Mudança de rumo
POR MERVAL PEREIRA
Bolsonaro foi eleito principalmente pelo sentimento antipetista que continua latente. Mas ampliou seu eleitorado cativo, de militares e assemelhados, com a adesão da classe média urbana, que exigia o combate à corrupção como maneira de conseguir bons serviços públicos e um padrão ético civilizado.
A Operação Lava-Jato fez com que os brasileiros juntassem causa e efeito, compreendendo que a corrupção constrangia o investimento governamental em áreas carentes de equipamento urbano de transportes, de saúde, de educação, saneamento básico.
Na campanha presidencial, Bolsonaro anunciou logo que o superministro da Economia seria Paulo Guedes, seu “posto Ipiranga”. O que lhe valeu o apoio de um eleitorado liberal que buscava ao centro a solução para livrar-se do PT. Bolsonaro tornou-se a solução à mão.
Eleito, deu um golpe de mestre convidando o juiz Sérgio Moro, símbolo do combate à corrupção, para ministro da Justiça e Segurança Pública, juntando em uma figura icônica dois setores vitais para a melhoria do cotidiano do brasileiro.
Os dois superministros continuam sustentando seu governo, o da Economia exitoso até agora com as reformas estruturais, o da Justiça em momento de baixa na estrutura palaciana, mas ainda contando com o apoio da população.
Vítima de uma fatalidade política, a partir do momento em que seu filho Flávio foi envolvido em uma investigação de corrupção, quando era deputado estadual no Rio, Bolsonaro mudou de rumo.
Um grande acordo foi costurado com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, que misturou interesses pessoais com os do Estado brasileiro.
Toffoli revelou recentemente à revista Veja que o pacto que intermediou entre os três poderes – Executivo, Judiciário, e Legislativo – não nasceu do nada, como parecia. Havia, segundo seu relato, uma movimentação entre os militares que estavam no Governo, empresários insatisfeitos com a economia e políticos que visava tirar o presidente Bolsonaro do governo anda no alvorecer de seu mandato.
Essa ação política, que os aproximou, coincidiu com investigações da Receita e do Coaf sobre ministros do Supremo, Flavio Bolsonaro, e as respectivas famílias. Acatar o pedido de Flavio para que o Coaf não repassasse seus dados fiscais sem autorização judicial ajudou a família de Bolsonaro e a dos ministros do Supremo, mas fez com que o presidente ficasse escravo de uma nova agenda política, a de travar a Operação Lava-Jato e similares.
O espírito do momento é esse, e por isso a Câmara acelerou a aprovação da lei de abuso de autoridade, cuja finalidade subreptícia é colocar barreiras legais, ou reforçar as já existentes, às investigações, transformando em crime ações que hoje são, ou deveriam ser, apenas infrações administrativas.
A legislação brasileira é feita para não funcionar, já disse o ministro do Supremo Luis Roberto Barroso. As tecnalidades existem para impedir que se prendam pessoas famosas, poderosas, que tenham bons advogados, que encontrarão sempre na lei um subterfúgio para anular provas e impedir investigações.
Sua relação com o ministro Sérgio Moro deteriorou-se, e com a lei de abuso de autoridade, a tendência é deteriorar-se também a relação com outras corporações. A Receita Federal está em pé de guerra pela tentativa de nomear um novo responsável pelo Porto de Itaguai, no Rio de Janeiro, base eleitoral dos Bolsonaro e conhecido ponto de atuação de milicianos e contrabandistas.
Parte dos eleitores de Bolsonaro vai ficar revoltada quando entender que ele está boicotando a Lava-Jato, mas outra está satisfeita com o que está fazendo em outras áreas, como liberação de porte de armas, combate à pornografia, mudança de enfoque da conservação do meio-ambiente.
Os liberais de centro-direita estão satisfeitos os caminhos da economia. Mas a recuperação da economia depende também da elevação do padrão ético do país. E da melhoria de nossa imagem no exterior.