A romancista, contista, tradutora, jornalista e poeta cearense Raquel de Queiroz (1910-2003), no poema “Telha de Vidro”, ensina que um simples toque de criatividade na troca de uma simbólica telha pode mudar tudo para melhor em nossas vidas.
TELHA DE VIDRO
Rachel de Queiroz
Quando a moça da cidade chegou
veio morar na fazenda,
na casa velha…
Tão velha!
Quem fez aquela casa foi o bisavô…
Deram-lhe para dormir a camarinha,
uma alcova sem luzes, tão escura!
mergulhada na tristura
de sua treva e de sua única portinha…
A moça não disse nada,
mas mandou buscar na cidade
uma telha de vidro…
Queria que ficasse iluminada
sua camarinha sem claridade…
Agora,
o quarto onde ela mora
é o quarto mais alegre da fazenda,
tão claro que, ao meio-dia, aparece uma
renda de arabesco de sol nos ladrilhos
vermelhos, que – coitados – tão velhos
só hoje é que conhecem a luz do dia…
A luz branca e fria
também se mete às vezes pelo clarão
da telha milagrosa…
Ou alguma estrela audaciosa
careteia
no espelho onde a moça se penteia.
Que linda camarinha! Era tão feia!
— Você me disse um dia
que sua vida era toda escuridão
cinzenta, fria,
sem um luar, sem um clarão…
Por que você não experimenta?
A moça foi tão bem sucedida…
Ponha uma telha de vidro em sua vida