Somos os donos da bola. Por Antonio Magalhães

Por Antonio Magalhães*

Carta aos amigos A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, K, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, U, V, W, X, Y, Z.

Valeu o esforço dos brasileiros que não desistiram de redemocratizar o País durante os 21 anos de regime militar.

Valeu o esforço de Ulysses Guimarães, Tancredo Neves, Fernando Lyra, Marcos Freire, Jarbas Vasconcelos, Alencar Furtado, Teotônio Vilella, Franco Montoro, Pedro Simon, Celso Furtado, Paulo Brossard, Dante de Oliveira, entre outros, na luta por tempos melhores sem restrições.

Valeu o esforço de muitos por uma anistia ampla, geral e irrestrita em 1979 para reconciliar o País e ver o retorno à vida política de cassados e exilados.

Valeu o esforço dos recém-chegados do exílio ou do banimento, como Leonel Brizola e Miguel Arraes, para recriar tempos de governança com liberdade.

Valeu o esforço de uma sociedade ainda com fé religiosa e seus líderes católicos como Dom Hélder Câmara e Dom Paulo Evaristo Arns para assegurar as liberdades individuais.

Valeu o esforço da multidão que acompanhou os comícios nacionais em defesa das eleições diretas para presidente da República nos estertores do regime militar.

Valeu o esforço desses brasileiros para se consolarem, em 1984, diante da derrota da Emenda Constitucional “Diretas Já” no Congresso Nacional, proposta pelo deputado Dante de Oliveira.

Valeu o esforço dos brasileiros que sonharam em 1985 com um país governado por Tancredo Neves, líder da Nova República, e acordaram com José Sarney.

Valeu o esforço dos constituintes de 1988 para dotar o Brasil de uma Carta Magna forjada na democracia.

Valeu tudo isso, cada minuto, cada hora, cada dia, cada mês e cada ano dedicados a reafirmar o compromisso dos brasileiros com os mais altos valores democráticos.

E por que, diabos, toda essa história está sendo jogada fora por grupos de togados sem votos, políticos irresponsáveis, imprensa sem credibilidade, para trazer de volta o que tem de pior no mundo político nacional.

Parece que não foram suficientes as crises econômicas, maus governantes, maus políticos, maus magistrados, que permitiram o esgarçamento da nossa democracia nessas quase quatro décadas.

Hoje, atônito, o povo brasileiro vive numa pátria dividida entre “nós e eles”, onde os Poderes da República não trabalham em harmonia, como prega a Constituição, mas para suplantar um ao outro.

O autoritarismo oficial de hoje, diferente da fase anterior à redemocratização em que predominava o Poder Executivo, está instalado na alta corte do Poder Judiciário com a conivência de parte do Legislativo.

A Constituição de 1988 vem sendo reescrita por togados sem votos todos dias, deixando os brasileiros abismados com tal descaramento. Do Judiciário partem ordens de prisão, investigação, sem qualquer amparo legal. Um conjunto de aloprados, livre de controle constitucional, que faz e desfaz nessa sofrida República.

Não há brasileiro decente que não se sinta ofendido e desrespeitado nos seus direitos mais básicos de cidadania diante do atual estado de coisas. Sorte nossa contar com as redes sociais, onde é possível tomar conhecimento de versões mais próximas da realidade e não só de narrativas de quem usurpa o poder.

As comemorações pelos 200 da Independência do Brasil no próximo 7 de setembro, data magna nacional, é uma oportunidade para demonstrar a esses mandões autoritários que “o Poder emana do Povo e em seu nome é exercido”. A bola é nossa. É isso.

*Jornalista