Deu no Relatório Reservado
A guerra entre Rússia e Ucrânia poderá demorar muito. Ao menos a julgar pelos dados contidos no documento reservado de 26 páginas elaborado pela Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (Eceme), ao qual o RR teve acesso. À luz das informações disponíveis no relatório, não se deve desprezar o poder de fogo e a capacidade de resistência da Ucrânia para retardar os ataques russos, notadamente no combate aéreo.
De acordo com o documento, “as defesas antiaéreas em Kiev e em outras cidades parecem estar em boas condições, o que deixa os russos com a difícil escolha entre lançar ataques de alta altitude e correr o risco de provocar efeitos colaterais na população ou lançar ataques à baixa altura, correndo o risco de serem abatidos.”.
HÁ PROBLEMAS – É sintomático, como aponta a Eceme, que a Rússia não esteja utilizando todo o seu poderio aeronáutico. Além dos sistemas de defesa ucranianos, há outras razões para esse cenário. O relatório da Escola cita “a quantidade limitada de munições guiadas de precisão (PGMs) disponíveis para a maioria das unidades de caça da VKS (Forças Aeroespaciais Russas).
Durante operações de combate na Síria, no ano passado, apenas a frota Su-34 fez uso regular de PGMs e mesmo essas aeronaves de ataque especializadas recorreram regularmente às bombas não guiadas e ataques com foguetes. Isso indica a falta de adestramento para o uso dessa munição e um possível esgotamento do estoque da mesma, depois da campanha da Síria.”
Outra explicação cogitada é que “a VKS não está confiante em sua capacidade de desconflitar com segurança surtidas de aeronaves em larga escala com a atividade das baterias de mísseis terra-ar russas, operadas pelas Forças Terrestres.”
FOGO AMIGO – De acordo com a Eceme, “incidentes de fogo amigo por unidades terrestres têm sido um problema para as forças aéreas ocidentais e russas em vários conflitos desde 1990”.
A Escola de Comando e Estado -Maior do Exército aponta ainda outras fragilidades da Força Aérea russa. É o caso do “número relativamente baixo de horas de voo que os pilotos da VKS recebem a cada ano.”
Segundo o relatório, “embora seja difícil encontrar números precisos em cada unidade, declarações oficiais russas sugerem uma média de 100 a 120 horas por ano, além da falta de acesso a simuladores modernos para treinamento.” O combate aéreo, ao que tudo in dica, é uma vulnerabilidade das forças militares de Vladimir Putin.
MODERNIZAÇÃO – A Eceme enfatiza que “apesar de um impressionante programa de modernização de cerca de 350 novas aeronaves de combate modernas na última década, pode ser que os pilotos da VKS tenham dificuldades para empregar efetivamente muitas das capacidades teóricas de suas aeronaves no ambiente aéreo complexo e contestado”.
Nesse caso, reforça a Escola, “o comando da VKS pode hesitar em se comprometer com operações de combate em larga escala, que mostrariam a lacuna entre as percepções externas e a realidade de suas capacidades.”
A Ucrânia tem se aproveitado dessa debilidade militar russa. A resposta ucraniana vem, sobretudo, com o uso de aeronaves Su-25, que voam em pares e têm realizado “vários ataques de mísseis e bombas a colunas de veículos blindados e militares inimigos nas regiões de Kiev e Zhytomyr”, afirma a Eceme no mesmo documento reservado.
FORTE REAÇÃO – Aviões da Ucrânia realizam ofensivas também nas regiões de Chernihiv e de Berdyansk. Há registros de pelo menos quatro ataques com bombas a colunas mecanizadas, comboios com combustível e lubrificantes na região. O país tem utilizado ainda drones Bayraktar TB2 para atacar blindados e o sistema de mísseis antiaéreo Buk, da Rússia.
De acordo com a Eceme, “há indícios que a Ucrânia atacou a base aérea russa de Taganrog, que abriga aeronaves de transporte Il-76. A Ucrânia possui mísseis balísticos que poderiam ser empregados em tal ataque, como o Tochka-U. Caso seja comprovado, o ataque demonstra que a Ucrânia ainda tem capacidade de utilizar o espaço aéreo de forma ofensiva, inclusive além do seu território.”
Nesse cenário, os ucranianos têm conseguido superar a assimetria das respectivas Forças Aéreas, ao menos em termos numéricos
DURAS PERDAS – Ainda assim, a Ucrânia tem imposto duras perdas à Rússia. No último dia 2 de março, pontua a Eceme, pilotos de caça ucranianos interceptaram e derrubaram dois aviões russos. A Ucrânia te se utilizado também de mísseis antiaéreos S-300. Já o sistema de mísseis Buk M-1 derrubou um míssil de cruzeiro e um helicóptero da Rússia.
A Escola de Comando e Estado-Maior do Exército ressalta que “a tomar por referência a atuação desses meios aéreos e antiaéreos ucranianos, conclui-se que a Rússia ainda não possui a superioridade aérea em todo o Teatro de Operações”.