Esta ilustração tenta capturar a atmosfera histórica de Olinda no início do século XVIII.
Por Flávio Chaves – Jornalista, poeta, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc
Em 10 de novembro de 1710, uma voz ecoou pelas ruas de Olinda e plantou a semente de um sonho que viria a crescer ao longo dos séculos: a busca pela liberdade e pela autonomia nacional. Esse grito – conhecido como o Primeiro Grito pela República no Brasil – foi dado por Bernardo Vieira de Melo, um homem visionário que, em meio ao contexto colonial, ousou sonhar com uma pátria livre do domínio de Portugal. Em Olinda, surgiu o primeiro passo para o movimento republicano, e sua importância reverbera até os dias de hoje.
No Hino de Pernambuco, há um trecho que eterniza a ligação entre Olinda e a República: “A República é filha de Olinda”. Esta frase poderosa não é apenas uma celebração da cidade, mas também uma recordação do espírito audacioso que a cidade representa. No início do século XVIII, Olinda era um centro de grande efervescência cultural e intelectual, lugar de pioneirismos e marcos históricos que desenhavam uma identidade única para a região e para o Brasil nascente.
Olinda é, sem dúvida, uma cidade de muitos primeiros. O espírito inovador e o desejo pelo progresso a tornaram palco de grandes realizações que marcaram o Brasil. Foi ali que surgiram as primeiras publicações literárias, as primeiras bibliotecas públicas, o primeiro teatro, o primeiro hospital, a primeira escola de agronomia, e um dos primeiros cursos de Direito do Brasil, que dividiria a primazia com São Paulo.
Cada uma dessas instituições refletia um desejo de avançar, de educar, de formar pessoas que poderiam transformar a realidade de sua época. Mais do que edifícios e estruturas físicas, essas conquistas foram o reflexo de uma comunidade inquieta, que não se contentava com a subordinação e ansiava por autonomia e liberdade. Olinda, com suas ladeiras e suas igrejas barrocas, tornou-se então símbolo da resistência e do desejo por independência.
Bernardo Vieira de Melo, advogado e proprietário, era conhecido por seu espírito indomável e seu posicionamento audacioso em prol da liberdade. Em 1710, quando lançou o grito pela República, Bernardo não apenas se posicionava contra os abusos e o jugo colonial, mas também questionava o modelo de governo que a Coroa Portuguesa impunha sobre a colônia. Ele sonhava com uma forma de governo em que o poder fosse descentralizado, onde a voz do povo fosse ouvida, e onde as decisões fossem tomadas em prol do bem comum.
Embora seu gesto pudesse parecer isolado para a época, ele antecipou o que seria, mais de um século depois, a grande luta pela independência e, finalmente, pela proclamação da República em 1889. Bernardo Vieira de Melo é um precursor, um visionário que se arriscou ao desafiar o império, inspirando futuros movimentos republicanos e se consolidando como um ícone na busca pela soberania e justiça.
Olinda permanece eternamente em nossos corações como a cidade onde a liberdade começou a ser sonhada. Suas ruas, igrejas, e casarões testemunharam momentos que ajudaram a construir uma nação. A República que floresceria no Brasil décadas depois foi concebida no idealismo de homens como Bernardo Vieira de Melo e nos pioneiros que acreditaram na força da educação, da cultura e da política para transformar a sociedade.
Em 1710, Olinda não apenas ecoou o Primeiro Grito pela República, mas também o primeiro grito de que mudanças seriam possíveis. E, ainda hoje, quando o Hino de Pernambuco entoa que a “República é filha de Olinda”, lembramos que cada conquista pela liberdade tem raízes profundas, fincadas em solo pernambucano.