Dimitrius Dantas e Gustavo Schmitt
O Globo
Dois anos depois de 77 executivos da Odebrecht firmarem seus acordos de delação premiada com o Ministério Público Federal (MPF), pouco mais de 10% das investigações enviadas pelo Supremo Tribunal Federal ( STF ) à primeira instância resultaram em ações penais .
O “fim do mundo”, como foi apelidada a delação, basicamente só chegou em Curitiba, Brasília e no Rio de Janeiro. Na maioria dos outros estados, as investigações parecem ter encalhado na fase de inquérito, isso quando não foram arquivadas.
AÇÕES PENAIS – Desde a delação, o relator da Lava-Jato no STF, Edson Fachin, enviou à primeira instância 158 pedidos de abertura de investigação a partir de informações dadas pelos delatores. Segundo levantamento feito pelo O Globo, apenas 18 ações penais foram propostas desde então. Como a maioria dos casos delatados pela Odebrecht ocorreu até 2014, muitas das investigações correm o risco de prescrever antes de chegarem à fase de denúncia.
No Paraná, seis ações penais foram propostas com contribuição direta dos ilícitos confessados pelos funcionários da Odebrecht, incluindo o processo que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 12 anos e 11 meses de prisão por melhorias realizadas em um sítio em Atibaia. O acordo também foi juntado a outros processos de menor porte.
Em Curitiba, as delações da empreiteira também levaram a novos desdobramentos da operação, a exemplo da 62ª fase da Lava-Jato, que mira pagamentos de propina disfarçados de doações eleitorais para a cervejaria Petrópolis.
LENTIDÃO EM SP – Por outro lado, em São Paulo, para onde foram enviadas 27 petições pelo ministro Edson Fachin, pouca coisa resultou em processos na Justiça. O Ministério Público Federal ficou com apenas 14 dos pedidos de investigação —os restantes foram enviados para procuradorias do interior ou declinados para o Ministério Público estadual.
No estado, apenas o caso da Dersa, que envolveu pagamentos de propinas ao ex-diretor da estatal, Paulo Vieira de Souza, o Paulo Preto, levou a processos na Justiça Federal e à condenação do suposto operador do PSDB.
FALTA DE ESTRUTURA – O andamento dos casos esbarra na falta de estrutura do braço paulista da Lava-Jato. Há problemas como a falta de designação exclusiva dos procuradores, oscilação frequente no número de membros e mudanças na chefia.
O grupo já está no quarto coordenador desde que foi criado em julho de 2017. O estado também foi palco de uma disputa entre procuradores e promotores do Ministério Público estadual, que firmaram um acordo paralelo com a empreiteira.
CABRAL – No Rio de Janeiro, o principal alvo da operação foi o ex-governador Sérgio Cabral. Os casos envolvendo o ex-político do MDB ficaram com a força-tarefa da Lava-Jato, que denunciou Cabral três vezes com base na delação da Odebrecht. Outros casos, no entanto, continuam tramitando na Justiça Federal do Rio de Janeiro ou foram enviados a procuradorias do interior.
Na Bahia, 14 casos foram enviados para o Ministério Público Federal, mas apenas quatro ficaram sob responsabilidade dos procuradores. Cinco casos foram enviados para o Ministério Público estadual, e outros quatro para a Justiça Eleitoral.
Outro, relacionado ao deputado federal Jaques Wagner, deixou a primeira instância. Questionado sobre a situação atual das investigações, o MPF não respondeu. Um dos investigados é o ex-ministro Geddel Vieira Lima. Ele e seu irmão, Lúcio, já foram condenados no STF no caso dos R$ 51 milhões encontrados num apartamento em Salvador.
JUSTIÇA ELEITORAL – A impunidade também passou pelo envio de investigações da área criminal para a Justiça Eleitoral. Em março deste ano, o plenário do Supremo decidiu que é competência dos tribunais eleitorais julgar os casos de corrupção que envolvem também o crime de caixa 2 e lavagem de dinheiro.
A ida dos casos da Justiça criminal para a Justiça eleitoral beneficiou alguns caciques da política, como os ex-governadores de São Paulo José Serra e Geraldo Alckmin e o ex-prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes. Dos casos levantados, em seis houve declínio de competência para a Justiça Eleitoral.
Situação semelhante ocorreu no Rio Grande do Sul e Santa Catarina, onde também foram encaminhados ao tribunal eleitoral casos que envolvem a ex-deputada Manuela D’Ávila (PCdoB-RS), o ex-governador Germano Rigotto (MDB-RS), o ex-deputado estadual Beto Albuquerque (PSB-RS) e a ex-senadora e ex-ministra Ideli Salvatti (PT-SC).