Por CLAUDEMIR GOMES
Domingo (13/02/2022), durante a edição do programa THE VOICE+, a cantora, Fafá de Belém, 65 anos, que este ano foi escalada para compor o júri, em três oportunidades ressaltou a necessidade de os idosos darem um grito contra a invisibilidade imposta pela sociedade, da qual são vítimas dos efeitos devastadores de uma exclusão galopante considerada natural.
No ano 2000, quando acumulava os cargos de treinador da Seleção Brasileira, e do Sport Club do Recife, Emerson Leão me revelou todo um trabalho psicológico que vinha desenvolvendo para quando não estivesse mais sob os holofotes. Afinal, ele havia passado décadas de intensa visibilidade no futebol brasileiro e internacional e, de repente, se tornaria invisível.
Ontem, o professor, Sílvio Ferreira, compartilhou um vídeo no facebook, que mostra o atual momento do zagueiro, Brito, tricampeão mundial em 70, no México. Aquele senhor caminhando, com relativa dificuldade, pelas ruas de um bairro periférico do Rio de Janeiro, perdeu sua visibilidade de herói de uma conquista épica para o futebol brasileiro. É como se estivesse sido dragado pela poeira do tempo.
Dois anos após Edson Nogueira ter deixado a presidência do Santa Cruz, no encontramos numa solenidade. Na oportunidade, um cidadão que, durante todo o tempo em que esteve no cargo vivia lhe puxando o saco, passou a uma distância de menos de um metro e sequer olhou de lado. Minutos depois, quando Nogueira estava sendo abraçado pelos homenageados, ele se aproximou e disse que não o tinha visto.
“É que eu estava invisível”, lhe respondeu Edinho com uma dose de ironia cavalar.
O ex-presidente da FPF, Carlos Alberto Oliveira, tinha tanto pavor de vir sofrer os efeitos da invisibilidade que criou sua própria plateia. Todos os dias um grupo de puxa-saco marcava presença na sede da entidade, na rua Dom Bosco, para aplaudir e sorrir com as histórias do burgomestre do futebol pernambucano.
A pandemia da invisibilidade é bem maior que a do COVID. Ela ataca há décadas, mas as pessoas não se deram conta das causas. Apenas sofrem os efeitos.
O que provocou este estado de coisas? Tudo!
Naturalmente que devemos estar abertos para as mudanças de comportamento. Mas, e os efeitos?
Em nome da segurança contra a desenfreada violência urbana, os muros dos edifícios se tornaram cada vez mais altos. Fortalezas de luxo. As ruas foram ficando desertas. O comércio passou a ser concentrado em shoppings. E os antigos logradouros comerciais foram abandonados. As ruas expulsam os homens.
A fila anda!
Diz o dito popular. Verdade. Mas as pessoas insistem em ignorar que existe um tempo para tudo e para todos. Não são poucos os exemplos de cidadãos que cometem o suicídio por temer a invisibilidade que vem acoplada a velhice.
Um ex-governador de Pernambuco me disse um dia desses que, eram poucos os amigos que se lembravam dele. Políticos, cantores, jogadores, jornalistas, comunicadores famosos, celebridades, todos, sem exceção, vivenciarão episódios de invisibilidade.
No início da noite, após contemplar o silêncio da rua deserta, retorno minha atenção para o facebook. O mestre, Leonardo Antônio Dantas Silva, que carrega consigo uma bagagem de conhecimentos fantástica, havia postado o poema – Se eu morresse amanhã de manhã – do grande Antônio Maria.
E Leonardo dá seu grito de alerta: “UM RECADO DE ANTÕNIO MARIA DE ARAÚJO, PARA TOOS NÓS ESQUECIDOS”.
Os mestres também sofrem os efeitos da invisibilidade.
SE EU MORRESSE AMANHÃ DE MANHÃ
Antônio Maria
De que serve viver tantos anos sem amor
Se viver é juntar desenganos de amor
Se eu morresse amanhã de manhã
Não faria falta a ninguém
Eu seria um enterro qualquer
Sem saudade, sem luto também
Ninguém telefona, ninguém
Eu grito e um eco responde:
“ninguém!”
Se eu morresse amanhã de manhã
Minha falta ninguém sentiria
Do que eu fui, do que eu fiz
Ninguém se lembraria.
Na nova ordem nos tornamos invisíveis antes da morte.