Hoje, ministro do Supremo só sai na rua com segurança reforçada, mas antes não era assim

Nani Humor: STF

Charge do Nani (nanihumor.com)

Alexandre Garcia
Correio Braziliense

Está no Supremo Tribunal Federal um requerimento, que já tem assinaturas suficientes de mais de um terço dos senadores, para ouvir o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo, sobre em que bases legais ele fundamenta os inquéritos que está conduzindo como relator.

O autor do requerimento, senador Eduardo Girão (Podemos-CE), argumenta existirem inquéritos que não obedece ao devido processo legal, como num caso em que Moraes se considera vítima é também condutor da investigação, autor da denúncia, julgador e executor de sentença.

UM EXEMPLO – O Supremo, por 9 a 2, acaba de endossar a condução de Moraes no caso do deputado Daniel Silveira. O voto contrário do ministro Nunes Marques, acompanhado pelo ministro André Mendonça, argumenta que o Código de Processo Penal (art. 319) não prevê multa nem bloqueio de bens como medidas cautelares.

Estou em Brasília há 46 anos, sempre acompanhando de perto o Supremo. Lembro-me do tempo em que os juízes atravessavam a ruela que separa seus gabinetes do prédio do plenário, sob o olhar respeitoso dos circunstantes. Hoje, ministro do Supremo só sai com segurança reforçada.

Ainda há poucos anos, o então presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, costumava encontrar-se com amigos para um trago em conhecidos botecos, e só recebia aplausos. Quando as sessões plenárias passaram a aparecer na TV Justiça, as câmeras despertaram as personalidades. Popularidade buscada, trouxe com ela, também, o preço de os julgadores se tornarem julgados.

JUIZ MODESTO – Saudades de presidentes como Néri da Silveira, com hábitos de juiz dinamarquês: vivia modestamente e passava sua própria roupa — comentávamos entre nós, jornalistas. O tempora!

Tempos do presidente Moreira Alves, que ensinava que o Supremo pode negar leis que não encontrem acolhida na Constituição, mas não pode inventar normas legais, com o pretexto de que o Legislativo não fez a sua parte.

Semana passada, falando a um auditório da Justiça Militar da União, aí incluídos juízes do STM, o ministro Ives Gandra Martins Filho, ex-presidente do TST, criticou a politização do Judiciário, segundo ele, da base ao topo: “Judiciário politizado é Judiciário prostituído”.

SURGEM PERGUNTAS – O ministro Gandra antecipou temas de perguntas que certamente os senadores farão a Alexandre de Moraes, se o convite for aprovado: “Cláusulas pétreas não podem ser atropeladas; abrir inquérito de ofício não existe, assim como criar crime não tipificado na lei”.

Tempos difíceis para o Judiciário. “É uma pandemia de ativismo”, na opinião do ministro Gandra. Segundo ele, o voluntarismo primeiro apresenta uma decisão da cabeça do julgador, depois faz malabarismo jurídico para justificar a sentença. Vimos isso no julgamento de Dilma no Senado. O mesmo Senado que vai precisar, agora, dar uma resposta.

Os senadores vão ter de decidir se funcionam como poder moderador para proteger a liberdade democrática. E é bom lembrar que poder moderador não pode ser parte do problema e, sim, solução.