Análise: Guaidó sabia que chances de prisão eram mínimas

Líder opositor foi blindado internacionalmente, mas em Caracas especula-se sobre início de negociação com o regime; visita próxima de Bachelet, enviada da ONU, também teria pesado

Guaidó e a mulher desembarcam no Aeroporto Internacional Simón Bolívar Foto: DONALDO BARROS / AFP
Guaidó e a mulher desembarcam no Aeroporto Internacional Simón Bolívar Foto: DONALDO BARROS / AFP
Por Janaína Figueiredo – O Globo

O planejamento de uma verdadeira operação de blindagem a Guaidó ficou em mãos de pouquíssimas pessoas. Nem mesmo embaixadores nomeados pelo presidente da Assembleia Nacional em países da região sabiam dos detalhes. A presença do irmão em NY confirma a intensa participação dos Estados Unidos em toda a ofensiva opositora. Guaidó entrou em Caracas protegido por uma rede internacional de apoio e sabendo que as chances de detenção nesta segunda eram baixíssimas.

É importante lembrar que está prevista para o dia 11 de março a chegada à capital venezuelana de uma missão das Nações Unidas encarregada de preparar uma visita da alta comissária para os Direitos Humanos, a ex-presidente do Chile Michelle Bachelet (2006-2010 e 2014-2018). A informação foi divulgada por meios de comunicação locais e jornalistas como Miguel Henrique Otero, dono do jornal “El Nacional”. Ter Guaidó preso faltando poucos dias para o desembarque dos enviados da ONU não era um cenário favorável para o Palácio de Miraflores, que nega reprimir e perseguir a seus opositores.

Em Caracas, a sensação de que já existe uma negociação para uma eventual saída de Nicolás Maduro do poder está crescendo. Não há informações concretas, mas fatos que levam a acreditar nessa possibilidade. Pouco mais de uma semana antes da volta de Guaidó, os militares impediram a abertura de um canal humanitário nas fronteiras com Brasil e Colômbia. Houve mortos, feridos e caminhões com comida e medicamentos incendiados. Nesta segunda, deixaram o presidente da Assembleia Nacional entrar ao país sem titubear.

O aeroporto internacional de Maiquetía é território dominado pelo Serviço Bolivariano de Inteligência (Sebin) e a Guarda Nacional Bolivariana (GNB). Cada pessoa que entra na Venezuela deve dar explicações, responder a perguntas e passa por uma radiografia antes de obter sinal verde. Guaidó foi recebido com sorrisos e, segundo seus assessores, com um “seja bem-vindo, presidente”.

Seus aliados asseguram que “isso é fruto da pressão internacional, nas ruas e de um regime que está cercado e fragilizado”. Depois de ter tido dirigentes forçados a exilar-se e refugiar-se em embaixadas, saindo do país por terra e por mar, nesta segunda a oposição recebeu seu líder máximo em grande estilo, sem que o governo chavista impusesse qualquer tipo de obstáculo. A presença no aeroporto de embaixadores da União Europeia (UE) funcionou como uma garantia para Guaidó e sua mulher, a jovem Fabiana Rosales, que o acompanhou em todo o périplo latino-americano.

Na semana passada, Maduro assegurou que se voltasse ao país Guaidó “deveria enfrentar a Justiça”. Diosdado Cabello, considerado o número dois do chavismo militar, que é membro da Assembleia Nacional Constituinte, declarou que prepararia “um comitê de recepção” para o “presidente encarregado”. Nesta segunda, nem Maduro nem Cabello foram vistos. Silêncio absoluto sobre a ousadia de seu principal rival político.

Especialistas no mundo militar venezuelano como a jornalista Sebastiana Barraez asseguram que “não houve preparação nem estratégia para impedir a entrada de Guaidó ou detê-lo”. Isso poderia implicar uma vitória para a oposição e sua aliança internacional; uma decisão do chavismo de adiar uma eventual prisão de Guaidó ou o resultado de uma negociação mais ampla, ainda desconhecida e que poderia levar a a uma verdadeira transição democrática no país.

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