Maria Lucia Fattorelli
Auditoria Cidadã da Dívida
As taxas de juros de mercado que os bancos cobram das indústrias, dos estabelecimentos comerciais e das pessoas físicas que precisam de crédito no Brasil são as mais elevadas do Planeta e atingem níveis inacreditáveis! Esses juros elevadíssimos impedem o financiamento de investimentos geradores de emprego e renda, inibem o empreendedorismo no país e até provocam a quebra de muitas indústrias que necessitam capital de giro para financiar a sua produção, aumentando ainda mais o grave quadro de desemprego existente no país.
São poucas as empresas e pessoas dispostas a pagar as escorchantes taxas de juros que os bancos cobram no Brasil. Dessa forma, uma montanha de dinheiro deixade ser emprestada e sobra no caixa dos bancos ao final de cada dia: atualmente, cerca de R$ 1,2 trilhão, ou seja, quase 20% do PIB!
SEM PREJUÍZOS – Alguém poderia deduzir que deixar de emprestar essa montanha de dinheiro provocaria grandes prejuízos aos bancos, que tenderiam então a reduzir as taxas de juros cobradas da população, para não ficar com todo esse dinheiro parado em caixa, certo?
Errado! O Banco Central não deixa isso acontecer! O Banco Central aceita toda essa sobra de caixa dos bancos e, em troca, entrega a eles títulos da dívida pública. Na medida em que os bancos detêm os títulos, eles passam a ter o direito de receber remuneração por isso. Essa montanha de recursos equivalente a quase 20% do PIB fica esterilizada no Banco Central, amarra a economia do país, gera “dívida pública” sem contrapartida alguma, e, ainda por cima, gera despesa diária com a sua remuneração aos bancos!
GRANDES NÚMEROS – Esse tipo de operação vem superando a marca de R$ 1 trilhão desde 2016, e nos últimos 4 anos custou quase R$ 500 bilhões aos cofres públicos. Conforme balanços publicados pelo Banco Central, de 2014 a 2017, essa remuneração da sobra de caixa dos bancos consumiu R$ 449 bilhões.
Assim, além de instituir cenário de profunda escassez de recursos financeiros, acirrando a elevação das taxas de juros de mercado para patamares indecentes, impedindo o financiamento de atividades produtivas geradoras de emprego e renda, essa operação tem custado muito caro para a sociedade brasileira.
O mais grave é que não existe fundamento legal para esse tipo de operação. O Banco Central tem utilizado indevidamente a rubrica “Operações Compromissadas”, que foi criada para controlar o volume de moeda em circulação e, teoricamente, a inflação.
INFLAÇÃO BAIXA – Em 2017, por exemplo, a inflação caiu para perto de zero e o IGP-M calculado pela FGV foi negativo, ou seja, não se justificaria esterilizar, de forma tão onerosa, essa montanha de recursos “para controlar a inflação”. No entanto, o volume dessas operações aumentou em 2017, atingindo o patamar mais elevado da série em outubro: R$ 1,23 trilhão, o que desmascara completamente o argumento de utilização das Operações Compromissadas para controle inflacionário.
Diante dessa flagrante ilegalidade, o presidente do Banco Central, Ilan Goldfajn, enviou ao Congresso Nacional o projeto de lei – PL 9.248/2017 na Câmara dos Deputados – que visa legalizar essa remuneração da sobra de caixa dos bancos por meio da criação de “Depósito Voluntário Remunerado”, de tal forma que os bancos irão depositar sua sobra no Banco Central e este continuará remunerando diariamente.
VISIBILIDADE – É importante dar ampla visibilidade para esse projeto de lei, justamente no momento em que enfrentamos crise financeira brutal, contrarreformas que retiram direitos sociais, propostas de privatizações que alcançam o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, a Petrobras, a Eletrobras, entre outras estatais, além de completa ausência de recursos que compromete o funcionamento de universidades, institutos federais, hospitais e o atendimento a investimentos públicos em áreas relevantes e demais necessidades fundamentais do povo brasileiro.
Nessas circunstâncias, qual é a justificativa para a utilização de recursos públicos para remunerar diariamente a sobra de caixa dos bancos? Temos dinheiro sobrando para isso?…
Além de estar prevista no projeto, a criação de “Depósito Voluntário Remunerado” está também sendo embutida no projeto de “Autonomia do Banco Central”, que o atual presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia (alvo de pelo menos 3 investigações de corrupção) anunciou que seria levado diretamente ao Plenário, sem passar pelas comissões temáticas da Câmara.
VALOR DAS ESTATAIS – O economista Paulo Guedes divulgou publicamente o valor de mercado de estatais vitais para a economia do país, totalizando R$ 437,4 bilhões. Esse valor de R$ 437,4 bilhões é inferior ao valor gasto nos últimos 4 anos só para remunerar a sobra de caixa dos bancos, que totalizou R$ 449 bilhões!
Se não enfrentar esse mecanismo que gera “dívida pública” de forma ilegal, a um custo elevadíssimo para as contas públicas e prejuízo para toda a economia do país, não adianta continuar privatizando todo o patrimônio público para pagar essa dívida, pois ela não irá parar de crescer!
Só em 2016, o prejuízo do Banco Central bateu o recorde de R$ 250 bilhões! Quem pagou esse rombo? Você! Pois esse prejuízo foi coberto por novos títulos da dívida pública que você irá pagar, pois a Lei de Responsabilidade Fiscal não estabeleceu limite algum para os rombos produzidos pela política monetária suicida praticada pelo Banco Central. E, ao contrário, mandou que os prejuízos fossem transferidos ao Tesouro Nacional. Simples, não?
DEFÍCITS NOMINAIS – O que trouxe as contas públicas para essa situação caótica em que nos encontramos em 2018 foi a acumulação de déficits nominais, desde o Plano Real, decorrentes do excesso de despesas financeiras para manter a política monetária praticada pelo Banco Central, que engloba a prática de juros abusivos, a realização de Operações Compromissadas destinadas a remunerar a sobra de caixa dos bancos e os questionáveis contratos de swap cambial.
Aí está o rombo das contas públicas, e não nos gastos e investimento sociais. Por isso, não precisa privatizar BB, CEF, Petrobras, Eletrobras etc. Basta parar de remunerar diariamente a sobra de caixa dos bancos que já alcança R$ 1,2 trilhão e custou quase meio trilhão de reais aos cofres públicos nos últimos 4 anos!