A dificuldade de taxar fortunas no Brasil e a facilidade de imposição de tributos ao povo pobre. Por Flávio Chaves

Lembro aos responsáveis pela condução desse processo tributário que salvar sonhos é igual a salvar vidas.

 Por Flávio Chaves – Jornalista, escritor e membro da Academia Pernambucana de Letras. Foi Delegado Federal/Minc

A taxação de grandes fortunas é um tema recorrente nos debates políticos e econômicos do Brasil. Apesar de sua previsão na Constituição de 1988, até hoje não foi regulamentada, enfrentando resistências significativas. Em contraste, a população de baixa renda frequentemente vê a implementação de novos tributos e ajustes fiscais com relativa facilidade. Esse paradoxo reflete as complexas dinâmicas de poder e influência que permeiam a sociedade brasileira.

Desde a promulgação da Constituição Federal de 1988, a taxação de grandes fortunas é prevista como uma forma de redistribuição de renda e combate às desigualdades sociais. No entanto, sucessivos governos têm encontrado dificuldades para implementar essa medida. A resistência vem de diversos setores, principalmente daqueles que possuem maior poder econômico e influência política.

Grandes fortunas possuem poder de barganha e influência sobre as decisões políticas. Empresários e grandes investidores têm capacidade de financiar campanhas eleitorais, criando um cenário onde políticos se sentem pressionados a proteger os interesses desses grupos. Há aqueles que o interesse é exercer forte lobby no Congresso Nacional para barrar projetos de lei que propõem a taxação de fortunas. E a pressão sobre parlamentares é intensa, e a aprovação de medidas impopulares entre as elites econômicas se torna um desafio monumental. Argumenta-se que a implementação de um imposto sobre grandes fortunas poderia resultar na fuga de capitais, com investidores e empresários transferindo seus recursos para países com regimes tributários mais favoráveis.

A população de baixa renda não possui o mesmo poder de barganha e influência política que as elites econômicas. Isso torna mais fácil para os governos, insensatos,  implementarem medidas fiscais que impactam diretamente os mais pobres. A falta de uma representação política forte e organizada dificulta a resistência das camadas mais vulneráveis da sociedade contra novos tributos e ajustes fiscais.

Governos enfrentam pressões constantes para equilibrar suas contas públicas. Com a dificuldade de taxar grandes fortunas, a alternativa mais prática é aumentar impostos que incidem sobre o consumo e a renda da população mais carente e necessitada.

O sistema tributário brasileiro é caracterizado por ser regressivo, onde os pobres acabam pagando proporcionalmente mais do que os ricos. Impostos sobre consumo, como o ICMS, afetam diretamente os mais necessitados, enquanto tributos sobre patrimônio e renda são menos explorados.

É preciso que se construa pessoas comprometidas com as camadas periféricas e que vivem à margem da sociedade. A organização e fortalecimento dessa representação política  é fundamental para promover uma agenda de justiça fiscal. Movimentos sociais, ONGs e políticos comprometidos com essa causa têm um papel crucial nesse processo. Não se pode mais pensar no Brasil sem se preocupar com aqueles qu ainda morrem sem o direito do pão à sua mesa. Sem direito à saúde e habitação. Não interessa discurso de oferecer picanha, sem entregar a dignidade para o cidadão construir o caminho de sua família.

Já é hora de dar um basta nessa geopolítica da fome pela qual caminha o brasileiro sofrido. É tem de dar um basta nessa facilidade de impor tributos ao povo tão carente, de olhos caídos de tristeza ao se deparar com a mesa vazia com a qual os políticos e gestores públicos oferecem, mal rompe a manhã. Essa indiferença, ainda hoje,  só revela um desequilíbrio de poder e influência que perpetua as desigualdades sociais e econômicas. Uma mudança nesse cenário requer disposição política, rasgar a própria carne para partilhar com o semelhante. É preciso  muita coragem para enfrentar interesses poderosos e uma mobilização social capaz de pressionar por uma reforma tributária justa e equilibrada. Se faz urgente que a esperança volte às ruas deste país. E o povo carregue a certeza de que o sol vai raiar para todos, todos os dias. Lembro aos responsáveis pela condução desse processo tributário que salvar sonhos é igual a salvar vidas.