Luís Ernesto Lacombe
Gazeta do Povo
Não quero um “pai de todos” para pegar na mão de cada cidadão e conduzi-lo ao reino da correção, da verdade. Um lugar que, no fim, nem existe, mal disfarçado sobre leis rasgadas e conceitos particulares, quebradiços, insanos. Só esse tutor sabe o que é correto, o que é real. Vende-se como o detentor das soluções para todos os problemas. Só ele mesmo sabe o que é melhor para todos nós.
Ele nos diz o que é verdade e o que é mentira. Ele diz o que podemos ver, ouvir, ler… Ele diz o que podemos pensar, o que podemos dizer, o que podemos emitir como opinião. Ele nos impede de perguntar, elimina o questionamento, o debate. Ele persegue, censura, prende. E é tudo para nossa salvação e segurança.
REINO NO SUPREMO – De uns tempos para cá, o STF tem criado um reino absoluto. O povo, despreparado, ingênuo, vulnerável, será salvo pelos seres supremos, os “senhores da razão”, aqueles que sabem verdadeiramente o que é democracia e como defendê-la…
É por isso que os juízes estão, de novo, envolvidos em matéria legislativa: a discussão sobre o projeto de lei das fake news. Não bastam as garantias a liberdades previstas na Constituição, a proteção à liberdade de manifestação do pensamento, da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, sem qualquer tipo de censura ou licença.
NO LADO ERRADO – Os juízes se metem onde não devem, e sempre no lado errado da briga. Os ministros defendem o projeto, a despeito do que diz a Constituição, além dos crimes contra a honra – calúnia, injúria e difamação – previstos no Código Penal, do próprio Marco Civil da Internet e da Lei Geral de Proteção de Dados.
O que temos de leis já nos garante a liberdade de opinião, com responsabilidade, e a liberdade de receber e transmitir informações ou ideias, sem ingerência do poder público.
Já temos as bases para um Estado plural e democrático, mas o Supremo e 249 deputados federais querem destruir tudo isso, querem censura.
APENAS DESCULPA – O combate à desinformação e às fake news, conceitos obscuros e subjetivos, não tipificados criminalmente, serve sempre de desculpa… E caminhamos para o fim da liberdade de expressão, do livre acesso à informação, com a criação de um aparato de controle estatal das redes sociais e de seus usuários.
As grandes empresas de tecnologia são contra o projeto, mas não por amor à liberdade. Elas próprias apostam na censura, no cancelamento e banimento. Não querem concorrência, quando o assunto é controle de conteúdo… Há tantos interesses em jogo. A mídia tradicional, que tinha o monopólio da informação, que era a dona da verdade, está de olho grande. No fundo, são todos ardilosos…
Falam em liberdade? Entenda-se censura. Falam em democracia? Entenda-se ditadura. São campeões da mentira metidos a tutores. Vamos esfregar na cara deles nosso senso crítico e rasgar toda dissimulação, principalmente as travestidas de leis.