Italo Nogueira
Folha
O ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral (MDB), que tenta fazer um acordo de delação premiada, afirmou nesta quinta-feira (23) ser dono de dois imóveis em áreas nobres da capital. Ele disse que as propriedades estão em nome do empresário George Sadala. A declaração corrobora as desconfianças de membros da Operação Lava Jato de que o emedebista ainda mantém oculto parte do patrimônio acumulado com propina. É a primeira vez que há referência a esses imóveis como parte de seus bens.
Cabral prestou depoimento em ação penal em que é acusado de receber R$ 1,3 milhão de propina de Sadala, sócio na empresa responsável pelo programa Poupatempo no Rio de Janeiro.
OUTROS “NEGÓCIOS” – O emedebista declarou que recebeu, na verdade, R$ 1,5 milhão. E disse que dividia com o empresário a propriedade de um terreno em Ipanema (zona sul) e um prédio comercial adquirido junto à Brookfield na Barra da Tijuca (zona oeste), todos em nome de Sadala.
“São propriedades minhas, frutos de outros negócios que posso esclarecer em outras circunstâncias”, afirmou Cabral, cujo novo advogado tenta acertar um acordo de delação.
Segundo o emedebista, Sadala chegou a obter o licenciamento para erguer um prédio “de três ou quatro andares” no terreno em Ipanema, mas o empreendimento não se concretizou. “Ele sempre me mantinha informado”, disse o ex-governador, que avalia em R$ 6,5 milhões o valor de sua participação no negócio.
DEFESA DE SEDALA – A defesa de Sadala o questionou durante o interrogatório se Cabral tinha como provar a sociedade. O emedebista comparou Sadala aos doleiros Renato e Marcelo Chebar, que mantinham em seus nomes US$ 100 milhões do ex-governador no exterior. “Era assim como com os irmãos Chebar, na confiança”, disse Cabral.
A declaração contradiz o primeiro depoimento que Cabral prestou após decidir confessar, em fevereiro. Na ocasião, o juiz Marcelo Bretas perguntou expressamente se ele ainda mantinha bens em nome de algum outro laranja. Citou especificamente o empresário Arthur Soares, dono de empresa de terceirização de mão de obra também acusado de pagar propina.
“Não, em nenhum lugar”, respondeu Cabral.
DELAÇÃO PREMIADA – O ex-governador deseja firmar acordo de delação premiada, mas as suspeitas de ocultação de um patrimônio ainda inestimável é um dos principais pontos de resistência entre procuradores.
Cabral é réu em 30 ações penais decorrentes da Lava Jato e suas penas já superam 198 anos. Ele é acusado de cobrar 5% de propina sobre os grandes contratos do estado.
Após negar por mais de dois anos as acusações, o ex-governador decidiu confessar os crimes. Investigadores, contudo, acreditam que ele mantém patrimônio oculto.
COM OS DOLEIROS – A Lava Jato já arrecadou mais de US$ 100 milhões atribuídos a Cabral, encontrados nas contas em nome dos doleiros Renato e Marcelo Chebar.
No ano passado, o ex-governador e a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo abriram mão de seus bens à Justiça. Naquele momento, o objetivo era obter a redução de pena —os recursos, dessa forma, poderiam ser transferidos de imediato ao estado. A medida, contudo, foi feita sem confissão até aquele momento.
Foram entregues três imóveis, joias, carros, além de valores depositados em contas bloqueadas —a maior parte em nome de Adriana e seu escritório de advocacia.
“APRESENTAÇÃO” – O ex-governador afirmou que foi apresentado a Sadala por “um político nacional de outro estado, atualmente com imunidade parlamentar”.
Ele disse que o modelo do Poupatempo no Rio de Janeiro foi o aplicado em São Paulo, contando inclusive com os mesmos empresários responsáveis.
O emedebista sugeriu que havia pagamento de propina em São Paulo, embora não mencionasse de forma direta nenhum beneficiário.
SEDALA NEGA – O empresário George Sadala negou que tenha qualquer sociedade com Cabral. Em relação ao terreno de Ipanema, ele disse que já o vendeu para outro empresário. Sobre os imóveis da Barra, declarou que se tratam de duas coberturas que não foram entregues no prazo pela Brookfields. Esse contrato com a empresa, disse ele, foi dissolvido e ele recebeu quatro apartamentos em São Paulo.
“Tem muita inverdade. Muita mentira. Ele dizer que é meu sócio, meu parceiro… Esse valor teria que ter transacionado por seus operadores. Cadê esse dinheiro?”, disse Sadala.
“Entendo o desespero e a própria pressão sei lá de onde. Está preso, rezo por ele. Fico estarrecido com as pessoas querendo se beneficiar com algo sem pé nem cabeça. Não consigo entender porque ele está falando isso”, afirmou o empresário, que negou ter pago propina a Cabral. Ele afirmou que teve prejuízo com o contrato do Poupatempo no Rio de Janeiro.