Do G1
Uma técnica de enfermagem de Amaraji, na Zona da Mata Sul de Pernambuco, denunciou que foi xingada e humilhada em um áudio que teria sido gravado pelo secretário municipal de Saúde. O caso aconteceu após a perda de vacinas no posto em que ela trabalhava. A prefeitura afirmou, por nota, que “não concorda com qualquer tipo de lesão a direito individual” e que o fato “merece apuração”.
A mensagem de voz gerou polêmica em Amaraji e as pessoas atribuem o áudio ao secretário. Nesta terça (22), uma equipe da TV Globo esteve na cidade, que tem cerca de 23 mil habitantes. O secretário de Saúde do município, José Roberto Nascimento, não foi encontrado no local de trabalho e não retornou as ligações feitas para o celular dele.
Também nesta terça, a técnica de enfermagem Mayara Andrade, de 25 anos, informou que constituiu um advogado para tratar do caso. A reportagem procurou o defensor, que confirmou ter sido procurado por ela e que vai entrar no caso.
A trabalhadora disse, ainda, que tentou prestar queixa pela internet e não conseguiu. Em Pernambuco, a Polícia Civil está em greve e alguns serviços foram prejudicados.
Na entrevista a reportagem, por telefone, Mayara contou que trabalhava desde o início da gestão da prefeita Aline Gouveia (PSB), no Posto de Saúde da Família João Gouveia da Silva, que fica no bairro Alice Batista.
Ela disse que tudo ocorreu devido à perda de vacinas do calendário nacional de vacinação, por causa de uma falta de energia no posto de saúde. Afirmou também que não eram imunizantes contra a Covid-19. A queda de energia, segundo a servidora, teria ocorrido em janeiro.
No áudio que Mayara afirma ter sido gravado pelo secretário, um homem afirma que a servidora desrespeitou a prefeita e, em meio a palavrões e xingamentos, diz que ela foi muito “mal educada, muito canalha, tratando-se da prefeita”.
“Dá pena, realmente, mas vamos nos colocar no lugar de Aline, de ser maltratada, execrada. Eu acho que é assim, você tem que ter respeito pelo seu próximo, principalmente pelo superior. Superior já está dizendo, o cargo que você ocupa como superior já lhe coloca na posição de superior. Então, assim, se você é inferior àquele cargo, você tem que fechar o ** e bater continência e tratar o seu superior como superior”, disse o homem no áudio.
Logo depois, é iniciada uma sequência de palavrões e xingamentos feitos à ex-funcionária. “Então, se você trata o seu superior como cachorro, você tem mais é que tomar no **. Eu tenho pena, sim, mas não vou absorver isso. Eu quero que ela tome no centro do **, porque, assim, eu tenho ódio da tal da r******a. […] Eu queria que todas as r******as fossem colocadas num tonel e tocadas fogo em banha de porco”, afirmou.
“Fui chamada atenção pela prefeita, só que ela não gostou da forma que eu respondi, e aí disse que ia me demitir. Só que ele [secretário] não me deu demissão. Ele falou que eu fosse conversar com ela, explicar a situação e explicar de outras coisas que aconteciam”, afirmou a técnica em enfermagem.
Mayara disse, ainda, que foi pega de surpresa pela circulação do áudio, já que o ex-chefe parecia, a todo tempo, estar apoiando ela. A trabalhadora disse também que não foi demitida oficialmente pela administração municipal.
“Pelo áudio, ela continuou com o aval de demissão e ele não fez isso, aí saiu aquele áudio. Até então, ele estava me ajudando, em relação à questão de demissão. Disse que isso não ia acontecer, que ia falar com ela e aí depois saiu esse áudio”, declarou.
No áudio, o homem não cita o ocorrido, somente faz insultos contra Mayara, em referência à suposta atitude da trabalhadora em relação à prefeita Aline Gouveia, e diz que ela “tem que perder o emprego mesmo”.
“Pecou, tratou mal, tem que se f***r mesmo, é bom que serve como exemplo. Toma no **, Mayara, te f**e, Mayara. Desempregada, vai tomar no **. Mayara e quem quer que seja, entendeu? Todos. Pena, quem tem é galinha e frango. Eu não tenho pena mais de ninguém. Eu quero é que se f**a todo mundo, tome no **, teve a oportunidade e perdeu porque quis”, declarou, ainda no áudio.
Na mensagem de voz, o homem diz também que “é preciso ter respeito” e xinga Mayara com palavras de baixo calão. “Então, tem que bater continência para quem está em cima do poder. Prefeito é prefeito. Respeita, c*****o. Respeito é bom e eu gosto, então, olhe, te f**e, Mayarinha, toma no **, vai comer agora farinha com sal”, declarou.
A trabalhadora disse que essa foi a primeira vez que foi tratada dessa forma. “Na verdade, ele é uma coisa na frente, e por trás, é outra. Quando a gente dá as costas, é outra coisa. Quem convive, sabe. Vê”, afirmou a técnica de enfermagem, fazendo referência ao secretário de Saúde da cidade.
Mayara contou, ainda, que não foi contatada por ninguém da prefeitura sobre o ocorrido, incluindo a prefeita Aline Gouveia. “Ela não se pronunciou até agora. Agiu como se não tivesse acontecido”, disse.
O advogado Antônio Neto disse que o caso pode ter dois direcionamentos na Justiça: criminal e cível. Na esfera criminal, segundo ele, caberia uma ação de difamação, já que a trabalhadora teve a “figura exposta na sociedade”. Na área cível, seria possível mover uma ação por danos morais.
Confira a íntegra da nota de Amaraji
“A assessoria de imprensa, por meio da chefia de gabinete, vem prestar os esclarecimentos sobre os fatos levados a mídia no caso do secretário de saúde do Município.
Inicialmente, a gestão externa que não concorda com qualquer tipo de lesão a direito individual, seja de servidores ou mesmo de qualquer cidadão, oportunidade em que prestamos nossa solidariedade.
Quanto a questão da servidora que foi demitida, esclarecemos que a nomeação, contratação, exoneração ou mesmo rescisão de contratos, se dá no âmbito de ajuste nos locais de trabalho, com a pertinência devida para melhor atender os munícipes, prestigiando a efetividade dos serviços públicos.
No que se refere a conduta do secretário, esclarecemos que estamos apurando o fato, destacando que o fato não ocorreu no local e horário de trabalho, e por tal motivo, merece apuração para assim tomar as medidas cabíveis, dentro da gestão.”
Mayara Andrade afirmou que foi humilhada por José Roberto Nascimento. Prefeitura disse que o fato ‘merece apuração’. O gestor não foi localizado na cidade nem pelo telefone para falar sobre o caso.