Foto: Jefferson Rudy/Agência Senado
“Moro de saias” chora ao falar de cassação: “Justiça ainda é falha”
Selma Arruda diz que Bolsonaro foi omisso e promete seguir em Brasília
Época – Da coluna de Guilherme Amado
Por Eduardo Barretto
Acostumada a assinar decisões judiciais contra políticos, a senadora cassada Selma Arruda ainda não engoliu o julgamento do Tribunal Superior Eleitoral dna terça-feira 10.
“A Justiça ainda é falha. Meu caso não era qualquer um, era de uma senadora da República. O processo andou na velocidade da luz. O critério era fazer a coisa mais rápido”, disparou, em entrevista à coluna.
Eleita com o apelido de ‘Moro de saias’ pelo PSL, Arruda chorou ao se lembrar de quando contou aos filhos que fora cassada e avisou que seguirá despachando de Brasília: “Eles não ganharam a guerra. Só a batalha”.
Leia a entrevista:
O que a senhora sentiu ao ser cassada?
Eu acompanhei aqueles votos absurdos de casa. Recebi o resultado do julgamento com respeito, mas com indignação. Ficou muito nítido que o voto do relator (ministro Og Fernandes) tinha muitos equívocos e induziu os outros. O ministro Fachin foi o único que efetivamente analisou o processo. Pela índole do Fachin, que não é garantista nem absolve à toa, me senti com a alma lavada.
A senhora foi injustiçada?
Absolutamente injustiçada. Eu, que trabalhei com a Justiça tanto tempo, fico ainda mais decepcionada em saber quanto a Justiça ainda é falha. Não analisa as provas, não se preocupa em cuidar dos casos. E meu caso não era qualquer um. Era o caso de uma senadora da República. Poderia ter sido analisado com mais parcimônia. Mas esse processo andou na velocidade da luz. Me parece que a análise ali não era o critério. O critério era fazer a coisa mais rápido.
Por que a senhora diz isso?
Não me conformo com a celeridade desse processo. O parecer da PGR (Procuradoria-Geral da República) veio em sete horas, um absurdo. O caso foi julgado em quatro meses no estado. É um recorde. Não quero postergar, não, mas acho que as pessoas deveriam ter mais critério. Analisar provas. Uma coisa feita com muita pressa nunca vai ser perfeita.
A senhora foi ajudada por Sergio Moro e Alvaro Dias.
O ministro Moro eu não sei se ajudou. Alvaro Dias com certeza foi um grande batalhador nessa história. Ele até pediu para seus advogados analisarem o processo e ouviu deles que a causa era justa. Por isso ele abraçou a causa com tanto amor.
Jair Bolsonaro, que a senhora tanto exaltou na campanha, falou algo?
Não. Ele foi absolutamente omisso.
Flávio Bolsonaro havia prometido apoio quando vocês eram colegas de PSL no Senado. Isso aconteceu?
Flávio com certeza não ajudou.
Valeu a pena deixar a magistratura e ser cassada um ano depois?
Tudo vale a pena. Não teria me perdoado se não tivesse tentado, eu não morreria em paz. Falei para meus filhos: (silêncio) “Vocês não precisam se envergonhar da sua mãe. A sua mãe não fez nada” (choro). E eles confiam.
A senhora imaginava que seria destituída do cargo?
Era esperado, mas não sabia que seria tão perseguida de um jeito tão açodado. Brasília é muito suscetível a influências políticas. Não tenho vergonha de ter sido cassada. Já superei essa questão. O jogo é bruto. Comigo, sempre foi. Eu sempre metia a mão nessa coisa e sabia dos bastidores. Os processos mostram as tripas do poder.
O que a senhora fará agora?
Estou inelegível por oito anos. Não me vejo mais na política, pelo menos não na linha de frente. Quero continuar trabalhando para o Podemos e ajudando os senadores do grupo Muda Senado. Vou continuar nos bastidores. Eles não ganharam a guerra. Só a batalha.
A senhora seguirá despachando de Brasília?
Sim. Minha meta é fortalecer o partido. O Alvaro Dias tem tudo para ser o presidente do Brasil. O Brasil vai acordar e perceber que nenhum dos dois extremos é bom. Nem direita, nem esquerda. E o Podemos pode surgir nesse cenário de caos como um partido ponderado. Não consegui conviver com a extrema-direita.
O melhor e o pior momento em um ano como senadora?
O melhor momento foi no começo, quando em uma bela manhã o senador Oriovisto (Guimarães) resolveu convidar alguns colegas para um café da manhã. Ninguém entendeu nada. Eram 12 convidados. O (Eduardo) Girão até falou que era o número de apóstolos de Cristo. Ali, desabafamos nossas angústias com o que vivíamos no Senado. E decidimos criar o grupo Muda Senado. Foi uma esperança. O pior momento foi o da cassação.
A senhora diz que foi retaliada pela atuação como magistrada, que mandou prender um ex-governador. Procuradores e juízes também podem ser prejudicados se entrarem na política?
Sim. Foi um recado. Quem bate de frente contra a corrupção não é bem-vindo na política. Mas mesmo assim acho que tem de enfiar o pé na porta. Quanto mais você espera, mais o outro lado se une.
(Por Eduardo Barretto)