Mônica Calazans, de 54 anos, é diabética, obesa e hipertensa e trabalha há oito meses no hospital
Por Aline Ribeiro
Com a aprovação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) neste domingo, do uso emergencial do fármaco, Calazans e outros profissionais de saúde indicados por hospitais públicos e que trabalham na linha de frente do combate à Covid-19 estão sendo vacinados pelo governo de São Paulo.
Diabética, obesa e hipertensa, a enfermeira faz parte de grupo de risco e trabalha na Unidade de Terapia Intensiva (UTI) do Emílio Ribas, em São Paulo. A instituição é referência no tratamento de doenças infecciosas.
– Agora vamos começar a voltar à vida normal. Todo mundo vacinado. Estou feliz. Me sinto representante dos profissionais da saúde e da população brasileira – declarou Calazans, logo após ser vacinada.
Mais tarde, em coletiva, ela deu um depoimento sobre as pressões que sofreu ao se voluntariar para os testes da vacina.
– Quero que a população acredite na vacina. Vamos pensar no monte de vidas que perdemos, quantas famílias, pais, mães, irmãos, perdemos. Diante disso, é que tomei coragem e que participei. No início, fui muito criticada. Recebia piadinhas, memes. Não dei importância. Mne falaram que era cobaia. Não sou cobaia, mas participante de pesquisa. E estou muita orgulhosa disso. Mônica Calazans, mulher, negra, primeira a ser vacinada. Tenho muito orgulho disso. Vamos nos vacinar, não tenham medo. Para poder voltar à vida normal, com abraço, aperto de mão. Estamos lidando com um inimigo invisível. Brasileiros, essa é nossa grande chance. Falo com segurança e propriedade, essa é a grande chance que temos de salvar vidas – declarou.
Doria destacou a importância do momento.
– A emoção de fazer aquilo que é necessário para salvar vidas. Mônica e outras milhões de profissionais de saúde salvaram vidas. Esse é o exemplo que o Brasil precisa. A Mônica representa isso, o valor da vida – afirmou o governador.
Em maio, quando a pandemia atingia alguns de seus maiores picos, Mônica Calazans se inscreveu para trabalhar no Emílio Ribas, mesmo ciente de que a unidade estaria no epicentro do combate à pandemia. A vocação falou mais alto, diz. A informação foi antecipada pela Folha de S.Paulo.
Mônica Calazans trabalhou como auxiliar de enfermagem durante 26 anos. O diploma universitário veio mais tarde, aos 47. Viúva e mãe, nem ela nem o filho de 30 anos se infectaram com a Covid-19. A família, entretanto, não passou isenta pela pandemia. Seu irmão caçula, auxiliar de enfermagem de 44 anos, ficou internado por 20 dias com a doença.
Mônica foi vacinada pela enfermeira Jéssica Pires de Camargo, de 30 anos, mestre de Saúde Coletiva pela Santa Casa de São Paulo. Na sequência, ela recebeu do governador um selo simbólico com os dizeres “Estou vacinado pelo Butantan” e uma pulseira com a frase “Eu me vacinei”.
Entrega de vacinas
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou neste domingo que determinou ao Instituto Butantan a entrega das doses de CoronaVac ao Ministério da Saúde para que sejam distribuídas a outros estados brasileiros logo após a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovar o uso emergencial. “O Brasil tem pressa para salvar vidas”, escreveu, no Twitter. Ele não detalhou a quantidade de doses que serão entregues ao governo federal.
Doria acompanhou do Hospital das Clínicas, em São Paulo, a reunião da Anvisa que decidiu sobre o uso, em caráter emergencial, das vacinas do Instituto Butantan e da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). Ele foi ao local ao lado do vice-governador, Rodrigo Garcia (DEM), e do diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas.
Técnicos e diretores da Anvisa se reuniram desde a manhã em Brasília, para votar o uso emergencial das vacinas CoronaVac, produzida em parceria entre o Butantan e farmacêutica chinesa Sinovac, e a do laboratório anglo-sueco AstraZeneca, desenvolvida em parceria com a Universidade de Oxford e que deverá ser produzida pela Fiocruz a partir de fevereiro.
Em guerra aberta contra o governo Jair Bolsonaro (sem partido) pelo crédito do início da imunização, o governador poderá vacinar, num primeiro momento, apenas grupos pré-definidos nos estudos entregues à Anvisa – idosos, profissionais de saúde, indígenas e quilombolas.
Para comercialização do imunizante e ampla vacinação sem necessidade de especificação de grupos é preciso obter o registro final da vacina.
Mais informações
A Anvisa fez uma ressalva na decisão deste domingo que o Instituto Butantan não enviou dados importantes sobre a vacina, como informações sobre anticorpos gerados na fase 3 do estudo, quando o imunizante é testado amplamente.
Entre as “incertezas” apontadas, a área técnica destacou: a duração da proteção proporcionada pela vacina, seu efeito em idosos e outros grupos específicos, como pessoas com comorbidades.
Também não pode ser avaliada a eficácia da vacina em pessoas que já tiveram a doença. A reportagem contatou o Butantan mas ainda não teve retorno sobre as ponderações da Anvisa sobre a CoronaVac.
Os dados incluem os voluntários do teste clínico que contraíram a doença, mas tiveram casos leves, o que mostra que o imunizante é capaz de proteger contra formas graves da Covid-19. A vacina supera o índice recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
A autorização emergencial de uso permite a imunização apenas em grupos pré-definidos nos estudos entregues à Anvisa. Para comercialização do imunizante e ampla vacinação sem necessidade de especificação de grupos é preciso obter o registro final da vacina.
Com a decisão da Anvisa, as vacinas de Oxford e a CoronaVac poderão ser aplicadas em grupos específicos a partir do momento que os laboratórios produtores forem comunicados da decisão.
No sábado, a agência informou que o pedido de uso emergencial da vacina russa Sputnik V havia sido rejeitado por falta de requisitos mínimos, como a autorização de testes da fase 3 no Brasil.