Há um problema aqui de incapacidade de entender história e falta de sensibilidade pela tragédia do nosso povo”.
O nacionalismo polonês e a rusga com a União Europeia
O governo polonês, que também restringiu a independência judicial e a imprensa, confronta-se também com a União Europeia sobre o estado de direto da Polônia.
Na última quinta-feira, o Parlamento Europeu adotou uma resolução dando apoio à Comissão Europeia, o órgão executivo do bloco, que ameaçou tirar o direto de voto da Polônia por conta de suas ameaças contra as normas democráticas. A comissão avisou a Polônia que ela tem até o dia 20 de março para voltar atrás em suas mudanças judiciais antes que Bruxelas tome uma atitude.
O futuro da lei
A nova lei já entrou em vigor, mas o presidente polonês, Andrzej Duda, enviou o texto para avaliação do Tribunal Constitucional da Polônia. A resposta do tribunal, que é considerado alinhado ao governo, deve vir em até dois meses. Enquanto isso, a aplicação da lei continua uma incógnita.
Fontes: The New York Times-Poland and Israel in Tense Talks Over Law Likened to Holocaust Denial DW-Futuro incerto para lei polonesa sobre Holocausto