Fernanda Calgaro
G1 — Brasília
A Frente Parlamentar pela Ética Contra a Corrupção pediu nesta quinta-feira (24) ao presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), a retomada da comissão que discute a proposta de emenda à Constituição (PEC) sobre a condenação após segunda instância.
Assim como as demais comissões, o colegiado foi suspenso em março, em razão da pandemia do novo coronavírus. A retomada das atividades depende de aprovação, pelo plenário, de um projeto de resolução. O requerimento apresentado nesta quinta-feira prevê que as reuniões da comissão aconteçam de forma remota.
VEJA QUEM ASSINOU – O pedido é assinado pelos seguintes deputados: Adriana Ventura (Novo-SP), presidente da frente parlamentar; Alex Manente (Cidadania-SP), autor da proposta de emenda à Constituição (PEC); Fábio Trad (PSD-MS), relator; Marcelo Ramos (PL-AM), presidente da comissão; Marcel van Hattem (Novo-RS), vice-presidente da Frente Parlamentar Mista em Defesa da Prisão em Segunda Instância.
No início deste mês, pedido semelhante para a retomada da comissão havia sido feito por Trad, Manente e Ramos. Rodrigo Maia, no entanto, ainda não se manifestou sobre isso.
O QUE DIZ A PEC – A proposta em debate na comissão altera Constituição para que a execução da pena seja imediata após a condenação em segunda instância. Isso valeria para todos os campos do direito, incluindo o penal, tributário, trabalhista e eleitoral.
Atualmente, o artigo 5º da Constituição diz que “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. O trânsito em julgado é a etapa em que não cabe mais nenhum recurso.
Em seu parecer, o relator da PEC prevê que o trânsito em julgado passaria a ser após a segunda instância. Em certas situações, o réu ainda poderia recorrer a outra instância, mas o recurso não impediria o trânsito em julgado.
DE VOLTA À PRISÃO – “Estamos mudando o conceito de trânsito em julgado, para que ele ocorra após a condenação em segunda instância”, explicou Trad ao G1.
Na prática, por exemplo, se um réu for condenado à prisão em segunda instância, ele já poderia cumprir a pena na cadeia sem aguardar os recursos a instâncias superiores.
Hoje, nesses casos, por um entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF), a execução da pena só acontece após o processo passar por todas as instâncias. No entanto, a corte já mudou de posição sobre o tema.
VAIVÉM CONSTITUCIONAL – Desde 1988, ano da promulgação da Constituição, a 2009, vigorou no STF o entendimento segundo o qual a prisão poderia ser decretada após a condenação em segunda instância.
Em 2009, porém, o STF decidiu que o condenado poderia continuar livre até que se esgotassem todos os recursos no Poder Judiciário, por respeito ao princípio da presunção de inocência.
Mas, em 2016, o STF voltou a entender que a pena poderia ser executada a partir da condenação em segunda instância. No ano passado, o STF mudou o entendimento, decidindo que a execução da pena só acontece com o chamado trânsito em julgado.
CUMPRIMENTO DA PENA – Em um seminário organizado na manhã desta quinta pela frente parlamentar, o autor da proposta, Alex Manente, defendeu a necessidade de se esclarecer o momento em que um condenado deve começar a cumprir a pena.
“Nosso sistema dá possibilidades ao Supremo Tribunal Federal a cada momento de ter um entendimento. E o entendimento lá é muito dividido. As decisões foram seis votos a cinco, em todas as decisões. Se nós não cumprirmos essa etapa, infelizmente, continuaremos tendo decisões que podem mudar de acordo com a pessoa que está pleiteando, que é isso que a população brasileira sente nesse momento”, afirmou o deputado.
SEGURANÇA JURÍDICA – Para a ex-ministra do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Eliana Calmon, que também participou do seminário, a aprovação da PEC dará segurança jurídica ao tema.
“É um projeto que vai ensejar segurança jurídica e, sobretudo, restaurar a credibilidade ao Poder Judiciário, porque estas idas e vindas têm feito com que o judiciário fique desacreditado perante a população”, disse.
No debate, o procurador regional da República Fábio George Cruz da Nóbrega afirmou que o atual sistema é ineficiente e defendeu a execução de penas após a condenação em segunda instância.
UM SISTEMA INEFICAZ – “Está em vigor, claramente, um sistema que não funciona. Ou dizendo de outro jeito: um sistema que funciona muito bem para aqueles que querem que ele não funcione, aqueles que violam sistematicamente a lei e que sabem que, contando com bons advogados e uma quantidade enorme de recursos disponíveis, dificilmente terão que cumprir alguma pena neste país, ainda que vierem a ser condenados”, disse o procurador regional da República Fábio George Cruz da Nóbrega.